Fact Check Madeira

Custos com pessoal no alojamento turístico nunca foram tão altos quanto em 2022?

Foto Shutterstock
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O sector do alojamento turístico, nomeadamente a Hotelaria, que representa a maior fatia do sector, nunca gastou tanto com os trabalhadores remunerados. Este indicador vem, em parte, contrariar o que tem sido a reivindicação por mais e melhores rendimentos dados os proveitos recorde que têm sido acumulados nos últimos dois anos, nomeadamente face ao anterior máximo, em 2019. E 2023 também afigura-se como máximo potencial de proveitos - até Junho supera qualquer outro período desde 1976 -, o que implica que os custos com o pessoal terão, necessariamente, de acompanhar o bom desempenho, compensando o avolumar do trabalho à conta de um aumento considerável de turistas na Região Autónoma da Madeira.

Então, a questão é se há razões de queixa face aos valores indicativos de proveitos, pessoal ao serviço e custos com estes, por parte do sector? Haverá, seguramente, uma vez que se fizermos uma média veremos esta conclusão.

Em 2019, no pré-pandemia, havia 7.223 pessoas ao serviço no alojamento turístico, tendo custado 119.987.428 euros, ou seja quase 120 milhões de euros. Isto, num ano cujos proveitos totais  foram de mais de 407,4 milhões de euros. No anterior (2018), havia 7.127 pessoas ao serviço que custaram mais de 117,5 milhões de euros, mas num ano que até então fixara o recorde de proveitos (426,7 milhões de euros). Ou seja, num ano em que até as receitas tinham sido extraordinárias, mas registou-se uma diminuição de 4,5% nos proveitos face ao ano anterior, o sector aumentou as despesas (+2,1%) porque também aumentou o pessoal ao serviço (+1,3%).

O problema é que no ano seguinte, 2020, veio a pandemia, com reflexos notórios também em parte de 2021, embora já revelando alguma recuperação. Por isso, o grande ano de comparação só pode ser 2022.

E no ano passado o pessoal ao serviço, 7.234, superou já os de 2019. Embora os melhores anos tenham sido já há quase 20 anos, nomeadamente em 2002, 2003 e 2004, com média de 7.364, e que ocupam o 'pódio' de anos com mais gente a trabalhar no alojamento turístico, em 2022 estavam empregadas mais 0,15% pessoas do que em 2019.

Como referido, o custo com pessoal também atingiu valor máximo (129,9 milhões de euros) dos dados disponíveis - não contamos, obviamente, o contexto inflacionário porque não há dados sobre esse tema -, mas a verdade é que em relação a 2021 (tenhamos aqui esses dados apenas para referência), foram (re)colocadas mais de 2 mil pessoas de volta (ou entradas novas) ao sector, totalizando 5.116 pessoas, que custaram 86,6 milhões de euros e num ano com proveitos de 265,4 milhões de euros. Ou seja, no ano seguinte, já com o sector em altas, o pessoal ao serviço aumentou 41,4%, os custos aumentaram 50,1% e os proveitos totais aumentaram 99,5%. Ou seja, quase o dobro do ano anterior, para um total 529,6 milhões de euros.

Este ano de 2023, os proveitos totais até Junho já vão nos 293,4 milhões de euros, mais 33,1% do que em igual período de 2022 (220,5 milhões de euros). Se o ano terminasse com o mesmo nível de crescimento que teve até à primeira metade, estaríamos perante proveitos totais que rondariam os 705 milhões de euros. Só no final das contas saberemos.

Mas poderemos afirmar que, se fosse para crescer ao mesmo nível em 2023, como ocorreu entre 2022 e 2019 (+8,3%), os custos com pessoal poderiam ascender este ano a 140,7 milhões de euros, isto num sector que tem tido dificuldades em recrutar mão-de-obra na Madeira, sendo obrigada a trazer pessoas de fora. Muito provavelmente os custos com pessoal estarão este ano acima do ano passado, recordando que a inflação disparou para 6,95% em 2022 e este ano tem vindo a sofrer algum abrandamento.

No fundo, o aumento dos custos com pessoal será mais evidente pela necessidade de mais mão-de-obra, o que obriga ao pagamento de melhores salários, mas também porque o sector neste momento está a crescer como nunca. Contudo, como referiu recentemente o secretário regional do Turismo e Cultura, é preciso consolidar contas, mas também melhorar os salários generalizados.

"O crescimento nos indicadores turísticos não é ilimitado. Acima de tudo, é importante consolidar estes resultados e procurar manter o excelente desempenho que o Turismo regional tem mostrado desde meados de 2021. Esta é uma tendência que permite recuperar do efeito pandémico e fortalecer a capacidade de melhor remunerar todos os colaboradores que muito têm feito para que estes resultados sejam uma realidade". Eduardo Jesus, secretário regional do Turismo e Cultura

Para se ter uma ideia, em média em 2022, o alojamento turístico na RAM teve 17.968 euros de custo com cada uma das 7.234 pessoas ao serviço. Isso dá uma média mensal (14 meses) de 1.283 euros. Quantos trabalhadores do sector ganham, efectivamente esse valor? É verdade que os custos do pessoal ao serviço envolvem mais do que um salário. Mas esse montante acaba por ser um valor bastante atractivo. Em 2019, em média cada pessoa no sector custava 16.612 euros. Ou seja, há um notório aumento do custo médio do pessoal no sector. São +8,16% em 2022 face ao que era média três anos antes. E mesmo face a 2021, com um custo médio de 16.922,5 euros, o aumento em relação ao ano passado ascendeu a 6,2%. Ou seja, abaixo da inflação.

Conseguirá o sector do alojamento turístico pagar melhor aos seus colaboradores sem colocar em causa a sustentabilidade do negócio? A resposta é sim. Mesmo porque isso já aconteceu em 2022, com custos com pessoal recorde. Contudo, também os proveitos continuam a crescer significativamente. Entre assegurar maior equilíbrio financeiro e manter o pessoal satisfeito e motivado, os turistas continuam a chegar e a gastar, alimentando o motor da economia madeirense.