Telemóveis ajudam a estudar os movimentos migratórios
Um investigador norte-americano concluiu, ao estudar o fenómeno no Ruanda, que as chamadas de telemóveis e outros traços digitais podem ajudar a identificar os fatores que influenciam as decisões migratórias e a escolha dos destinos,
“Novas fontes de dados como os ‘traços digitais’ ou as ‘pegadas digitais’ estão a dar mais opções a quem estuda as migrações”, disse à Lusa Joshua Blumenstock, coautor de um estudo sobre o assunto, apresentado hoje no centro NOVAFRICA da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), em Carcavelos.
Segundo o especialista, já há muitos investigadores a usar dados de telemóveis, sobretudo para estudar as migrações internas, e começa a haver também estudos que usam outras fontes de dados digitais, como o Facebook, LinkedIn, Twitter e outras plataformas sociais, “que fornecem dados muitos precisos”.
A grande desvantagem “é que nem toda a gente usa estas plataformas, sobretudo nos países em desenvolvimento, e por isso há menos representatividade na amostra e isso limita as questões a que podemos responder”, destacou.
No estudo, intitulado “Migrações e o Valor das Redes Sociais”, em que colaboraram também Guanghua Chi, da Universidade de Berkeley e Xu Tan, da universidade de Washington, os investigadores usaram uma vasta base de dados de assinantes de rede móvel no Ruanda para relacionar as decisões migratórias dos indivíduos com as suas redes sociais, nos locais de origem e de destino.
Quando um telemóvel é usado no Ruanda, o operador regista a altura em que o aparelho foi usado, bem como a localização aproximada do utilizador, o que permitiu reconstituir as deslocações internas de um milhão de ruandeses, com base nos seus registos de chamadas e mensagens de texto, num período de cinco anos, entre janeiro de 2005 e junho de 2009.
“O facto de usarmos um grande volume de dados permitiu-nos observar os percursos migratórios de quase um milhão de indivíduos e como estes se relacionavam com a estrutura das suas redes. Obtivemos muita informação detalhada sobre como estas redes influenciam a decisão de emigrar e para onde”, explicou Joshua Blumenstock.
O estudo permitiu confirmar que as pessoas se deslocam para sítios onde conhecem mais pessoas e estão também menos propensos a sair de locais onde têm redes maiores de amizade.
Mas a maioria dos emigrantes não foram atraídos para locais onde as suas redes são expansivas e difusas (amigos bem relacionados e com um vasto grupo de amigos), preferindo redes interconectadas (amigos que têm amigos em comum), um resultado que os investigadores admitem estar relacionado com a competição por atenção e que demonstram que a partilha de riscos e troca de favores desempenham um papel importante na decisão de migrar.
“Foi surpreendente descobrir que a quantidade de amigos de amigos não parece influenciar a decisão de migrar no Ruanda, o que é importa é o quão ligados são esses amigos entre si. O que as pessoas valorizam numa rede é que ofereça apoio social, emocional e material e não uma rede que lhes proporcione mais opções e oportunidades”, referiu o académico norte-americano.
Joshua Blumenstock apontou algumas limitações do estudo. Os assinantes de telemóveis não são representativos da população: são mais ricos, mais velhos, mais escolarizados e tendencialmente do sexo masculino.
Por outro lado, os únicos identificadores usados no estudo foram os números de telemóvel, e não os indivíduos. Algumas pessoas podem usar o mesmo número e outras podem usar vários, o que pode influenciar os resultados. Além disso, uma vez que os dados são anónimos não podem ser associados a informações sobre o estatuto económico-social ou demográfico do assinante do telemóvel.