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Professor Doutor Ornelas Monteiro - uma referência na nossa medicina

Vivemos um tempo com tendência para apagar a memória e que parece cultivar o esquecimento.

Em silêncio, toleramos uma sociedade que parece não dar valor ao que é importante …. pois tudo é efémero.

Transversal a este tempo e a esta nossa sociedade, paira sobre nós uma estranha “mística do instante”.

Porque não me sinto confortável neste tempo e nesta sociedade que tão facilmente esquece o seu passado, quero evocar o Professor e Cirurgião Ornelas Monteiro que recentemente deixou de estar entre nós.

Gostaria que este meu pequeno texto fosse entendido como um testemunho de gratidão e não apenas como um elogio formal que tradicionalmente ornamenta o triste momento de uma despedida.

É que eu fui seu aluno, seu interno e seu cirurgião.

Sempre me senti próximo do Prof. Ornelas Monteiro e nunca esquecerei o privilégio de ter sido um dos seus discípulos, mesmo quando me aventurei por outros caminhos e assumi responsabilidades que me afastaram do seu convívio diário.

Como aluno, recordo as suas excelentes aulas que obrigaram o Prof. Roberto Monteiro a repetir a mesma matéria duas vezes no mesmo dia, pois o maior anfiteatro da Faculdade de Medicina, esgotava completamente a sua lotação, apesar de não haver marcação de faltas.

Mas esta reconhecida vocação para o ensino não impediu que um dia, felizmente para a Madeira, o Prof. Ornelas Monteiro decidisse deixar uma promissora carreira académica e regressasse à sua Ilha.

Traz consigo o rigor que o ato medico exige, a competência elegante do seu gesto cirúrgico e a capacidade de quem sabe ensinar.

Provavelmente sem se dar conta, o Professor vindo da Universidade de Coimbra e agora Diretor do Serviço de Cirurgia 3, iniciava a criação de uma verdadeira “Escola Cirúrgica” na Madeira!

Como interno da especialidade da C3, guardo a imagem de um Serviço que assentava em três pilares: uma responsabilização exigente, uma disciplina consentida e uma cultura académica que estimulava a procura do conhecimento teórico e prático.

Um forte espírito de grupo foi crescendo entre os jovens internos do Serviço, gerou cumplicidades e confirmou que só uma equipe de bons amigos e em permanente construção de pessoas, ideias e desafios pode ter sucesso e evitar sobressaltos, ultrapassar mal-entendidos e ignorar pequenas invejas.

“Os meninos do Prof. Roberto” como o bom Amigo João Maurício jocosamente chamava, ajudaram a construir dia a dia o prestígio do Serviço do Prof. Ornelas Monteiro e a consolidar a sua “Escola Cirúrgica”.

É importante reconhecer que esta “Escola”, deu um contributo importante para a evolução da Medicina na Madeira. Lá se fizeram por exemplo, as primeiras angiografias, as primeiras colheitas de órgãos para transplante, os primeiros acessos vasculares para a hemodiálise e implantaram-se os primeiros pacemakers definitivos.

Nesta “Escola”, nasceu a Cirurgia Vascular e dela também saiu o primeiro Cirurgião CardioTorácico da Madeira.

Mas foi na Cirurgia Geral que o legado do Prof. Ornelas Monteiro encontrou um espaço de eleição e deixou uma herança que é respeitada pela comunidade médica e reconhecida pela sociedade madeirense.

Como Professor e nosso Mestre, partilhou o seu saber e a sua competência com uma nova geração que não o deve esquecer.

Sempre que um dos “meninos do Prof. Roberto” tomar uma decisão clínica ou iniciar um gesto cirúrgico, o Prof. Ornelas Monteiro não deixará de estar presente.

A sua memória será então preservada pelos seus discípulos, a sua “Escola Cirúrgica” não será efémera e o seu legado que tanto prestigiou a Madeira, estará para além da “mística do instante”.