Artigos

Não pactuamos com Cartéis! (III)

“A corrupção é paga pelos mais pobres”. Papa Francisco

O processo de construção do novo Hospital Central da Madeira está prestes a tornar-se um dos maiores escândalos financeiros e políticos da história recente, tendo em conta os valores envolvidos e a total desfaçatez com que um Governo Regional pensa que pode usar e abusar do erário público, ou seja, do dinheiro dos contribuintes madeirenses e porto-santenses.

Depois da denúncia do Grupo Parlamentar do PS Madeira à Autoridade da Concorrência por indícios de cartelização, numa empreitada com o valor base de 205 Milhões de Euros, ou 251 Milhões de Euros se incluirmos o IVA, aparte do valor dos equipamentos hospitalares necessários cujo investimento deverá ascender a 60 Milhões de Euros, o Governo Regional passou a semana num corrupio de intervenções públicas a tentar justificar o injustificável.

Miguel Albuquerque, ele próprio, afirma que “não há jogadas” no concurso, ao mesmo tempo que lemos no Diário que o “pequeno” concurso para a adjudicação do helicóptero de combate a incêndios foi arrasado pelo Tribunal de Contas. Coisa pouca.

Vamos então a factos.

Na denúncia apresentada pelo PS, há matéria que indicia graves violações aos princípios que regem a contratação pública, naquele que foi um procedimento concursal limitado por prévia qualificação. Ou seja, decorreu uma pré-seleção de candidatos que puderam na fase final apresentar propostas. Essa prévia qualificação implicou que o acesso ao concurso fosse limitado a quem preenchesse determinados requisitos mínimos de capacidade técnica e financeira.

Naturalmente o procedimento em si não tem nenhum problema, tendo em conta a dimensão e importância da empreitada. Já não deixa de ser peculiar o resultado final, o esvaziamento do mesmo, tendo em conta que os concorrentes já sabiam quais eram as exigências técnicas e financeiras para a realização do novo hospital e que ao procedimento tinha sido atribuído o valor do preço base de 205 Milhões de Euros, como já referido. Nos anteriores artigos de opinião já mencionei o facto de todas as grandes construtoras que atuam no mercado português, e que aliás integraram consórcios para concorrer ao novo Hospital madeirense, se comportarem de forma comercialmente agressiva em todos os concursos de empreitadas, levando a que o preço final seja muitíssimo inferior ao valor base dos concursos. A crise pandémica leva igualmente a uma concorrência ainda mais feroz nos concursos lançados, o que tem sido bastante evidente nos últimos meses.

Nos termos do artigo 9.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, são proibidos os acordos entre empresas, que tenham por objeto ou como efeito impedir, falsear ou restringir, de forma sensível, a concorrência no todo ou em parte do mercado nacional, nomeadamente, os que se traduzam em fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda ou interferir na sua determinação pelo livre jogo do mercado, induzindo, artificialmente, quer a sua alta quer a sua baixa, bem como, em repartir os mercados ou as fontes de abastecimento.

A não apresentação de propostas, porque alegadamente só o fariam acima do preço contratual máximo estabelecido pela entidade adjudicante, e a invocação da necessidade de rever os preços, no sentido de elevá-lo, determinou que as propostas apresentadas fossem excluídas e que, em consequência, o concurso ficasse deserto.

Tendo o Conselho de Governo extinguido o procedimento, por não apresentação de propostas, o Governo Regional anunciou de pronto um novo concurso público, onde aceitava sem mais delongas um aumento real de 20% do preço base face ao procedimento concursal anterior, tornando-se porta-voz e agente de empresas privadas. Estamos a falar de um aumento de 50 Milhões de Euros (incluindo o IVA) absolutamente atroz, que nada consegue justificar.

Isto é simplesmente inadmissível. Tendo como referência o valor da remodelação e ampliação do novo Centro de Saúde da Calheta de 3,3 Milhões de Euros (também ele envolto em polémica), o desvio do valor do novo Hospital dava o equivalente a 15 novos Centros de Saúde…

Entretanto foi mesmo lançado um novo procedimento apenas para as escavações e contenções periféricas, num valor de 28 Milhões de Euros a que acresce o IVA, desta vez por concurso público sem pré qualificação, e com a assinatura de Pedro Calado, vice presidente, e Pedro Fino, secretário regional. Veremos quem ganhará a empreitada. Veremos também quanto será o valor com que será lançado a segunda fase, relativa à construção e infraestruturas, e a consumação de um dos maiores atentados aos recursos públicos alguma vez visto neste País.

A corrupção na Madeira é um problema sério. A falta de transparência deste Governo Regional ultrapassa todos os limites.

No site da Secretaria Regional de Infraestruturas, depois da denúncia do PS na Autoridade da Concorrência, ainda não tiveram a coragem de publicar toda a documentação sobre o concurso, nomeadamente esclarecimentos dos concorrentes e os documentos relacionados com a fase de apresentação das propostas, o convite à sua apresentação, as exposições dos concorrentes, nas quais alegadamente justificam o motivo de não irem a concurso, e as conclusões do júri do procedimento, onde estarão todas as justificações para o resultado que se veio a verificar. Certamente baterá tudo certo… é pena não o divulgarem…

Entretanto, os “bons rapazes” da vice presidência enviaram um ofício para a ALRAM dizendo que não vão responder ao grupo parlamentar do PS Madeira, sobre os documentos requeridos. O mesmo deu entrada no dia 9 de setembro. Têm 30 dias para o fazer. De outra forma teremos todo o gosto de o requerer no tribunal administrativo respetivo. Tudo isto é uma vergonha inigualável. E como já perceberam, não nos vão calar.

Fechar Menu