É possível fugir à instabilidade?
João Pedro Olim, jornalista natural do Porto Santo, a trabalhar no continente, mede a temperatura política ao penúltimo dia de campanha
"Não se pode viver constantemente em miniciclos e correr para os Palácios de São Lourenço e Belém a pedir constantemente novas eleições"
A política requer estabilidade. É algo que a Região desconhece desde 2023. O nível de instabilidade está ao nível da I República. A capacidade de gerar soluções estáveis de governo tem sido uma miragem. As maiorias absolutas são cada vez mais difíceis num sistema tão fragmentado e nenhuma candidatura foi mobilizadora o suficiente para se pensar nesse cenário.
Existem dúvidas sobre a capacidade dos dois blocos – PSD e PS/JPP – conseguirem formar um governo estável para os próximos 4 anos.
Durante a campanha eleitoral, Miguel Albuquerque foi o alvo de toda a oposição. Dificilmente, terá algum partido a lhe dar a mão como no passado. O Chega já entregou o aviso do “não é não”, mas Miguel Albuquerque diz que só sai de cena se perder.
À direita, há incapacidade de criar uma solução. E à esquerda? A aliança previsível entre o PS e o JPP vai precisar de outros parceiros. Paulo Cafôfo tem vincado nos últimos dias que é preciso tempo para negociar uma alternativa ao PSD. O PS rejeita acordos com o Chega. O JPP separa esse partido das pessoas que o integram e não as exclui de um acordo. Uma solução PS/JPP com a luz verde do Chega seria tão caricata como irrealista. O que diriam Pedro Nuno Santos e André Ventura?
Nestas eleições regionais espera-se a bipolarização entre estes 2 blocos políticos. Os pequenos partidos vão lutar para assegurar representação. No final de mais uma campanha, fica claro que não existem soluções mágicas ou milagres no horizonte que afastem o fantasma da instabilidade.
Qualquer governo que resulte destas eleições estará a prazo. Não é expectável que a capacidade de diálogo e de espírito de compromisso que faltou nos últimos 2 anos surja agora à tona da água. Mais do que um balanço da campanha, o importante agora é pensar no dia seguinte às eleições. O que farão PS e JPP no caso de voltar a existir um governo minoritário do PSD? E o PSD o que fará perante um governo PS e JPP? O programa do próximo governo não pode ser rejeitado. Não se pode viver constantemente em miniciclos e correr para os Palácios de São Lourenço e Belém a pedir constantemente novas eleições.
À classe política não se pedem soluções mágicas ou milagres, pede-se um compromisso que evite a instabilidade.
Assistimos a uma campanha em que os casos judiciais foram usados para ataques pessoais. Usar o argumento “tenho uma melhor conduta que tu” ou desvalorizar a ética na política é pouco para quem deseja governar a Região. Todas as candidaturas manifestaram-se, e bem, contra qualquer ato de corrupção. Nos programas eleitorais, os partidos defenderam regimes de incompatibilidades e impedimentos, um código de conduta para os membros do Governo Regional, uma justiça mais célere, etc. Está tudo certo, mas o tempo dedicado a estes temas na campanha foi quanto? Honestamente, pouco. A confiança nas instituições merecia um debate mais profundo, do que a simples apresentação de medidas. Este não é um assunto alheio à vida dos eleitores.
O papel dos líderes nacionais é sempre motivo de múltiplas questões numa campanha regional. Ausências geram questões. Presenças geram questões. Em caso de vitória, tiram-se os louros. Em caso de derrota, diz-se que os resultados impedem leituras nacionais. A braços com uma crise política nacional, Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos decidiram não vir à Região. Talvez a troca de acusações sobre a responsabilidade na queda do governo central fosse mais importante. Ao longo da campanha, PSD e PS tentaram desvalorizar as ausências. Albuquerque sublinhou que não precisava de “bengalas” e Cafôfo não “enfiou a carapuça”. Tudo errado numa estratégia eleitoral que afasta a Madeira dos centros de decisão nacional. A presença de líderes nacionais permite que os problemas da Região sejam acompanhados por agentes políticos que também têm responsabilidades perante os madeirenses.
Em campanhas eleitorais, os estudos de opinião são importantes. Não podem ser demasiadamente valorizadas ou menosprezadas. São fotografias do momento. A última semana de campanha ficou marcada pela divulgação de duas sondagens. Em estudos de opinião só existem duas reacções possíveis: a satisfação perante as intenções de voto e a estranheza perante resultados menos positivos. Os jornalistas desdobraram-se em pedir reacções e entre os menos satisfeitos surgiu a estratégia de sempre. “Valem o que valem”. “A verdadeira sondagem é feita no dia das eleições”. Uma campanha com vários estudos de opinião torna-se mais dinâmica, porque é possível medir o pulso do eleitorado e analisar as tendências de forma mais regular. Os estudos de opinião também permitem aos partidos ajustarem estratégias eleitorais. Tenho pena que não tenham sido publicados mais estudos de opinião. A campanha eleitoral teria sido mais dinâmica, no mínimo.
Os madeirenses estão cansados de sucessivas eleições. A conclusão é admitida por todos os agentes políticas. Mais do que isso, os madeirenses estão cansados das mesmas estratégias eleitorais velhas e aquecidas. O PSD quer uma maioria sólida e estável. O PS conta com os indecisos para que tudo não fique na mesma. O JPP deseja apenas ter mais votos do que os sociais-democratas e o Chega contenta-se em afastar Albuquerque. Poucos foram os apelos que serviram para criar uma lógica de interesse e dinamismo junto do eleitorado. A atmosfera em torno de uma campanha aguerrida, bem disputada e de suspense terminou algures entre as autárquica de 2013 e as regionais de 2019. O voto na mudança ou na continuidade estavam bem personalidades. Agora, o que reina no ar é, infelizmente, a descrença e o cansaço. Esta campanha eleitoral não ficou marcada pela novidade. Quem fica a perder é a democracia.