Crónicas

A montanha russa geracional

O DN, há umas semanas atrás, trazia reportagem anunciando que um terço dos madeirenses “ia à vida”. Querendo significar que perderíamos essa percentagem de população até 2080. Quem é que acham que se vai embora? Os mais velhos ou os mais novos?

Até à minha geração fizemos um percurso ascendente. Na generalidade vivemos melhor que os nossos pais e eles, por sua vez, com qualidade superior à dos respectivos avós. E assim sucessivamente. A trajectória foi nos levando sempre para cima. Até que chegamos ao cume. Num processo de altos e baixos que a história nos traz ciclicamente, repetidamente. Numa espécie de montanha russa geracional obrigatória. Que acontece fruto do momento, das circunstâncias e das conjunturas. Desde há um período a esta parte e durante mais algum, infelizmente, os que são mais novos, viverão pior e com acréscimo de dificuldades em comparação connosco. O movimento passou a ser descendente e o seu início acontece com o conjunto dos putos da gente. Que pela primeira vez neste ciclo vão ficar num patamar inferior aos que os trouxeram ao mundo.

Vão ganhar menos e até ser explorados, enfrentar uma multiplicação de contrariedades para entrar no mercado de trabalho, ser obrigados a recorrer à emigração quiçá noutras circunstâncias não desejada, ter maiores estorvos no acesso ao crédito, seja para comprar habitação própria, iniciar o seu negócio ou abrir o seu consultório, escritório ou atelier, demorar demasiado a conquistar a sua independência e deixar mais tarde de residir em casa da família e de viver à conta deles. Alguns alimentando progressiva desesperança porque impacientemente esperam e exasperam por uma oferta de emprego, outros a querer constituir família sem que tenham a menor possibilidade para se instalarem, outros a pensar em procurar longe da sua terra a saída laboral que não lhe foi concedida no seu país. Tem contornos dramáticos toda esta situação.

Como é que se explica isto aos filhos? E qual vai ser a reacção deles?

Uns podem acomodar-se ou ficar pacientemente à espera. Outros, com muita probabilidade, irão partir. Destemidos e corajosos. Cabeça aberta e arejada à procura, pelo mundo fora, das condições que Portugal não oferece. Nem lhes deixa sequer acalentar esperança de o vir a permitir no tempo que é o deles. Vão fazer pela vida. Em busca de oportunidades. Seja perto, seja longe. E não olham para trás. Pobres pequenos. Ou antes, deveremos dizer, valentes pequenos? Porque têm tudo a ganhar afinal. Vendo bem, são os pais que perdem no fim. Porque ficam sós e longe dos que criaram. É a vingança divina. O castigo que se calhar fizemos por merecer.

O DN, há umas semanas atrás, trazia reportagem anunciando que um terço dos madeirenses “ia à vida”. Querendo significar que perderíamos essa percentagem de população até 2080. Quem é que acham que se vai embora? Os mais velhos ou os mais novos?

Outros factores teriam de ser tidos em consideração, desde a mortalidade à actual e tendencial baixa da natalidade. Mas não é disso que falamos. Mas de um êxodo que vai voltar a levar muitos dos nossos para fora e alguns para longe.

Seja como for acredito firmemente que a determinação e a coragem da rapaziada vai dar a volta a isto. Invertendo o ciclo. E os miúdos que fizerem nascer, netos para nós, já vão viver melhor do que eles. Mas, provavelmente, já não aqui.

Porque a montanha russa geracional é assim mesmo, tal como a dos parques de diversões, vai para cima e vem para baixo. Só que, por cada fenómeno periódico destes, o da subida e o da descida, demora o que parece uma eternidade. Quase uma vida. O que transforma em sortudos os que apanham o trajecto que cresce e em azarados os que levam com o que cai. Estes têm de se esforçar mais, trabalhar muito, fazer maiores sacrifícios, ultrapassar inúmeros obstáculos. E ir à luta.

É nessa fase temporal difícil e complicada, sobretudo para a juventude, que nos encontramos. Mas acredito que a geração que nos sucede, a dos nossos putos, vai fazer encurtar esse caminho. E vencerá.

Ps: O desemprego jovem e qualificado, que nas regiões ultra-periféricas atinge números e contornos inaceitáveis, deve ser desígnio inadiável, efectivo e não meramente teórico da União Europeia. É imperativo continuar a abanar a habitual apatia daqueles decisores europeus. Com esse objectivo deve ser prosseguida a demanda sem cessar, com persistência, por todos os intervenientes. Demora, é certo, demais quase sempre, mas é assim que se consegue ir resolvendo assuntos em Bruxelas. Nunca desistindo. Com diplomacia e perseverança. E com o imprescindível empenhamento do Estado. E, neste caso, por uma razão maior e capital. É a luta pela sobrevivência que está em causa.