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Espelhos em Casa

Mesmo que não se faça notar tanto quanto os gadgets, como smartphones e tablets, e seja resultante de uma tecnologia muito antiga, com mais de 8 mil anos, o espelho continua a ser, hoje, uma peça de mobiliário muito útil e imprescindível. Desde os primeiros passos até às etapas mais cansadas da nossa existência, existe sempre um espelho nas nossas vidas que ajuda a compreender quem somos e orienta para que não nos tornemos ridículos aos olhos da sociedade. Esse espelho ajuda-nos a ser coerentes nas nossas atitudes, imagem e comportamentos, sendo essencial para que nos relativizemos em comparação com o outro. E é por tudo isto que é comum dizer-se que quem aponta defeitos aos outros também os tendo, e piores, “parece não ter espelhos em casa”.

Nos últimos meses, com a aproximação de mais um ato eleitoral em que os madeirenses serão chamados a escolher, de entre um grande número de candidatos, os autarcas que irão constituir as assembleias municipais e de freguesia, assim como os executivos das câmaras e das juntas de freguesia, temos constatado o despertar da atividade dos partidos políticos, adotando um registo cada vez mais incisivo e contundente. Nada de novo, não fosse a inversão de papéis que as últimas eleições autárquicas ditaram na maior parte dos municípios da Região, com o partido anteriormente hegemónico a estar agora no papel de oposição. É este dado que faz as próximas eleições, e a campanha que as está a preceder, uma oportunidade única para observar como se comporta um partido político que, depois de uma longa maratona de campanhas autárquicas a assegurar a renovação do seu poder, de repente se vê na condição de derrotado.

Para já, o comportamento do partido que ainda governa a Região, mas que perdeu a maioria das câmaras municipais em 2013, caracteriza-se pela síndrome da falta de espelhos em casa. É hilariante, e até mesmo ridículo, ver responsáveis e candidatos desse mesmo partido a fingir, sistematicamente, que foram alheios a décadas de governação ao longo das quais cometeram erros graves que agora acusam os atuais responsáveis de não resolver. Pior, apontam críticas nos municípios onde são oposição fingindo que onde são governo a situação está melhor quando, sabe-se bem, em muitos casos está bem pior. Em política, como em muitas outras áreas da nossa sociedade, para ser credível naquilo que se diz é fundamental ter alguma moral para falar, e o partido que governa a Região, renovado ou por renovar, não a tem. Finge que acabou de chegar; Finge que a paternidade da dívida que atola a Região e os municípios não é sua; Finge ser alheio ao empobrecimento das famílias madeirenses; Finge que a degradação do serviço de saúde é uma invenção dos jornalistas; Finge que as obras que esventram o património nas ribeiras foram aprovadas por extraterrestres; Finge que a debandada para a emigração e os elevados níveis de desemprego são uma consequência da conjuntura internacional; E adota um discurso hipócrita e bipolar que só revela que sai para a rua sem antes mirar-se ao espelho, como faz qualquer pessoa normal.