Crónicas

Quem defende a Classe Média?

A classe média é crucial para qualquer sociedade, pois é por natureza a mais dinâmica da esfera social, liderando causas políticas e sociais e adotando novas tendências e conceitos que depois se espalham na comunidade

A teoria da luta de classes sociais foi popularizada por Karl Marx que nasceu há 200 anos. Ele considerava e muitos ainda o defendem que o conflito entre as diversas classes era o motor da História. A revolução tecnológica e a evolução social podem ter estilhaçado a teoria, mas a verdade é que ainda raciocinamos sobre os seus pressupostos e é vulgar distinguir as camadas sociais por classes baixa, média, alta ou A, B, C... Até as estatísticas vão por este caminho e já que é assim, também, não me desviarei do rumo, para mais facilmente, poder expressar o meu pensamento sobre o que se designou chamar de classe média. Para simplificar, ser de classe média é não ser pobre nem rico, ou seja, é ser uma pessoa remediada. Se medirmos, apenas, o seu estatuto pelo rendimento, ser membro da classe média é uma pessoa que ganha entre 750 e 1.500 euros. Este será o padrão português e se atendermos a que o salário médio em Portugal anda à volta dos 900 euros, a maioria dos cidadãos pertence à classe média. Estima-se que mais de 60% da população portuguesa integre este grupo social. Os dados da Autoridade Tributária - esse temível carrasco desta classe - indicam que cerca de 35 por cento das famílias auferem entre 10 e 19 mil euros por ano e outros 35% têm um rendimento entre 19 e 40 mil euros. Daí que quando se trata de cobrar impostos e taxas é aqui, nesta franja larga da sociedade, que o Estado carrega forte, sobretudo sobre estes últimos agregados que sofrem hoje uma verdadeira asfixia fiscal.

Quem pagou a crise dos últimos anos em Portugal não foram os ricos nem os pobres, foram os remediados da classe média. Os que ganham menos, como aqueles que auferem o salário mínimo, foram, e muito bem, defendidos, não tendo cortes nos vencimentos, não pagando sobretaxa de IRS, usufruindo de um conjunto de apoios como a gratuitidade no acesso aos serviços públicos de educação e de saúde e recebendo um conjunto de apoios da rede de ajuda social formada por Instituições Particulares de Solidariedade, Municípios, Juntas de Freguesia e associações ligadas às Igreja para atenuar os efeitos da austeridade. Os mais abonados, naturalmente, sofreram cortes de rendimentos e aumento de impostos, mas a sua condição permitiu-lhes ultrapassar, mais ou menos bem, o período da troika. Quem se lixou e ainda se trama são os remediados: alguns ganham um pouco mais que os pobres, mas pagam tudo como se fossem ricos. Nalguns casos, o facto de não estarem isentos do pagamento de serviços estatais e de não terem direito a apoios sociais, leva a que no fim do mês tenham menos dinheiro disponível que aqueles que têm ordenados mais baixos. Pagam tudo e recebem pouco do Estado Social. Pagam a creche, os livros escolares, a propina dos filhos na educação; pagam taxas moderadoras nos hospitais públicos, vão a clínicas por falta de resposta dos serviços públicos e recorrem a seguros de saúde; compram casa com contração de empréstimo bancário e são penalizados, injustamente, pelo IMI e pelo Imposto de Transações. São os maiores consumidores e para além do IRS nos rendimentos mensais, pagam 22% de IVA nos bens adquiridos e quando adquirem combustível levam com 70% de imposto. Parecem ter todos os Deveres e muitos poucos Direitos.

A classe média é crucial para qualquer sociedade, pois é por natureza a mais dinâmica da esfera social, liderando causas políticas e sociais e adotando novas tendências e conceitos que depois se espalham na comunidade. Quanto mais forte for, mais coesa e mais equilibrada será uma região ou um país. A verdade é que a última crise (2008-2016) deixou muitas sequelas neste grupo social com o empobrecimento de muitas famílias, particularmente aquelas que tinham créditos bancários para despesas pessoais e de habitação.

O crescimento da classe média em Portugal, a que se vinha assistindo desde os anos setenta do século XX, estagnou e, nas atuais condições económicas e com a atual precariedade do mercado de trabalho, dificilmente os jovens terão possibilidade de constituir família, adquirir carro, casa e outros bens a que os seus pais acederam com mais ou menos facilidade. O “elevador social”, em que pelo estudo, o trabalho e o mérito, se conseguia fazer carreira e, progressivamente, se ia ascendendo a melhores níveis de vida, está parado e bloqueado por um Estado que absorve mais de metade do que ganham os cidadãos e as famílias.

Precisamos de um movimento/partido que assuma a bandeira da defesa dos interesses da classe média e que ponha os seus direitos na agenda política diária. O CDS tem todas as condições para o fazer e estou certo que não faltará a este imperativo regional e nacional.