Análise

Que tal bater o recorde de participação?

Vote hoje. Amanhã, bem cedo, comece a exigir o que lhe cabe aos que fizeram promessas

Hoje é dia de eleições autárquicas. Não. Não são ‘Regionais’ antecipadas, mesmo que quem ganhe a maior Câmara da Madeira possa ter a tentação de se achar, desde logo, com um pé na Quinta Vigia ou com os dois num futuro alegadamente risonho, com hipótese de vencer o sufrágio de 2023 sem cumprir com o mandato que por estes dias se propôs fazer. Tenham memória.

Hoje não é dia de escrutínio puro aos governos de lá e de cá, se bem que seja previsível que os eleitores usem o seu dever cívico para protestar contra privações abusivas e decisões metralhadas que geram saturação e negacionismos ou então subscrever opções e medidas que vão animando os dias de quem tem como missão gerir a coisa pública. Haja lucidez para distinguir os planos.

As eleições de hoje servem para os eleitores escolherem os representantes do poder local no concelho em que residem. Servem para eleger o presidente de Câmara, os membros das Assembleias Municipais e das Assembleias de Freguesia, cujo cabeça-de-lista do partido mais votado é eleito presidente da Junta de Freguesia. Por isso, mesmo sendo legítimo que alguns queiram fazer deste raro momento da democracia participativa uma final da ‘champions’ eleitoral, os profissionais da política deviam ter sido os primeiros a elucidar os eleitores sobre a verdadeira implicação dos três boletins de voto na vida da sociedade.

As eleições de hoje servem ainda para medir a maturidade de um sistema que padece de lamentáveis anacronismos, de um sem número de aberrações que já demos conta na passada semana a que se juntam a ignorância atrevida de alguns candidatos que nem conhecem a lei eleitoral, um dia de reflexão absurdo e a dualidade de critérios e de juízos da Comissão Nacional de Eleições.

As eleições de hoje servem ainda para perceber quanto valem as novas propostas políticas, mesmo que as previsões apontem para uma bipolarização crescente, feita à conta dos partidos tradicionais.

Hoje os eleitores vão poder votar entre as 8 e as 20h e não apenas até às 19h. Que o acréscimo de uma hora sirva de mote para uma festa maior. Um recorde de participação seria uma importante vitória colectiva que aumentaria a responsabilidade dos eleitos. E alcançá-la está nas nossas mãos.

Vote mesmo que ainda não tenha decidido em quem quer depositar a esperança num futuro melhor, mesmo que não tenha recebido prendas nem certezas de nada e tenha percebido que nem tudo o que parece é. Vote mesmo que ache que quem habitualmente manda não se comove com os problemas de cada um, por não ter tempo nem pachorra para tratar diferente o que lhe parece igual. Vote mesmo que desconfie que os eleitos são todos parecidos, porventura, separados à nascença.

Vote por si. Para que ninguém se aproprie da sua opção que vale tanto como a de qualquer outro cidadão. Para que possa estar em paz com a sua consciência e dar um exemplo pedagógico aos habituais abstencionistas. Para que alguns temas e dramas deixem de ser bandeira eleitoral. Para que determinadas entidades passem a actuar independentemente das queixas feitas e das provas irrefutáveis. Para que as manipulações que atentam contra a inteligência cessem de vez. Para que quem revelou amnésia cirúrgica, mau feitio e amuo sistemático possa curar-se. Para que quem caluniou e mentiu compulsivamente peça desculpa. Para que os criadores de perfis falsos e autores de manobras de desinformação tenham vergonha. Para que os que se colocaram nas margens da democracia, não foram transparentes, nem frontais prestem contas e trabalho comunitário.

Vote hoje e amanhã comece a exigir. Não deixe que as promessas sejam arrumadas com os cartazes no armazém que só reabre na próxima pré-campanha. Não permita que lhe roubem as expectativas, nem se apropriem das suas convicções. Seja cruel. O seu voto merece muito mais do que o mesmo de sempre, essa súbita indiferença ditada por conquistas efémeras.