A pobreza indefesa

Para que a pobreza não seja ainda maior, mais expressiva, vamos lá enriquecê-la, dando-lhe a palavra, falando e escrevendo mais dela, para que os que dela têm conhecimento e enchem a boca, e os que a vendo assobiam para o ar, e para que não se esqueçam que ela existe, fere como cão raivoso e faminto, mói e mata aos bocadinhos. Se os estudos e as estatísticas publicadas por quem disso se ocupa e ganha a vida, estão certos, e cremos que até podem pecar por não a porem toda descoberta, temos que em Portugal, que uma em cada quatro pessoas, percorre o dia-a-dia em cima da linha da exclusão social. Da marginalização. O número de famílias com sinais exteriores de miséria, e outros estigmas mascarados, atingem em Portugal 2,6 milhões de residentes. Neste país de vitórias atrás de vitórias, umas folclóricas outras meio pimbas, e de grandes feitos, desde o pontapé nas bolas confusas, complexas manifestações religiosas, às colcheias e semifusas dos festivais da cançoneta, Portugal, segundo os dados do INE, está “gordo” de tanta pobreza com fome à mistura. Pobreza de meios para dela se livrar, e fome de rendimentos disponíveis que não dão sequer para o mata-bicho. País desigual e injusto como este é difícil de achar na Europa, e um pouco mais além. Sol tem com fartura para turista com óculos protectores, camisa florida e chapéu de palha para se espraiar, e banhar nas águas da costa marinha. Costa optimista também há, e moreno, que enquanto 1º Ministro se regozija de contentamento, só arrefecido pelo Chefe de Estado, que aprecia o mar, mas que não brinca na areia a construir castelos, que à mínima vaga mais subida, os derruba. A pobreza entre paredes, que alberga vidas mal escoradas, é que não vai a banhos, excepto quando as lágrimas lhe escorrem pelo rosto abaixo e vão desaguar num mar de tristeza e de frustração, e nelas braceja pedindo também um chapéu que a defenda, e palha que a sustente. País desigual e injusto, que atende rápido quem cavalga a onda refugiada, e que depressa é assistida por um bando de voluntários oficiais com colete fluorescente, que lhe estende à chegada melhores condições e direitos, e lhe fornece rendimento superior àquele que disponibiliza à pobreza nacional denunciada, e à que se mantém calada numa manta de retalhos. E o país é tão pobre, que até não cativa sequer os tais refugiados bem equipados, que à mínima oportunidade abandonam quem lhes deu regalado acolhimento com braços abertos e reportagem para para têver e condoer. Os portugueses que estão em risco de pobreza e de exclusão, sujeitos a varrimento social, esses, terão que gramar a situação, aligeirada entre discursos demagógicos que a ocasião aconselha, de que o país está melhor e a crescer. Para que lado é que falta saber, mas suspeitamos que é para o lado de sempre – o dos ricos. É por estas causas e outras razões, que a pobreza se torna violenta por vezes, se incrimina a ela mesma, e vai parar atrás das grades. E por lá arranja forma de subsistência aos quadradinhos. Esta violência doméstica, o país de uma forma ou de outra, tudo há de pagar!

Joaquim A. Moura