Carta aberta ao presidente da Câmara do Funchal
A Baixa do Funchal transformou-se, nos últimos anos, num laboratório permanente de bloqueios, desvios e constrangimentos, sempre justificados pela realização de mais um evento desportivo, social ou turístico. A cidade, que deveria servir em primeiro lugar quem nela vive e trabalha, tornou-se palco constante de interrupções que recaem, inevitavelmente, sobre os mesmos: moradores, comerciantes e trabalhadores que, dia após dia, têm de suportar o incómodo de ruas cortadas, acessos limitados e transportes públicos obrigados a procurar paragens alternativas, muitas vezes afastadas e sem condições.
E como se não bastasse, ontem, domingo, parte da Baixa voltou a estar condicionada devido a uma prova de motas — mais um episódio que demonstra a total insensibilidade de quem decide. É um desgaste acumulado, um cansaço que não se resolve com slogans festivos nem com fotos de cartaz.
Recordo bem a promessa do então presidente Pedro Calado, que garantiu que o Funchal deixaria de estar “bloqueado tantas vezes”. Promessa essa que, tal como tantas outras, acabou esquecida no momento em que era mais necessária. Continuamos a assistir ao mesmo padrão: calendário cheio, ruas fechadas, população ignorada.
Não se discute a importância dos eventos nem o interesse em dinamizar a cidade, mas pergunta-se: por que razão não se exploram alternativas nas zonas altas, onde existe espaço, acesso e potencial para acolher actividades de grande dimensão? Por que motivo se insiste sempre nos mesmos locais, como se a Baixa fosse um tabuleiro de jogo disponível para qualquer iniciativa?
É inaceitável que, para servir minorias, grupos específicos, interesses particulares ou projectos de visibilidade pontual, se continue a prejudicar a maioria dos cidadãos. A cidade não é um palco para uns poucos; é um lugar para todos. Chega de impor sacrifícios permanentes a quem só quer viver, circular e trabalhar com dignidade. É tempo de cumprir o que se prometeu e, sobretudo, de respeitar quem faz do Funchal uma cidade viva todos os dias.
José Pereira