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Retórica de Trump é uma bênção para o jihadismo

Investigadora da Universidade do Minho e especialista em assuntos do Médio Oriente, Sandra Costa, lembra que Portugal “não está imune” ao terrorismo

Foto EPA/MICHAEL REYNOLDS
Foto EPA/MICHAEL REYNOLDS

Uma investigadora da Universidade do Minho considera que a “retórica Trump” é uma “bênção” para o jihadismo, que vê nas “políticas antimuçulmanas” da nova administração americana a “prova concreta” de que existe uma guerra contra o Islão.

Em declarações à Lusa, a especialista em assuntos do Médio Oriente, Sandra Costa, alertou que Portugal “não está imune” à possibilidade de atentados em território nacional por “questões históricas e de vulnerabilidade”, mas realçou acreditar que os grupos extremistas optam por atacar países “com mais peso” internacional e onde reside maior número de muçulmanos, como França, Bélgica ou Alemanha.

A especialista avaliou recentemente a evolução do fenómeno jihadista na Europa, dividindo-o em três épocas temporais: a primeira (1998-2003) que corresponde ao período de difusão ideológica, a segunda (2003-2011) na qual se deu uma “crescente radicalização ideológica” e a ultima, iniciada em 2011, quando se assume o jihadismo como uma ameaça mais “complexa, descentralizada e heterogénea”, fatores que Sandra Costa acredita dificultarem a deteção de planos de ação terroristas.

“A retórica de Donald Trump é bastante tóxica. A reação dos jihadistas à eleição foi quase de festa. Para eles isto tem sido uma bênção, assim como a proibição de entrada de oriundos de sete países maioritariamente muçulmanos”, analisou a investigadora.

Segundo Sandra Costa, para os militantes jihadistas, as políticas de Donald Trump são a “prova concreta” de que existe “de facto” uma guerra contra o Islão, assim como as condições de vida dos muçulmanos na Europa.

“Os jihadistas apresentam as condições existenciais dos muçulmanos na Europa, existe de facto discriminação, vivem em condições socioeconómica piores do que a generalidade da população e apresentam isto como provas de uma guerra contra o Islão”, disse.

Quanto a Portugal, Sandra Costa alertou que o território nacional “não está imune” à possibilidade de um atentado jihadista, “até por questões históricas”, mas afirmou que o país “é menos apetecível” do que outros países europeus.

“Não podemos assumir que estamos imunes a atentados. Portugal não tem o peso de outros países como a França, Alemanha, Inglaterra. Portugal tem sido referenciado por comunicados da Al-Qaeda e pelo Estado Islâmico. Para os jihadistas isto, Portugal e Espanha, é um território que pertence ao Islão, que foi perdido e que tem que ser reconquistado”, explicou.

Além disso, explanou, “Portugal pode ser considerado um alvo mais vulnerável do que a França e a Bélgica, o que coloca Portugal na mira dos jihadistas”.

No entanto, “tendo oportunidade de atacar, é preferível, para eles, atacar países como a França, porque tem mais visibilidade e vai causar mais reações”, admitiu.

Para Sandra Costa, é ainda de ter em conta que aquela que apontou como a “terceira fase do jihadismo”, que se iniciou em 2011, alterou a forma de atuar daqueles combatentes.

“A partir de 2011, temos vindo a assistir, não a grandes atentados, mas contra forças policiais, alvos mais concretos. Há mais heterogeneidade, passamos de grandes grupos de 9, 10 pessoas para grupos menores, 3, 4, duas pessoas, o que dificulta a deteção destas conspirações, embora muitas tenham vindo a ser detetadas e impedidas”.