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Das apropriações, expropriações e usucapiões

Qual a certeza e segurança jurídica que um proprietário tem na sua relação com os seus bens?

No dia 4 de Outubro último, mereceu destaque de primeira página do DN, o facto de o Governo apropriar-se do Calhau da Lapa. Antes mais, devo deixar claro que não tenho qualquer direito ou interesse nem disponho de qualquer tipo de mandato de ninguém daquela zona… Fiquei alertado com os argumentos apresentados. Trata-se de propriedades/prédios localizados próximos da costa marítima. No entanto, certo é que esses prédios, pelo menos no que toca a alguns que conheço, encontram-se legalizados em nome dos proprietários, há muitos anos. Isto é, têm registo na Conservatória do Registo Predial e vêm a pagar os correspondentes IMI’s. Afinal, ao fim destes anos todos em que a expectativa natural é de que continuariam como seus legítimos proprietários caiu com as derrocadas e limpeza das escarpas…

Face a esta situação, as questões que me coloco é saber qual a certeza e segurança jurídica que um proprietário tem na sua relação com os bens registados e tributados em seu nome? Será que esta situação é exclusiva do Calhau da Lapa ou extensiva a todos os calhaus das lapas existentes na região?

Hoje será na costa marítima, amanhã será nas encostas das nossas serras, depois, nas proximidades dum qualquer equipamento público ou em vias de se tornar público, onde muitas pessoas têm os seus terrenos e os cultivam, desde tempos na ancestrais, na tradição dos seus antepassados…

O Governo Regional apropria-se, fundamentando-se num ou vários actos nulos.

Não sei porquê, mas, assim de repente, fez-me lembrar o Putin quando rotula os ucranianos de terroristas e de nazis, porque não o deixaram ocupar o seu território…

É que já não bastava as expropriações que se arrastam anos e anos nos Tribunais, de recurso em recurso, para, após o acórdão final, ainda ser negociado o pagamento a prestações…

Ainda no contexto dos direitos reais, não podia de opinar sobre algumas usucapiões que se vai vendo por aí. Lembro-me dalgumas aquisições/compras e permutas de terrenos feitas apenas com a palavra. Presenciei várias. O “selo branco” era o brinde que tinha lugar após pagamento/recebimento em resultado do negócio. Um aperto de mãos valia mais que uma escritura. Passadas algumas dezenas de anos, é difícil ou impossível identificar o trato sucessivo. Para além destes negócios, nessa altura, as partilhas hereditárias eram feitas de boca e a posse confirmava a transacção perante a comunidade.

Hoje, a usucapião é uma figura quer permite resolver esta situação. A verdade é que nem sempre o usucapiente respeita a verdade. E muitas vezes os prejudicados nem tomam conhecimento da situação ou muito tarde dela sabem.