Inteligência artificial, pescadinha de rabo na boca

Inteligência Artificial (IA) será um armazém interativo de dados de informação infinda disponível a ser usada pelo homem. Impossível enumerar todas as possíveis utilizações dos recursos contidos neste tesouro da criatividade humana. Afinal, nem é artificial nem inteligência; são armazéns de ferramentas e maquinaria ligados às redes sociais da Internet. Levanta-se grande alvoroço sobre os seus riscos e ameaças à humanidade; nem faltam baixos assinados a pedir que seja proibida ou suspensa para evitar males maiores que se perspetivam. As armas, as drogas e mesmo o dinheiro não serão também ferramentas perigosas?

Não inteligência artificial, mas produtos criados pela inteligência dos homens. A alusão ao seu valor, vantagens e utilizações não elimina a outra face destas ferramentas multifacetadas. Um manancial de coisas boas com um pequeno senão: serem criadas pelo homem como instrumentos e poderem ser usadas à imagem e semelhança do seu criador e utilizador. Podem ser bem e mal utilizadas. Nem é preciso divagar muito para cair na conta da sua maior desvantagem que é comum a qualquer outra ferramenta: ser mal usada pelos utilizadores, os mesmos que a criam e utilizam. Para fazer o bem e o mal. Elas não são responsáveis nem têm consciência moral. Qualquer ferramenta, uma faca, por exemplo, não tem consciência moral, nem poder de decisão livre ou qualidades éticas e morais. O homem utilizador é que pode ter ou falhar nessas qualidades. As ferramentas da Internet, e de centenas de seus acessórios, são meios de partilhar dados, informações, mediante motores de transportar noções, ideias, bases, cada vez mais subtis para grandes servidores. Estes, cada vez maiores armazéns dinâmicos que consomem grandes quantidades de energia em estruturas quase invisíveis e angélicas. Na verdade, tanto são angélicas como anjos diabólicos que podem ser usadas por homens de baixa ou nula consciência moral. Alguns nomes eufemísticos falsificam a natureza da Internet e da chamada IA com nomes enganosos. Os nomes de caldos culturais digitais, oxigénio digital, ambiente digital, são de natureza ambivalente. A IA e as redes digitais podem ser ar oxigenado e tóxico, como a faca é objeto útil que pode prestar bons serviços e salvar vidas, nas mãos de um cirurgião competente, ou, como arma branca mortal, nas mãos de um criminoso desalmado cheio de raiva e vingança, pode tirar a vida. Afinal, se pensarmos bem, tudo, exceto as pessoas, são ferramentas, mas o risco maior de sempre é fazer das pessoas ferramentas e instrumentos de consumo corrupto. Hoje, o dinheiro e tudo o que se amontoa, se compra com ele e se consome, constituem caldos que tanto podem dar vida e saúde como envenenar e dar morte aos próprios ou aos outros.

A IA e as redes da Internet, e os seus dados, são um desafio para a educação familiar, escolar e universitária. As pessoas que nelas educam não podem promover a liberdade-libertinagem imoral dos utilizadores da IA e da Internet e de pôr de lado a educação para a honestidade, verdade e bondade como se isso fosse beatice desprezível. São estes utilizadores que procedem com moralidade responsável ou irresponsável e não as máquinas, por sofisticadas que sejam, que fazem a diferença. Centrar-se nas máquinas não ajudará muito. A sofisticação das ferramentas autómatas e a facilidade do seu uso vão exigir muita integridade moral de quem as manipula. Importa investir na qualidade das pessoas. A IA torna-se facilmente pescadinha de rabo na boca que pode envenenar-se a si mesma, com o veneno que os utilizadores lhe infiltram. Será que a palavra de Cristo se aplica: o que for dito ao ouvido, ou praticado às escondidas, (por ser mau) será proclamado sobre os telhados? Nestes, é onde se ligam todos os dados armazenados; e começa a ser quase tudo o que se diz, escreve, faz com as redes, e tudo o que passa por elas e pode ser procurado com os motores de busca da IA e vir a ser usado sem limites. E se for corrupção e mentira? Bastará fazer leis penais para evitar o mau uso dos dados tornados mais acessíveis? Ou não será de se começar a aceitar que não há leis de privacidade que resistam à transgressão da malícia humana? Em que insistir: nas leis ou no aprimoramento da integridade, responsabilidade e verdade das pessoas? Vontade de escapar a ser apanhado a fazer batota ou vontade de ser livre e bom? Numa palavra: mais que ser esperto contra a vida, importa ser verdadeiro e bom. Estas questões levam o pensamento para uma espécie de juízo final antecipado. Convidam cada um a ser transparente, não de forma retórica, mas com consciência moral séria, clara e evidente.

A solução a propor é a mesma do uso de todas as coisas criadas por Deus e de invenção humana. As pessoas querem mesmo usá-las bem? Antes da IA já existia a INA, a humana, talvez pouco inteligente. Já Freud mostrou que não ajuda a humanidade reprimir a consciência e muito menos a consciência moral do bem e do mal, nem recalcar a cultura cristã que a aviva sempre mais. Só embrutecerá o homem e o nivelará com o animal selvagem. É mais fácil automatizar máquinas perigosas e fazer negócios que moralizar pessoas, e tornar a sociedade melhor com a ajuda da cultura cristã que está a ser recalcada.

Aires Gameiro