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Análise

Guião para o autarca ideal

A 12 de Outubro, os madeirenses irão pela terceira vez às urnas este ano. Desta feita para escolher quem governará municípios e freguesias. Mesmo que seja desmedida a tentação de encarar as próximas eleições como mero episódio da titânica luta partidária regional. Mesmo que o poder local se transforme por vezes em palco de vaidades ou rampa de lançamento de hipotéticas promissoras carreiras políticas. Mesmo que a primeira linha da democracia onde os cidadãos sentem, de forma mais imediata, os efeitos da boa ou má governação, possa ser subestimada.

Uma vez que os eleitores vão também escolher a forma como querem viver em comunidade, como entendem que a sua terra deve ser cuidada e como desejam que o futuro se construa; uma vez que ser autarca é, acima de tudo, assumir responsabilidades perante os cidadãos, lidando com problemas concretos sem desculpas, antes com mestria e soluções; uma vez que quem se candidata deve estar preparado para servir o povo com seriedade geradora de confiança, mais do que conselhos brandos aos que procuram glória, exige-se urgência aos que pedem votos e assumem compromissos, mesmo que nem sempre conhecedores das competências dos órgãos a que se candidatam, nem capazes de fazer diagnósticos honestos e de definir prioridades exequíveis.

Da série de trabalhos realizados pelo DIÁRIO sobram veredictos severos de realidades relativizadas pelos decisores, mas também as legítimas aspirações daqueles que permanentemente contribuem com os seus impostos para o futuro comum, não raras vezes desiludidos com a burocracia excessiva, a falta de transparência, o despesismo injustificado, o desleixo incompreensível e o deslumbramento dispensável.

Neste contexto, o autarca ideal deve ter bem mais do que apoios sonantes, instinto político, estratégia rígida e postura arrogante. Aliás, qualquer guião para o sucesso recomenda-lhe prudência, competência e lucidez. O elementar é servir primeiro para depois melhor governar, o que implica ouvir mais e falar menos. Quem procura apenas estatuto ou protagonismo anda iludido e quem se limita ao conforto do gabinete arrisca o fracasso. É adoptar a transparência como regra se é que não quer ser envolvido em suspeitas de negócios obscuros e favorecimentos. É planear com visão já que o improviso não edifica e a dependência de agendas partidárias de curto prazo nada de estruturante resolve. É compatibilizar tradição e inovação, não sendo aceitável usar a identidade local como desculpa para o imobilismo, nem a modernidade como pretexto para destruir património. É cuidar dos mais vulneráveis a quem quase tudo falta e dar vez e voz aos jovens, por vezes tratados como meros figurantes eleitorais, embora todos saibam que se não lhes abrirem portas, continuarão a sair pela janela da emigração. É zelar pelo espaço público, com gestão rigorosa, consciente que o lixo, a degradação e o caos urbanístico não se resolvem com slogans. É praticar a proximidade feita de presença constante onde há problemas e não apenas onde há votos. É deixar marca eloquente, pois a propaganda passa, os mandatos acabam, mas a obra – ou a falta desta – fica para sempre.

A cidadania madeirense já manifestou que fará a sua parte no próximo sufrágio. Resta saber se os que forem eleitos vão honrar prioridades que ousaram colocar nos manifestos e se o farão com ética, coragem e resultados.