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Eleições de domingo na Moldova vistas como cruciais para país e para Europa

Em 2008 a Madeira tinha quase 200 cidadãos moldavos, mas em 2023 já eram apenas 21. Em Portugal são cerca de 6.700 cidadãos e haverá seis assembleias de voto (Lisboa, Cascais, Setúbal, Porto, Faro e Portimão)

Foto DUMITRU DORU/EPA
Foto DUMITRU DORU/EPA

A Moldova realiza no domingo eleições legislativas descritas pela Presidente como a votação mais importante da História do país, já que vai determinar se o destino do Estado é a União Europeia ou a Rússia.

Com 2,4 milhões de habitantes, a Moldova tem enfrentado várias crises desde a invasão russa à vizinha Ucrânia, em 2022, pondo em risco o Governo pró-europeu de Chisinau, que considera a adesão ao bloco europeu como crucial para se libertar da esfera de influência de Moscovo.

Sondagens recentes mostraram que o Partido Ação e Solidariedade (PAS), pró-europeu e atualmente no poder, poderá ter dificuldades em manter a sua maioria e necessitar de uma coligação.

Qualquer que seja a coligação, o resultado parece ser sempre o mesmo: complica a possibilidade de a Moldova entrar na União Europeia até 2030, objetivo definido pela Presidente, Maia Sandu, apesar de um referendo realizado em 2024 ter dado vitória a esse caminho.

Forças da oposição, como o Bloco Patriótico pró-Rússia e a aliança pró-Europa Alternativa têm tentado conquistar os eleitores, muitos dos quais não escondem a insatisfação com os aumentos dos preços, a lentidão das reformas e a corrupção.

"Com a maior seriedade, vos digo: a nossa soberania, independência, integridade territorial e futuro europeu estão em perigo", avisou a Presidente, Maia Sandu, na semana passada.

Segundo a chefe de Estado moldava, a Rússia está a gastar centenas de milhões de euros para influenciar as eleições legislativas, tal como tentou fazer com as presidenciais do ano passado, e uma grande parte desse dinheiro é para recrutar pessoas que causem distúrbios e desestabilizem o dia-a-dia moldavo.

Moscovo tem negado quaisquer interferências nos assuntos da Moldova e afirma que Chisinau está a alimentar o sentimento antirrusso para fins políticos.

Bruxelas apoiou abertamente a eleição de Sandu e considera uma Moldova pró-europeia - que se candidatou à adesão à UE em 2022, juntamente com a Ucrânia -, fundamental para extinguir a influência russa no flanco leste europeu.

Em agosto, os líderes da França, Alemanha e Polónia visitaram Chisinau para reforçar o seu apoio à candidatura do governo à UE.

Na Moldova, a maioria dos cidadãos fala a língua romena, mas há uma "grande minoria" que ainda se exprime em russo, e o poder político alterna há décadas entre grupos pró-Rússia e pró-Europa.

Tropas russas estão estacionadas na Transnístria, região que se separou do controlo de Chisinau na sequência de uma breve guerra, no início da década de 1990.

Tanto o Governo como a Presidente esperam que a diáspora moldava mantenha o apoio dado já nas presidenciais e consiga fazer a diferença.

De acordo com dados do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Integração Europeia da Moldova, entre 1,11 e 1,25 milhões de cidadãos moldavos viviam no estrangeiro em 2022. Os números devem ser até superiores, já que só contabilizam 32 países.

Entre os principais destinos dos moldavos, contam-se a Roménia, a Itália, a França e a Alemanha, mas Portugal e Espanha também têm uma grande percentagem daqueles emigrantes.

Os eleitores no estrangeiro não são refletidos nos dados das sondagens, mas geralmente apoiam partidos pró-europeus.

Contactada pela Lusa, a embaixada moldava em Lisboa afirmou que, em Portugal - e de acordo com a referência das últimas eleições presidenciais - votarão, no domingo, cerca de 6.700 cidadãos, que se irão distribuir por seis assembleias de voto: em Lisboa, Cascais, Setúbal, Porto, Faro e Portimão.

Porque é que as eleições na Moldova são importantes para a Europa?

As eleições legislativas do próximo domingo na Moldova podem parecer um acontecimento menor para o resto da Europa, mas as suas implicações para a segurança e a estabilidade do continente podem ser profundas.

O país, candidato a aderir à União Europeia (UE), está sob vigilância de todos os grandes líderes europeus e protagoniza um recorde de observadores internacionais das suas legislativas.

A pequena ex-república soviética é um dos principais alvos das tentativas de reconquista de influência da Rússia, com Moscovo a ser acusado de gastar vários milhões para ganhar o voto dos eleitores e conseguir colocar no poder um partido pró-russo.

Mas porque é que estas eleições são tão importantes para o resto da Europa?

Apoio vital à Ucrânia

A Moldova desempenha um papel fundamental de apoio à Ucrânia. Embora esteja entre os países mais pobres da Europa, recebeu mais de 1,5 milhões de refugiados ucranianos, sobretudo no início da guerra, e acolhe agora mais de 100 mil.

Além disso, o país ajuda a transportar cereais de e para a Ucrânia através dos seus portos no Danúbio, oferecendo uma rota alternativa e aliviando a pressão sobre as rotas ucranianas do Mar Negro, frequentemente bloqueadas pela Rússia.

Se a Moldova se virar para Moscovo, a estrutura de apoio da Ucrânia ficará muito enfraquecida, minando a resiliência do leste da UE. Isto aumentaria o risco de ataques militares nas fronteiras europeias, com a Roménia, a Polónia e os países bálticos a ficarem particularmente ameaçados.

O que têm feito os países europeus?

O Presidente francês, Emmanuel Macron, juntamente com o chanceler alemão, Friedrich Merz, e o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, foram, no final de agosto, à Moldova para reforçar a unidade e o compromisso para com o país.

O Presidente russo, Vladimir Putin, já tinha sugerido que planeava ocupar toda a Ucrânia, aproximando as suas forças cada vez mais do resto da Europa.

Um Governo moldavo pró-Rússia pode oferecer uma base oriental para os ataques -- ou até mesmo abrir uma nova frente.

A Rússia já tem cerca de 1.500 soldados estacionados na Transnístria, uma região separatista pró-russa da Moldova na fronteira com a Ucrânia, que exigiu a independência em 2006, após uma votação que não foi reconhecida pelo Governo nem pela comunidade internacional.

Isto aumenta os riscos para a maioria dos Estados vizinhos, muitos dos quais pertencem à NATO. Os membros da NATO (a aliança militar que une europeus e EUA) têm deveres de defesa mútuos, ao abrigo do artigo 5.º, o que significa que devem ajudar um membro no caso de este ser atacado.

Qual é a situação atual da Moldova?

O Partido da Ação e Solidariedade (PAS), da Presidente pró-UE, Maia Sandu, ocupa atualmente 63 lugares dos 101 assentos do parlamento.

Desde que o partido assumiu o poder, em 2021, aproximou-se da UE, pedindo a adesão em 2021, após a invasão em larga escala da Ucrânia, tendo a Moldova recebido o estatuto de candidata em junho de 2022.

Em junho de 2024, as negociações de adesão foram formalmente abertas e, em julho de 2025, realizou-se a primeira cimeira UE-Moldova.

A população ainda apoia a adesão à UE, mas o PAS tem perdido apoiantes, segundo as sondagens.

Esta queda, de 52,8% nas eleições legislativas de julho de 2021, para 25,8% em agosto de 2025, resulta sobretudo da insatisfação interna com o partido, mas também da situação económica do país e da perceção de alta corrupção.

Que cenário é esperado para o pós-eleições?

O resultado eleitoral mais provável é que o PAS seja forçado a formar uma coligação com um ou mais partidos da oposição, grupos que defendem o afastamento da Moldova da Europa e a sua reaproximação à Rússia.

O PAS tem dominado o espaço político pró-UE, mas o recém-criado Bloco Alternativo pró-europeu deverá obter votos suficientes para ultrapassar o limite mínimo de 5% dos votos para entrar no parlamento.

Embora o PAS ainda possa obter a maioria dos votos, o Bloco Patriótico dos Comunistas, um grupo pró-Rússia liderado pelo ex-presidente Igor Dodon, é atualmente considerado a segunda maior força política.

Este grupo reúne vários partidos, incluindo o Partido dos Socialistas, o Partido dos Comunistas, o Coração da Moldova e o Futuro da Moldova. Dodon enfrenta acusações de corrupção durante o seu mandato presidencial e desvio de recursos estatais em larga escala.

Dodon nega todas as acusações e apresentou uma queixa ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

O que faz a Rússia?

A Moldova tornou-se um campo de testes para ataques cibernéticos russos e campanhas de desinformação em grande escala.

A interferência política russa tornou-se muito evidente durante as eleições presidenciais e referendo à entrada na UE, em 2024, com as tentativas de manipulação e influência estrangeira a serem amplamente documentadas. Espera-se uma interferência semelhante, ou maior, da Rússia nestas eleições.

Segundo o Observatório Europeu dos Meios de Comunicação Digitais, há uma campanha de desinformação em curso na Moldova, através de narrativas falsas partilhadas 'online' através de Inteligência Artificial.

O observatório identificou mais de 100 contas na rede social TikToK que publicaram 6.000 conteúdos nos últimos dois meses, sendo que 33% desses conteúdos (cerca de 2.000) continham desinformação ou conteúdo provocador.

Nas últimas semanas, a polícia realizou dezenas de rusgas por suspeita de financiamento político ilícito e, na segunda-feira, as forças de segurança detiveram 74 pessoas, acusando-as de tentarem desestabilizar o país.

O papel da diáspora

O país, cuja população não chega a 2,5 milhões de pessoas, tem mais de um milhão de cidadãos a trabalhar no estrangeiro.

A maioria destes emigrantes está situada em países da União Europeia, nomeadamente na Itália e Alemanha, mas também em Portugal e Espanha, sendo tendencialmente favoráveis à ideia e ao partido que defende a integração na Europa.

Esta diáspora foi a responsável pela reeleição, no ano passado, da Presidente Maia Sandu, uma europeísta que, em 2020, derrotou o chefe de Estado pró-russo Igor Dondon.

Todos os anos, entre 35.000 e 40.000 pessoas abandonam o país, um êxodo que poderá reduzir a população para 1,9 milhões até 2040, de acordo com as projeções do Centro de Investigação Demográfica.