Análise

Chega? Uma questão de princípio

O PSD de Albuquerque aliar-se-á à extrema-direita para se perpetuar na Quinta Vigia?

O Chega quer usar a Madeira como “teste” a uma pretendida coligação nacional com o PSD, para derrubar o PS de António Costa. Tudo certo, não fosse o partido de André Ventura uma agremiação de gente dispensável para os amantes da democracia, da liberdade e da ética republicana. Dar o braço ao Chega é alinhar – não há volta a dar a isso – em doutrinas fascistas, xenófobas, misóginas, que deveriam corar de vergonha os líderes dos partidos de direita, que fazem parte do arco da governação. Ceder ao Chega é ceder à chantagem e a uma agenda desprezível. Por mais voltas que dê não encontro lugar para um partido conotado com a extrema-direita em Portugal, que faz gala de acolher com pompa e circunstância todos os fascistas que pululam por essa Europa fora. Tem votos? Demais, mas o epifenómeno vai esvaziar-se mais ano menos ano, caso não mude a sua veia iminentemente oportunista e populista, dois perigos para um país que ainda nem festejou os 50 anos de democracia plena. É que o grande objectivo de André Ventura é liderar a direita. Não tenhamos dúvidas. O PSD será um meio para lá chegar.

Miguel Albuquerque, mandatário nacional de Luís Montenegro, já lhe abriu a porta, afastando a imagem de papão colada ao partido. O mais certo é que, se precisar do Chega para continuar no poder, vai acolhê-lo, juntamente com o que restar do CDS. Nesse cenário, que não é assim tão despiciendo, que programa apresentará à população? É que convém mesmo saber: o PSD de Albuquerque aliar-se-á à extrema-direita para se perpetuar na Quinta Vigia? Por mais que desvalorize e menorize a relevância do Chega na Região, o presidente do Governo Regional vai ter de dizer até onde está disposto a ir. Antes das próximas eleições tem de declarar de forma clara que não haverá acordos seja em que cenário for. Ou que haverá, sabendo que normalizar o Chega é normalizar a violência e a xenofobia – exemplos não faltam – assim como contribuir para a regressão civilizacional.

Os recentes actos cobardes de violência gratuita a que se assistem no País não surgem do nada, não sejamos ingénuos. Há um discurso político que o fomenta, diabolizando, designadamente, os imigrantes.

Um partido com os pergaminhos do PSD-M – que venceu todas as eleições desde 1976 – não pode trair os seus princípios fundadores baseados na liberdade e na dignidade da pessoa humana.

A sete meses das eleições regionais, o líder social-democrata vai ter de pôr o dedo na ferida e assumir ao que vai, sem tibiezas. Já agora, será igualmente interessante conhecer a perspectiva do CDS de Rui Barreto. Se dois já são demais, imagine-se uma espécie de ‘geringonça’ ao comando da Região.

Albuquerque está disponível para conviver com o ‘elefante’ na sala, se necessário for? É que o líder do Chega-Madeira disse, de forma muito clara, na última convenção nacional do partido, que “Miguel Albuquerque tem tiques de ditador” e que se veria em Setembro/Outubro próximo se o PSD ia ou não precisar do Chega, numa terra “onde há défice democrático”. Para bom entendedor meia palavra basta.

P.S.: A tragédia tremenda que assolou a Turquia e a Síria convoca-nos à introspecção e ao pesar. Toda a ajuda possível tem de ser para lá canalizada. Tudo o resto da agenda mediática é quase insignificante perante a devastação, o caos e a dor sem fim.