Crónicas

Um elogio à Madeira

O povo português sempre foi muito chegado à crítica. Dizemos mal por tudo e por nada, invejamos “a galinha da vizinha” e temos sempre a língua afiada quando se trata de falar dos nossos. Onde quer que chegue e quem quer que encontre por este país fora, oiço à pergunta se está tudo bem um recorrente e melancólico “vai-se andando” ou “mais ou menos”. Mesmo quando o negócio tem um dia bom, “podia ser melhor” e muitas vezes “antigamente é que era”, mas antigamente diziam o mesmo. Nunca estamos satisfeitos, o que até poderia ser bom se isso significasse que ambicionamos sempre mais, mas na verdade nunca estamos satisfeitos porque existe sempre qualquer coisinha com que gostamos de reclamar. Quando chove estamos fartos da chuva, quando faz sol está um calor que não se aguenta. É preciso recorrer ao melhor que a minha memória tem para dar, para me lembrar da última vez que ouvi alguém dizer, “epá estou mesmo bem”, “hoje o dia está fabuloso” ou “estou absolutamente satisfeito”. Somos assim e pronto, uns dizem que é cultural, outros dizem que é do fado. Na verdade somos uns chatos e muitas das vezes mal agradecidos.

Vem isto a propósito de sentir que quando oiço muitos madeirenses a falar e depois falo com vários turistas parece que existe uma realidade paralela em que para uns quase tudo está mal e para outros tudo é maravilhoso. Bem sei que viver numa determinada região não é o mesmo que a visitar esporadicamente e que um sítio bom para visitar não é sinónimo de bom para viver. No entanto, se já sentia que a região autónoma da Madeira é maravilhosa na sua diversidade e multiplicidade com a pandemia e agora com a guerra esse sentimento acentuou-se. Claro que há muito por onde melhorar, mas digam-me um sítio onde não há e eu mudo-me para lá sem pensar duas vezes. E escusa quem me lê e que se adequa ao perfil que descrevi no primeiro parágrafo de vir colocar conotações políticas ao texto porque a Madeira é o que é e tornou-se no que se tornou à custa de pessoas que tiveram a capacidade de a transformar e de a projectar, umas serão de uns partidos outras de outros, algumas farão parte de instituições públicas e muitas outras são privados que com o seu querer e a sua resiliência criaram produtos apetecíveis e ofertas tão dispares que ao dia de hoje não vive só do sol e muito menos das praias, não vive só do campo nem das levadas, nem só de Santana ou do Porto Santo. Vive em várias dimensões e com várias propostas alternativas que a tornam singular.

No Turismo por exemplo, onde é um caso de sucesso, tem conseguido ao longo do tempo, tornar-se num destino apetecível em qualquer altura do ano. Onde outros no continente ainda não conseguiram arranjar soluções para a sazonalidade, por aqui, um dia de cada vez e sem se dar por isso há agendas culturais e recreativas espalhadas de norte a Sul até à Ilha Dourada, de Janeiro a Dezembro. Alguns dirão que é da temperatura amena, concordo que ajuda, mas não é tudo. Não é preciso pensar muito para referir várias propostas que trazem milhares todos os anos ao arquipélago. A festa da Flor e o Carnaval, o glamour e a forma como se vive a passagem de ano que já não se encontra em Lisboa nem no Porto. O festival pirotécnico. As praias do Porto Santo e do Seixal. Os trails de Machico, a forma como se dinamizam cada vez mais as levadas, a floresta Laurissilva, a dicotomia mar e montanha. Umas provocadas pela natureza outras desenhadas pelas mulheres e homens que têm gosto pela terra, mas que se unem numa simbiose única, que vão carregando as ilhas para um futuro, a meu ver, promissor.

Ainda há uns dias falava com um amigo que tem uma agência de viagens há muitos anos em Fátima e que vai regularmente a feiras de turismo, um pouco por todo o lado. Dizia-me ele, que admirava muito a forma como a Madeira se tem projectado, porque onde antigamente só ouvia perguntas sobre Fátima e o Algarve agora sobra curiosidade sobre o arquipélago. Como é que se chega lá, a que sabe a poncha, como é a experiência da descida nos carrinhos de cesto e se é mesmo tão segura como dizem. Toda a gente conhece e quer ir visitar. Claro que haverá casos de corrupção e de injustiça como há um pouco por toda a parte. Haverá gente sem escrúpulos e patetas que só sabem viver a falar mal uns dos outros, mas desses pouco a história rezará. Reduzir a Madeira a isso é não querer ver o que está à vista de todos.

Recordo-me do coro de críticas há bem pouco tempo relacionado com a nova imagem e a nova assinatura da marca Madeira. Agora com os elogios que chegam de fora, já quase toda a gente parece satisfeita, mas primeiro temos sempre que criticar mesmo que entendamos pouco ou nada sobre o assunto. Sou um bocado cético em relação à criptomoeda confesso, mas muitos dizem ser o futuro e já por cá o governo se tenta posicionar na vanguarda dos territórios que pretendem estar alinhados com o investimento estrangeiro nesta matéria. Veremos se é uma aposta acertada ou não mas ousadia não lhes falta. Como não faltam também soluções para receber e dar condições a jovens empreendedores e start ups tecnológicas internacionais, que fazem das viagens e da transformação dos seus locais de trabalho uma opção de vida. Basta ver o trabalho que tem sido feito pelos Nómadas Digitais através da Start Up Madeira e da previsão do que podem aportar em termos financeiros, à economia local, num futuro próximo.

Por isso digo e repito, independentemente de partidos, do género ou de ideologias e religiões há uma fronteira que separa os que ousam fazer, os que arriscam, os que trabalham e se dedicam, dos que passam a vida a criticar, a reclamar, a difamar e a lançar suspeitas, muitas vezes com uma mão cheia de nada para apresentar. Entre os dois escolherei sempre os primeiros e a Madeira tem crescido muito à custa dos que por cá, mesmo de diferentes espectros sociais, têm empregue o seu tempo e o seu esforço a criar projectos de qualidade que fazem desta terra o que ela é hoje. Do pequeno negócio agrícola, à aposta nos vinhos, da digitalização à cultura, das tradições à evolução. Uns maiores outros mais pequenos, cada um à sua maneira tem contribuído para promover a magia que se reflete nos olhos de quem cá chega e a descobre.