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Derrota de Macri nas eleições primárias coloca Argentina sob risco de turbulência financeira

Foto REUTERS/Luisa Gonzalez
Foto REUTERS/Luisa Gonzalez

A derrota por ampla margem do Presidente Mauricio Macri nas eleições primárias deste domingo na Argentina torna a sua reeleição praticamente impossível e abre, segundo analistas, um período de risco de turbulência financeira com possibilidade de corrida cambial.

Quando estão contabilizados 97,61% dos votos das chamadas Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (PASO) os resultados revelam uma dura derrota para o Presidente Macri na sua campanha pela a reeleição a 27 de outubro próximo. O candidato da ex-presidente Cristina Kirchner, Alberto Fernández obteve 47,66% dos votos enquanto Macri ficou com 32,08%.

Ou seja, entre a continuidade de Macri e a volta de Cristina Kirchner (candidata à vice-presidência), os argentinos optaram pela direita e o chamado kirchnerismo numa eleição primária não-vinculante, mas que, na prática, funciona como uma primeira volta.

A diferença de mais de 15 pontos percentuais não estava nas indicações dadas por nenhuma sondagem eleitoral e triplicou a diferença de cinco pontos que o Governo e os analistas indicavam como o limite para que Macri conseguisse reverter o resultado até outubro.

“A diferença do resultado foi muito maior do que podíamos supor. Pelos números da economia, era mais provável que a oposição ganhasse, mas havia outros aspetos que beneficiavam o Governo como transparência e combate à corrupção, mas isso não aconteceu”, explica Mariel Fornoni, diretora da Management & Fit, empresa especializada em opinião pública.

Assim, a recessão combinada com alta inflação e o aumento do desemprego combinado com o da pobreza provocaram o chamado “voto castigo” que nenhuma sondagem detetou com precisão.

“Para o Governo, acabou. É muito difícil imaginar que possa reverter este resultado até outubro. Macri não tem opção de ser eleito, mas tem a opção de terminar bem o seu mandato com a economia em ordem ou numa situação de descalabro económico. E a oposição peronista precisa de comportamentos responsáveis”, considera o analista político Marcos Novarro.

Visivelmente abatido nas imagens transmitidas pelas televisões, Macri reconheceu o mau desempenho. “Hoje tivemos uma má eleição e isso obriga-nos a redobrar os esforços para que em outubro possamos conseguir o apoio necessário para continuar”, disse, sem entusiasmo.

“Dói-me na alma que haja tantos argentinos que acreditem que há uma alternativa de voltar ao passado”, lamentou em relação à preferência pelo candidato peronista Alberto Fernández, escolhido por Cristina Kirchner, sendo ela a candidata a vice.

Para ser eleito Presidente na primeira volta, bastam 45% dos votos ou acima de 40% com uma diferença superior a dez pontos sobre o segundo colocado. Alberto Fernández ganhou com as duas opções.

A contundente vitória será posta a prova a partir de hoje pelos mercados que desconfiam do modelo kirchnerista que prega o protecionismo comercial e a intervenção do Estado na economia.

“Ninguém esperava por esses números. Todas as sondagens falharam. O que vai acontecer agora não se sabe. O mercado terá a sua posição. Da nossa parte, vamos cuidar de tudo o que estiver ao nosso alcance”, garantiu Macri, desafiando Alberto Fernández a explicar aos mercados financeiros o que vai fazer com a economia.

“É preciso que aqueles que receberam esse apoio (nas urnas) expliquem uma alternativa de futuro para que as eleições de outubro aconteçam num clima positivo”, indicou.

“Os que estão intranquilos que se tranquilizem porque nunca fomos loucos governando”, afirmou por seu turno Alberto Fernández no seu discurso de vitória nesta primeira volta, como se já estivesse eleito.

No entanto, o candidato também repetiu uma das suas promessas de campanha de cortar a taxa de juros que se paga hoje aos bancos por títulos públicos argentinos e usar a diferença para dar medicamentos grátis a todos os reformados do país.

“Vamos dar remédios aos nossos avós em vez de pagar juros aos bancos”, afirmou.

“Na Argentina, os mercados são atores muito importantes porque podem contribuir para a estabilidade política ou para a turbulência. Abre-se agora uma zona de incerteza complicada. Essa é a preocupação com o dia seguinte”, alerta o sociólogo e analista de opinião pública, Eduardo Fidanza.

“Esta segunda-feira será um dia muito complicado nos mercados. O grande risco é que haja uma forte corrida cambial durante este período eleitoral. O Governo deve focar-se na estabilidade económica e na governabilidade porque ainda falta muito até ao final do mandato (10 de dezembro)”, avaliou o analista político Sergio Berensztein.