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O minuto 37

Acabaram-se as férias, e estão reunidas todas as condições para voltar a escrever neste Diário de Notícias da Madeira (DN M).

É inegável, que durante o verão muito aconteceu, como foi o caso dos incêndios, a seca, a inflação, a crise energética, a crise dos cereais, o aumento do custo de vida, o aumento das taxas de juro, o cyber crime e as ameaças de uma guerra nuclear. E tantos outros exemplos do real caos em que se encontra o continente europeu, e o mundo no seu geral.

Já quanto à realidade nacional, é também indiscutível, os casos de intolerância e de violência que marcaram as últimas semanas no futebol português. Fica a dúvida se este fenómeno está ou não a crescer em Portugal.

A partir daqui os dados estão lançados para esta conversa com os leitores do DN M. E a pergunta que eu faço aos meus amigos leitores, são as seguintes: para quem gosta de futebol e de desporto, os diversos episódios que aconteceram em alguns estádios, como foram os casos em Famalicão e no Estoril, envolvendo crianças, enquanto adeptos, não são suficientes para nos fazer parar para refletir! Que resposta deve ser dada a casos como estes?

Como polícia, deve ser dado uma resposta que abranja várias dimensões. É obvio que a primeira parece que vai no bom caminho, ou seja, foram identificadas as pessoas responsáveis por estes atos de intolerância, e em princípio ao que tudo indica que estas pessoas poderão estar sujeitas as medidas de interdição e contraordenacionais que estão previstas na lei.

Mas, é importante relembrar também, que nos estádios de futebol ou em qualquer recinto desportivo, o Código Penal (CP) não está suspenso, e em caso de injúrias, estas pessoas estão sujeitas a processo-crime, porque é um crime previsto no CP e como tal, estão também sujeitos a procedimento criminal.

Para além disto, é preciso um conjunto de intervenções que não se podem confinar apenas à dimensão punitiva. Ela deve obviamente estar presente, e que já vem desde a lei n. 38/98 com as atualizações legislativas seguintes, prevê um conjunto de medidas de carácter preventivo, educacional e pedagógico que devem ser tomadas pelos clubes e pelas entidades promotoras do espetáculo desportivo, que não estão a ser tomadas. Não nos podemos esquecer que está perfeitamente demonstrado que os adeptos desenvolvem com os seus clubes, uma relação efetiva, que está ao nível da família, como também injeta nos clubes uma ânsia de vitoria que muitas vezes, é negada no nosso quotidiano.

Portanto, não podemos focar apenas e só a ação na medida punitiva, mas temos de analisar a violência nos espetáculos desportivos na sua complexidade, tem diversas dimensões e para além disso, ela não pode ser desvinculada de toda a dimensão socioeconómica associada também à violência que existe em geral na sociedade. Isso tem de ser tomado em conta, sob pena de entrarmos num processo claramente contraditório, em que parece haver a perceção que as coisas estão a agravar-se, as sanções são também agravadas, mas, não obstante tal agravamento, as situações de violência continuam a ocorrer, porque o efeito dissuasor das penalizações não se verifica.

Devia ser estudada a hipótese em rever a lei, nomeadamente na criminalização do apoio ilegal a grupos de organizados de adeptos e inviabilizar o recurso, porque o recurso vai fazer com que se vá empurrando com a barriga e não seja verdadeiramente efetivo.

Se as sanções fossem mais do foro desportivo, consequentemente o clube sofria mais sanções, mas também os adeptos vão pensar, os meus comportamentos podem fazer com que o meu clube, não seja campeão, desça de divisão ou então não seja apurado para as competições europeias. Porventura isso possa ir ao coração dos adeptos, podendo refrear um pouco os ímpetos de violência.

Agora não podemos ter este ambiente inflamado como foi o MINUTO 37, quando decorria o jogo, entre o Estoril e o FCP, alguns adeptos insultaram e tentaram expulsar um pai que estava com a filha menor ao colo que assistiam ao jogo enquanto adeptos do clube visitante.