Será que o programa de apoios mais concorrido do país exclui a Madeira?
Anteontem, abriram as candidaturas ao programa E-Lar, que apoia as famílias na substituição de equipamentos a gás (esquentadores, placas de fogão e fornos) por alternativas eléctricas mais eficientes. À partida, a medida interessa muito à população, pois apenas nos primeiros dois dias foram recebidas 14 mil candidaturas e a respectiva plataforma online até sofreu um ‘apagão’ devido aos muitos acessos. Uma publicação na rede social Reddit garante que este “programa de incentivo E-Lar foi lançado para apoiar a transição energética nas habitações... mas só em Portugal Continental”, já que “a Madeira fica de fora”. Será mesmo assim?
O programa E-Lar é uma iniciativa do Governo da República, através do Ministério Ministério do Ambiente e da Energia. É financiado por verbas europeias do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), através do Fundo Ambiental. Destina-se a reforçar o combate à pobreza energética e promover o conforto térmico das habitações carenciadas, incentivar a substituição de equipamentos antigos por equipamentos novos de menor consumo, e acelerar a electrificação de consumos substituindo equipamentos a gás por eléctricos. Os apoios podem ser utilizados, por exemplo, para comprar placas eléctricas de indução e convencionais, fornos eléctricos ou termoacumuladores elétricos. As pessoas que se candidatam e cuja candidatura é aprovada recebem um ‘voucher’ de apoio à operação. A comparticipação pode cobrir até 100% do investimento elegível.
O aviso que regulamenta o programa E-Lar (Aviso n.º 10/C13-i01/2025) especifica que só podem candidatar-se as pessoas singulares residentes em “todo o território de Portugal Continental”. No site do Fundo Ambiental e no comunicado do PRR é novamente referido que a elegibilidade restringe-se ao território continental. Por sua vez, no site de candidaturas, há listas de fornecedores de equipamentos dos 18 distritos de Portugal continental, mas não dos Açores ou da Madeira.
De facto, Portugal é um Estado unitário e o PRR é nacional, mas como há duas regiões autónomas, com governos próprios, foi negociada uma repartição territorial daqueles fundos.
Os montantes atribuídos directamente às regiões autónomas têm uma gestão regional, sendo alocados a medidas próprias, adaptadas às necessidades específicas dos respectivos territórios, economias e populações.
No que diz respeito ao território do continente, o Governo da República optou por avançar com o E-Lar para incentivar as famílias a adquirir equipamentos domésticos mais eficientes em termos energéticos. O Governo Regional não criou uma medida equivalente, reservando os apoios para outras prioridades.
Esta exclusão das regiões autónomas do âmbito do E-Lar já foi criticada por deputados dos Açores e da Madeira, que consideram esta situação discriminatória. Ontem mesmo, Filipe Sousa (JPP) afirmou que “não há justificação técnica, jurídica ou financeira que legitime esta exclusão”. “O que há é um centralismo persistente que insiste em tratar os cidadãos da Madeira e dos Açores como portugueses de segunda", denunciou o mesmo político, que exige que “o Governo da República corrija imediatamente esta injustiça, incluindo as regiões autónomas no programa E-Lar ".
Já antes, a 17 de Setembro, o grupo do PS na Assembleia Legislativa dos Açores criticou esta exclusão das famílias insulares e pediu explicações ao Governo Regional daquele arquipélago sobre o assunto. Na resposta, o executivo açoriano (liderado pelo PSD) informou que naquela região autónoma foi criado o sistema de incentivos SOLENERGE, que abrange apenas os residentes nos Açores. Revelou ainda que está a negociar com o Governo da República para que o novo Plano Social para o Clima (PSC), que entrará em vigor após a vigência do PRR, preveja uma dotação específica para a Região Autónoma dos Açores, destinada a um sistema de incentivos no mesmo modelo do E-Lar. Está também a preparar uma medida própria para responder às necessidades das famílias açorianas, com atribuição de um vale às pessoas em situação de pobreza energética, destinado a apoiar a aquisição de equipamentos que permitam melhorar o desempenho energético das habitações.
Um caminho semelhante está a ser seguido pelo Governo Regional da Madeira. Em Agosto passado, em declarações ao DIÁRIO, o secretário regional de Equipamentos e Infraestruturas, Pedro Rodrigues, revelou que está em fase de planeamento uma medida equivalente, que deverá contar com verbas do Fundo Social para o Clima. Contudo, tal apoio só será implementado entre 2026 e 2032.
Conclui-se, pois, que os residentes na Madeira e nos Açores são os únicos portugueses que estão excluídos do programa E-Lar.