O Futuro da Habitação em Portugal: Uma Análise das Novas Medidas
O Governo português anunciou recentemente um pacote de medidas com o objetivo de tornar a habitação mais acessível. Entre as propostas, destacam-se a introdução de um regime de rendas acessíveis com um teto de 2300€/mês e uma taxa de IRS de 10% – ou até 0% caso o valor da renda seja 20% inferior à média de mercado. Adicionalmente, o IVA para a construção e renovação de imóveis para venda ou arrendamento foi reduzido para 6%, e o imposto sobre mais-valias será zero caso o valor da venda seja reinvestido em imóveis para renda acessível.
Apesar da boa intenção por trás destas medidas, a minha convicção é que, no médio prazo, os preços de compra dos imóveis tendem a subir. A lógica é relativamente simples e reside no aumento da rentabilidade líquida do arrendamento.Anteriormente, um proprietário que arrendava o seu imóvel pagava 25% de imposto, ficando com 75% do rendimento. Com a nova legislação, a taxa de imposto sobre a renda baixa para 10% (ou 0%), o que significa que o proprietário passa a reter 90% (ou 100%) do seu rendimento. Este aumento de 20% a 33% no rendimento líquido do arrendamento, por sua vez, valoriza o ativo. Num mercado competitivo, onde o preço de um bem é diretamente influenciado pela sua capacidade de gerar receita, um aumento no rendimento líquido traduz-se inevitavelmente num aumento do preço de mercado do imóvel.
A proposta inclui ainda um “acelerador” para este efeito. A isenção de imposto sobre mais-valias em caso de reinvestimento facilita a venda de um imóvel antigo para a compra de um novo, pronto a arrendar. Este movimento de capital, aliado à redução do IVA na construção, cria expectativas no mercado que se refletem nos preços de hoje, muito antes de qualquer aumento significativo da oferta. O resultado é um aumento imediato na procura por imóveis, especialmente por tipologias mais líquidas como T1 e T2, elevando a concorrência e os preços.
Consideremos um exemplo prático: um imóvel que arrenda por 2000€ por mês gera 24000€ por ano. Com a antiga taxa de 25% de imposto, o rendimento líquido era de 18000€. Com uma rentabilidade de 5%, o preço de mercado do imóvel seria de 360000€. Com a nova taxa de 10%, o rendimento líquido sobe para 21600€, e o preço do imóvel, mantendo a mesma rentabilidade, salta para 432000€.
É importante notar que a realidade da construção de novos imóveis é complexa. A burocracia e os anos que os projetos levam a ser aprovados significam que o aumento da oferta será lento e progressivo, enquanto as expectativas e os preços do mercado se ajustam quase de imediato. A conclusão paradoxal é que, embora as medidas visem beneficiar a acessibilidade, o impacto imediato e a longo prazo pode ser o oposto para quem procura comprar casa.
Em suma, embora as novas medidas pretendam aliviar a crise da habitação, a dinâmica do mercado sugere que os proprietários de imóveis serão os principais beneficiados, com um aumento na rentabilidade líquida e uma consequente valorização dos seus ativos. Aos potenciais compradores, a mensagem é clara: o momento de comprar parece ser agora, antes que a subida de preços se consolide. Em Portugal, ser proprietário continua a ser a aposta mais segura.
Zózimo Castro