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O Tabu

Tabu é um conceito polinésio, do pacífico. Os maoris referiam-se à proibição de falar do “sagrado”, sob pena de maldição. O capitão James Cook trouxe o termo para a Europa, língua portuguesa incluída.

Na vida social e política portuguesa abundam hoje assuntos da esfera de Lúcifer ou Satanás. Seja a veneração de ódios, à incitação da intolerância, violência e um certo sentimento de vingança subjacentes a certas posições. Sobressai uma sociedade curiosamente pouco cristã. No artigo anterior abordei uma questão que saiu dos radares da comunicação social, é quase um tabu, mas continua presente no silencioso pensamento das nossas famílias, a Natalidade, ou, em concreto, a falta dela e o que isso impacta na nossa sociedade.

Hoje trago outro. A Emigração. Calma, para os distraídos, é a (e)migração, um nacional sair do seu próprio país. Uma pesquisa revelou que a procura de notícias sobre a imigração venceu a emigração por 37/1, uma verdadeira goleada. A emigração tornou-se um Tabu no imediatismo imigratório dos nossos dias.

Não há dados exatos de quantos portugueses vivem em Portugal. O último censo é de 2021, com cerca de 9,6 milhões de portugueses. Outros 2,1 milhões nascidos em Portugal resolveram viver fora do país. Outros 3,3 milhões portugueses, não nascidos em Portugal, mas com passaporte português, vivem no estrangeiro, na sua maioria filhos, netos e cônjuges de portugueses nascidos em Portugal. Ao todo, cerca de 15 milhões.

Estudos efetuados ao longo dos anos revelam ainda haver outros 15 milhões de lusodescendentes, potenciais requerentes de passaporte português e que vivem nos EUA/Canadá, Brasil/Venezuela, África do Sul/PALOP, Europa, entre outras regiões. Somando, entre portugueses e lusodescendentes, seremos 30 milhões!

A estes se somam outros cidadãos que pouco tem a ver com Portugal, mas que apelaram a um passaporte português, especialmente os israelitas (inacreditavelmente quase metade do total), americanos, brasileiros e outros PALOP´s.

A ser assim, a maioria dos portugueses/lusodescendentes vive fora de Portugal, o que não deixa de ser um fato curioso, certamente um tabu para certas análises e conclusões. Inúmeros estudos indicam um sentimento agridoce. Muitos daqueles emigrados há muito tempo, ainda nutrem um genuíno sentimento de saudade e carinho pela sua primeira pátria. Alguns daqueles emigrados nas últimas duas décadas têm um sentimento algo mais distante, a vontade de regressar desvanece mais rapidamente e em muitos a saudade foi paulatinamente substituída pela indiferença e até um certo “angor” pelo país. Estes tendem a ser profissionalmente mais diferenciados e mais de um terço são licenciados que não vislumbraram um futuro aceitável em Portugal. O mais recente boom migratório foi o período da Troika, mas outro boom parece estar a acontecer neste momento. Um fato para mim revelador foi o dado da Ordem dos Enfermeiros em que quase 3 mil profissionais emigraram nos últimos dois anos, um recorde histórico.

É importante saber o porquê isto acontece. Não sou um especialista nesta matéria, mas posso partilhar convosco a minha convicção. Parece tonta a questão, mas para viver em Portugal é preciso ter uma casa. E as decisões económicas e políticas recentes favoreceram as casas destinadas ao alojamento local, à venda a estrangeiros e o aluguer a novos residentes no país. Os custos são influenciados pelo mercado imobiliário cada vez menos regulado e, muitas vezes, movido pelo lucro imediato. Segundo, a imparável aproximação do salário médio ao salário mínimo em Portugal, com os jovens percecionando uma carreira profissional estagnada. Cada vez mais empresários preferem contratar imigrantes, certamente mais dispostos a baixos salários, a longas horas de trabalho, certamente com menos coragem em exigir os seus direitos laborais do que os jovens portugueses. Isto mesmo que estes sejam mais diferenciados e com formação de qualidade. Terceiro, a “cultura de mérito” continua a não vingar em Portugal, mas outras causas existirão certamente.

É importante defender e apoiar a comunidade lusa em países cada vez mais hostis ou indiferentes a Portugal. Seja na América, com a sua política isolacionista que está a expulsar os não americanos. Seja na Venezuela e no seu alinhamento bolchevique e antieuropeu. Seja no poderoso Brasil, agora a décima maior economia do mundo. O seu Senado iniciará uma investigação aos maus tratos de brasileiros em Portugal e poderá reproduzir no Brasil o tratamento dado aos brasileiros em Portugal. Tal como acontece com os PALOPs africanos, o peso político e económico dos BRICS é cada vez maior, em detrimento dos nossos. Mesmo na Europa, há cada vez mais hostilidade a estrangeiros, mesmo europeus. Um dos nossos conselheiros em França é perentório, “Já não vale a pena viver aqui pois já não somos bem-vindos”. A verdade é que hoje tudo se sabe, e sabe na hora. Não podemos ter uma política de desrespeito dentro de portas e esperar ter lá fora a simpatia das respectivas nações, em especial num período de evidente decadência ocidental e europeia.

Eis que surge uma pergunta Tabu: Se não queremos mais, ou mesmo nenhuma imigração, se não atacarmos as causas profundas da emigração portuguesa, e se continuamos passivamente a ver a nossa natalidade definhar para a cauda da Europa, que futuro geracional tem este país?

Correndo o risco de ser algo simplista, mas também totalmente frontal, não será difícil acreditar que hoje, alguns de nós, pouco se importam senão com o imediatismo populista, com o que se vê só até ao horizonte, e só se preocupam com aquilo que directamente nos afeta. Será? Se assim for, a futura geração tem dias difíceis pela frente. Mas é um Tabu falar disto…