Eleições 2024

Está muito em jogo nas próximas eleições legislativas de 10 de março. Os portugueses não vão votar apenas em deputados; em certo sentido, vão, também, referendar a democracia - o que pode complicar a escolha no momento do voto.

Para quem jurou fidelidade eterna a um partido, o problema do voto está resolvido. No entanto, para os outros - os que votam, caso a caso, no que julgam ser a melhor solução para o país - a decisão poderá não ser fácil.

Mesmo com a melhor boa vontade e espírito crítico, ninguém está livre de ser manipulado inconscientemente e acabar votando contra os seus próprios interesses. O que, aliás, não é inédito.

A maioria dos ingleses, que votaram a favor do Brexit, já estão arrependidos da asneira que fizeram; só agora se deram conta que a sua perceção da realidade foi distorcida por uma manipulação grosseira.

A última eleição de Trump também é um exemplo da forma como - contra todas as evidências - a demagogia mais primária consegue vender realidades alternativas para influenciar o sentido de voto. A julgar pelas últimas sondagens, uma boa parte dos americanos continua ainda a ver a realidade pelos olhos da demagogia de Trump.

Nos últimos tempos, o país andou um pouco esquecido de si mesmo. Em vez de ocupar-se das soluções estruturais para a saúde, a educação, a justiça, etc., andou a reboque das televisões, guloso, para saber as “últimas” sobre os “casos” e “casinhos”.

A epidemia de alineação atingiu mesmo os deputados que começaram a brincar aos polícias, naqueles intermináveis Inquéritos Parlamentares.

O governo bem tentou remar contra a maré, mas acabou afogado numa tempestade perfeita de azar político. As questões ainda em aberto certamente vão ser usadas como arma de arremesso político, durante a campanha eleitoral.

Numa altura em que os ventos do populismo sopram de todos lados, será prudente estar prevenido contra as novas formas de manipulação da perceção política dos eleitores.

Muita gente não tem tempo nem pachorra para ler e comparar os programas dos diversos partidos - vai acabar por votar por empatia e não por motivos racionais. Mas quando se trata de votar por empatia, o populismo leva vantagem. A sua receita para ganhar eleições é simples e eficaz: colocar-se do lado das massas, contra a injustiça e corrupção do “sistema”.

Com a promessa de erradicar a injustiça social e a corrupção, os populistas vão distorcer os “casos” e “casinhos”, para mostrar que só eles têm a vontade e a superioridade moral para acabar com a “pouca vergonha”.

A democracia não está ainda vacinada contra o populismo e a demagogia. O risco de se cair na armadilha da desinformação é elevado.

As ferramentas da Inteligência Artificial permitem hoje - a qualquer pessoa - a elaboração de narrativas tão realistas que criam a ilusão de ter sido criadas por um ser humano inteligente, até com valores morais. Nesse contexto, não será fácil distinguir o real e o artificial; a verdade e a mentira.

Manuel Pereira