Cafôfo acusa Governo de desistir dos madeirenses e de ter "prioridades invertidas"
O presidente do PS-Madeira e líder parlamentar do partido acusou, esta quarta-feira, o Governo Regional de desistir dos madeirenses e porto-santenses e de ter prioridades invertidas, ao cortar em áreas como a saúde e a habitação e apostar na construção de campos de golfe.
Esta tarde, os socialistas promoveram umas jornadas parlamentares para analisar o Orçamento Regional para 2026, com Paulo Cafôfo a criticar as opções do Executivo, "numa conjuntura em que a Região continua a arrecadar recordes de receitas, em que o Governo apregoa o crescimento do PIB, mas a população continua a enfrentar problemas em várias áreas", refere uma nota enviada.
De acordo com o líder socialista, temos uma “Região rica que mantém um povo pobre”. “Nós temos dois mundos: o mundo do PSD e o das pessoas. No mundo do PSD, a Madeira é um caso de sucesso económico, com recordes do PIB, mas, por outro lado, temos o mundo das pessoas, que é diferente da narrativa laranja do PSD”, afirmou.
Paulo Cafôfo apontou o facto de a Madeira ter um risco de pobreza muito elevado, bem acima da média nacional, de ter um salário médio mais baixo, uma inflação superior ao Continente e Açores e com a habitação a registar dos preços mais altos do país.
Além disso, deu conta que, em 2024, a Região teve um excedente orçamental de 200 milhões de euros e bateu recordes de receitas, mais de 60% das quais provenientes dos impostos. Este ano, segundo o boletim de execução orçamental de novembro, o saldo excedentário já atinge os 215 milhões de euros.
No entanto, apesar destes resultados, o presidente dos socialistas constatou que, no Orçamento Regional para 2026, o Governo irá cortar 50 milhões de euros na saúde e 60 milhões na habitação, dando prioridade à construção de campos de golfe, no valor de 22 milhões de euros.
“Este orçamento, mais do que um documento técnico, é um espelho que reflete quem desiste dos madeirenses e dos porto-santenses e quem está ao lado das pessoas”, expressou, criticando duramente os cortes nas verbas para as referidas áreas, contrariamente às prioridades estabelecidas pelo Programa de Governo, aprovado em maio passado.
“Na primeira oportunidade, o Governo desiste da habitação e corta na saúde. Nós queremos melhorar este orçamento, porque não desistimos dos madeirenses e porto-santenses”, salientou Cafôfo, dando conta que o Partido irá entregar algumas propostas de alteração ao documento.
As jornadas dividiram-se em dois painéis temáticos, a Economia e o Social. No primeiro painel, o economista Maximiano Martins fez uma análise dos últimos 30 anos, criticando o regime mono-partidário pela “inércia” e pela “falta continuada de ambição e de visão estratégica”.
O orador alertou para o facto de o PIB da Região crescer, mas isso não atenuar a desigualdade nem garantir a sustentabilidade em todas as suas vertentes – económica, social e ambiental.
Referiu-se ainda àquilo que classificou como a “moda do golfe”, adiantando não encontrar justificação para o investimento público neste domínio.
Por seu turno, Mara Franco, professora universitária, abordou os desafios do turismo, apontando o caso concreto da capacidade de carga dos pontos turísticos e adiantando que está a colaborar num projeto que conduzirá à atualização dos modelos que definem essa mesma capacidade de carga.
A investigadora explicou que o que está na génese deste problema é a mudança de comportamento do consumidor, algo que começou a verificar-se após a pandemia. Como referiu, estamos perante um turista que procura o bem-estar, a autenticidade e que, ao mesmo tempo, é mais individualista, o que explica as mudanças que estamos a observar na nossa Região. Trata-se de um turista ativo, que quer ir pelos seus próprios meios e demorar o tempo que acha necessário em cada sítio, disse, defendendo ainda que esta procura turística tenha benefícios para a comunidade local.
"GESBA foi capturada pelo PSD " e é "caso de polícia"
Já Rufino Nascimento, médico e agricultor, deu conta dos dados referentes ao sector da banana, adiantando que há cerca de 2.850 produtores e que a área de produção apresenta valores díspares. Por um lado, a GESBA indica que são 674 hectares, ao passo que a Direção Regional de Estatística diz que são 880 hectares. A produção este ano deverá situar-se um pouco abaixo das 21.500 toneladas, o que corresponde a um valor um pouco acima dos 28 milhões de euros.
O orador fez uma retrospectiva desde a criação da GESBA, em 2008, empresa que surgiu quando “o Governo Regional tinha a certeza que vinha um pacote de massa da União Europeia”. Rufino Nascimento lembrou que a GESBA tinha como um dos principais objetivos aumentar o rendimento dos produtores, mas denunciou que tudo acabou por ser uma “falácia”, considerando que o que se passa é um “caso de polícia”.
O preletor disse que “a GESBA foi capturada pelo PSD e pelo pessoal do PSD com poder executivo, sendo de lá que vêm todas as opções e decisões”. Afirmou ainda que nunca apareceu nenhuma alternativa à empresa pública porque “a GESBA foi blindada desde o seu início”.
"Desorganização" na Saúde e falta de resposta para altas problemáticas
No painel dedicado à temática do Social, o enfermeiro Gonçalo Jardim mostrou a sua preocupação com o corte de 50 milhões de euros na Saúde e denunciou as falhas de planeamento no setor.
O orador, que é enfermeiro especialista em saúde mental, alertou que há um problema de estrutura nos cuidados de saúde primários, apontou também que neste momento há uma escassez enorme de assistentes operacionais e chamou a atenção para a questão das altas problemáticas, referindo que há mais de 230 utentes nesta situação, alguns deles inclusivamente no serviço de urgência.
Por seu lado, Ricardo Freitas, dirigente sindical, alertou para a importância de encontrar mecanismos no modelo orçamental que respondam às necessidades dos trabalhadores, focando a necessidade de dotar a componente trabalho de uma componente salarial que permita o consumo.
O orador aproveitou para fazer referência às alterações em termos de legislação laboral, que se encontram na ordem do dia, considerando que se trata de uma contra-reforma que vem ao encontro das aspirações dos empresários e do capital e alertando para o enfraquecimento do fator trabalho (dos trabalhadores em termos individuais). “Esta direita tem uma visão de mercado ao serviço do capital e sabe ao que vem”, disse Ricardo Freitas, vincando a urgência de encontrar normas mais equitativas que protejam aqueles que são mais frágeis.
Já o arquitecto Amílcar Nunes abordou os problemas da habitação, sector que enfrenta grandes desafios, chamando a atenção para a necessidade de apostar verdadeiramente no planeamento.
Como referiu, não se olhou inicialmente para o território como um todo e os problemas da habitação acabam por ser derivados dessa falta de estratégia global. “Não há estratégia. Tratamos disto como um desenrasque e como uma solução a curto prazo”, criticou, frisando que há que olhar para o território e traçar estratégias, quer para o arquipélago, quer para os próprios municípios.
Além do problema da falta de habitação, Amílcar Nunes apontou também a falta de um sistema de transportes públicos que faça a ligação eficaz e rápida entre os centros urbanos