Mundo

Crise venezuelana já não é regional mas palco de guerra moderna

None

O jornalista e escritor brasileiro Leonardo Coutinho defende que a crise na Venezuela deixou de ser um problema regional e tornou-se palco de uma guerra moderna, culpando Hugo Chávez pelo colapso económico e institucional do país.

“Estou convencido que a questão venezuelana já evoluiu de uma crise para um conflito”, considera o jornalista em entrevista à agência Lusa.

“A Venezuela é hoje o palco de uma guerra moderna onde todos os agentes extra-regionais que dão suporte ao regime do [Presidente] Nicolas Maduro estão em disputa por influência na América Latina”, salienta.

No seu livro “Hugo Chávez -- o colapso da Venezuela”, Leonardo Coutinho refere ter usado milhares de páginas de documentos e centenas de entrevistas e defende que “as ações de Hugo Chávez deixaram marcas em todo o mundo, desde a explosão da violência na América Central e no México até ao financiamento de organizações terroristas como o [grupo ‘jihadista’] Estado Islâmico”.

Ao longo da investigação, afirma o jornalista à Lusa, “aprendi que a crise venezuelana e o colapso económico e institucional que hoje vemos não são obras do acaso ou incidentes”.

O ex-Presidente Hugo Chávez pensava que “a forma mais eficiente de neutralizar a oposição e os seus financiadores seria a destruição da iniciativa privada”, considera o jornalista, sublinhando que “o regime tinha planeado que as receitas do petróleo seriam capazes de suprir todas as necessidades dos venezuelanos”.

Os chavistas achavam que as receitas do petróleo seriam suficientes para cobrir os custos de importação de todos os bens e produtos que deixariam de ser produzidos no país e que a nova elite ‘bolivariana’ substituiria os rivais.

“Os planos fracassaram” por incompetência e corrupção, diz Leonardo Coutinho.

Para o autor, Hugo Chávez nunca escondeu os seus planos de reengenharia geopolítica e “investiu numa revolução para além das fronteiras venezuelanas”.

Segundo lembra, o seu livro descreve como Chávez “financiou -- valendo-se das receitas do petróleo -- e inflamou -- valendo-se da ideologia e de instrumentos não convencionais de guerra -- conflitos em várias partes do planeta”.

Segundo enumera, as impressões digitais de Chávez foram encontradas em casos como um de 2007, quando o então Presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, e Hugo Chávez conspiraram com a Argentina para contrabandear segredo nucleares para Teerão, ou quando voos militares cheios de cocaína foram enviados de La Paz, na Bolívia, para abastecer cartéis da América Central e do México e fazer chegar a droga aos Estados Unidos.

“Chávez ajudou a criar instabilidade em outras partes do planeta como forma de convulsionar ao máximo as relações internacionais, enfraquecer os seus inimigos e desviar a atenção dos seus planos regionais de redesenhar o mapa do continente”, alega o escritor.

“Nos anos de chavismo, o regime tomou muitas decisões que levaram a Venezuela ao colapso”, garante Leonardo Coutinho, defendendo que “depois, a própria crise passou a ser um instrumento político”.

Nos últimos anos, o herdeiro do regime, Nicolas Maduro, “foi o protagonista das principais crises que enfrentou”, refere, adiantando que “há suspeitas de que o regime criou intencionalmente instabilidades para justificar o endurecimento em relação aos opositores e à própria população”.

Hoje, a crise é interna e externa. A Venezuela é vista por potências como a Rússia e a China como o “trampolim para a conquista de hegemonia numa região historicamente associada aos Estados Unidos.

“Chávez iniciou essa rutura. China, Rússia, Irão, Turquia e Cuba aproveitaram isso e pretendem ampliar essa fratura”, avalia Leonardo Coutinho, defendendo que a dívida financeira da Venezuela a Pequim e a Moscovo é uma questão secundária, quando comparada com “a relevância que é ter o controlo da Venezuela e, a partir dela, tentar ampliar essa influência”

Admitindo estar muito pessimista em relação à forma como estão a ser conduzidas as “soluções” para o conflito, Leonardo Coutinho defende a sua visão para acabar com a ditadura naquele país.

“Enquanto a força de Pequim e de Moscovo na Venezuela não for entendida e atacada por mecanismos políticos e económicos, Maduro -- ou quem quer que possa vir a substituí-lo -- continuará a depender desses dois governos”, conclui.