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Menoridade

Há duas profissões das quais dispensamos especialistas: a do Futebol e a dos Militares

Gertrude Stein, figura incontornável da literatura americana, iniciou um seu poema com este verso: uma rosa é uma rosa é uma rosa.

Aqui se confundem tanto a dificuldade em definir algo tremendamente simples como a complexidade de fazer uma definição. Saída airosa, portanto.

Iguais problemas se põem aos alunos, quando forçados a “vomitar” uma definição. Sobretudo quando se trata de algo grandioso, como um dos ramos da Sabedoria. Assim, um Professor explicava aos seus alunos que Economia é o que fazem os economistas – ponto final. Outra saída airosa.

Na mesma linha de pensamento, a melhor definição de Democracia é ser aquilo que fazem os democratas. E aqui acerta-se em cheio, já que ninguém duvida que só a vivência da Democracia permite o seu pleno desenvolvimento.

Agora que nuvens negras se acumulam no futuro da Humanidade, com as tentações populistas e autocráticas a progredir mesmo nas Democracias há muito instituídas, convém não esquecer que, mais do que em legislação e pomposas declarações, é na vivência que se estrutura e apoia a Democracia.

Isso implica a audição de todos os cidadãos, quer formalmente através de eleições, quer através de partidos, organizações sindicais, associações cívicas e até de inquéritos e auscultações diretas, tão em voga.

Uma das explicações para as referidas ameaças está no distanciamento entre políticos e cidadãos; independentemente de quem é a culpa, ele existe, e há que reverter a situação.

É prática corrente a audição das partes interessadas quando se pretende legislar sobre qualquer assunto. Prática saudável, já que só se tem a ganhar em saber a opinião dos médicos sobre a saúde pública, dos engenheiros sobre pontes e estradas, dos professores sobre o ensino, e assim por diante. Por mais humilde que seja a profissão, há sempre um conhecimento que não pode ser menosprezado.

Mas, em Portugal, há duas profissões das quais dispensamos especialistas.

Uma é a do futebol, acerca do qual somos todos técnicos encartados e infalíveis.

Outra é a dos militares, cuja opinião não deve ser consultada, como se constatou pelas reações à posição pública de militares fora do serviço. Não estando em causa a competência das Forças Armadas (sobreabundam os elogios públicos), só pode ser atribuída essa postura a algo como a diminuição da cidadania ou a menoridade dos militares.

Tendo sido usado como argumento supremo para a reforma “o que se faz lá fora” (tal como preconizava o Dâmaso de Salcede de Eça de Queirós), valeria a pena comparar a carta dos nossos antigos CEM com as cartas de oficiais franceses e espanhóis, que puseram os respetivos países em polvorosa.

Pelo menos, ficaríamos a saber por onde andam a menoridade e a cidadania…