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Digitalização pode aumentar diferença salarial entre homens e mulheres

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A fraca presença feminina em empregos tecnológicos aumenta o risco de uma maior diferença salarial em relação aos homens, sendo necessário garantir que mais mulheres ingressam nessas áreas, afirma a presidente da Comissão para a Igualdade de Género.

"Temos que tomar as decisões, medidas públicas e executá-las para que consigamos levar cada vez mais mulheres e raparigas para as áreas STEM [ciência, tecnologia, engenharias e matemática] para conseguirmos diminuir o 'pay gap' [diferença salarial] e não causar aqui uma situação de um 'pay gap' superior", diz à agência Lusa a presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), Sandra Ribeiro, admitindo que há o risco de uma crescente digitalização da economia poder levar a uma diferença salarial superior.

Em 2018, segundo o Eurostat, as mulheres representavam em Portugal menos de 15% dos profissionais das tecnologias de informação e comunicação (TIC) e o seu número até diminuiu em relação a 2005 (17,1%).

Sandra Ribeiro recorda que a diferença salarial entre homens e mulheres não vem necessariamente do incumprimento das regras ou da Constituição (trabalho igual, salário igual), mas de haver mais homens em cargos de direção e em trabalhos mais bem pagos.

"O 'pay gap' está também relacionado com as áreas onde predominam o trabalho masculino e feminino. Nas TIC, temos efetivamente uma situação de muitos mais homens e aí com salários mais elevados", salienta, considerando que uma das razões para a diferença salarial é também "esta segregação profissional".

Para a presidente da CIG, as mulheres, estando menos representadas nas TIC, "têm menos possibilidade de encontrar empregos bem pagos e vão para áreas onde, de uma forma geral, a sociedade, por mais importante que esse trabalho seja, não tem esse reconhecimento, como por exemplo o cuidado ou a educação".

Para ajudar a alterar esta realidade, a CIG iniciou em 2017, na altura como projeto-piloto, o projeto "Engenheiras por um dia", que procura mostrar figuras femininas "a darem cartas" em áreas tecnológicas e mostrar a crianças e adolescentes que "as TIC não são um feudo masculino".

Segundo Sandra Ribeiro, é importante que o trabalho em torno da perspetiva de género esteja presente nas mais diferentes variantes associadas à transição digital, seja em iniciativas de inclusão digital, de reconversão de carreiras, tendo a educação um papel fundamental.

"Há que perceber porque é que as raparigas não se sentem atraídas pelas TIC. Se procurarmos a razão, provavelmente, radica numa infância que nós próprios tivemos e a maioria das pessoas continuar a ter que é uma infância marcada por uma dualidade cromática cor de rosa e azul. Esse é o problema de fundo", vinca.

No entanto, Sandra Ribeiro olha com alguma esperança para o futuro por considerar que o país está numa situação em que, ao contrário de outras crises, consegue "antever as consequências" e pode desenhar políticas no âmbito da transição digital para garantir que não haverá um aumento da diferença salarial.

"Não há dúvida nenhuma de que se não tivermos uma perspetiva de género para todas as medidas que formos adaptar para esta reforma iremos ter uma maior desigualdade entre homens e mulheres. Só vejo uma solução que é a transversalidade da perspetiva de género em todas as medidas", defende.

A transição digital foi definida como uma das linhas de ação da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE), que se propõe dar prioridade às iniciativas que contribuam para acelerar esta transição enquanto motor da recuperação económica e promover a liderança eu­ropeia na inovação e economia digitais.

O programa da presidência aponta nomeadamente o desenvolvimento de competências digitais com vista à adaptação dos trabalhadores aos novos processos produtivos, a transformação digi­tal das empresas e das plataformas digitais, a promoção da saúde e prevenção da doença e a educação e formação ao longo da vida.