Já há pelo menos uma deliberação resultante de queixa na CNE?
Filipe Sousa terá sido alvo de novo processo?
O porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE) afirmou esta semana que já foram apresentadas algumas queixas no âmbito das eleições regionais agendadas para 23 de Março. Não sabia quantas, mas garantia que, em breve, seriam analisadas. O certo é que há já, pelo menos, uma deliberação.
Sabe o DIÁRIO que na reunião plenária de 11 de Fevereiro último foi analisada uma participação contra o Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, por este ter, alegadamente, violado os deveres de neutralidade e de imparcialidade que impendem sobre as entidades públicas e os seus titulares, contrariando o disposto no art.º 60.º da Lei Orgânica n.º 1/2006, de 13 de Fevereiro, a Lei Eleitoral da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (LEALRAM).
A participação em causa diz respeito à publicação de um post, a 2 de Fevereiro deste ano, na página da Câmara Municipal de Santa Cruz, na rede social Facebook, da autoria de Filipe Sousa, intitulado “Ponto de Ordem: A Contradição do PSD na redução da dívida pública”, no qual critica o PSD e o Presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, e elogia a actuação da Câmara Municipal de Santa Cruz.
Filipe Sousa defendeu-se alegando que a publicação denunciada não tem carácter partidário, mas apenas informativo.
“(…) O Presidente do Município de Santa Cruz reflete sobre uma política adotada no que toca à gestão do Município, que se revelou muito benéfica, contribuindo para redução da dívida pública, o equilíbrio de contas e uma maior capacidade de investimento e de planeamento para o futuro, estratégia que foi anteriormente criticada pelo PSD. Contudo, não está aqui em causa um “ataque partidário”, mas uma constatação de que houve controvérsia em relação à forma como se encarou a gestão municipal de Santa Cruz, havendo, por fim, um reconhecimento dos seus benefícios, o que se retira da mudança de posição do partido em causa. (…) Ora, esta constatação parece ser do interesse público, na medida em que permite informar os cidadãos de que os seus interesses estão a ser prosseguidos, além de defender o trabalho desenvolvido pelo Município. A reflexão de que estes resultados positivos influenciam a forma como os demais encaram a gestão dos dinheiros públicos, parece enaltecer a Câmara Municipal de Santa Cruz, sendo um exemplo a seguir, o que é um motivo de orgulho para o presidente, que se ocupou de expor essa informação. Filipe Sousa
A CNE tem outro entendimento e enquanto guardiã, “da regularidade e legalidade democráticas dos procedimentos eleitorais da República Portuguesa”, lembra que as entidades públicas e os seus titulares estão sujeitos a especiais deveres de neutralidade e de imparcialidade, desde a publicação do decreto que marque a data da eleição, de modo a garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento entre as diversas candidaturas, devendo a eleição ser realizada de modo a permitir uma escolha efectiva e democrática.
Uma vez que a publicação participada foi promovida após 27 de Janeiro, data da publicação do decreto da marcação da eleição e que “o teor da referida publicação subscrita pelo Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz, promovida na página do município de Santa Cruz na rede social Facebook, resulta que este acusa o PSD e o Presidente do Governo Regional de contradição e mudança de discurso relativamente à gestão da autarquia a que preside, aproveitando, por um lado, para criticar a actuação destes e, por outro, para autopromover a autoelogiar a forma como tem desenvolvido a atividade do respetivo órgão autárquico a que preside”, a CNE entende que Filipe Sousa desrespeitou a lei.
Da análise da publicação participada resulta que o Presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz (Madeira), em pleno exercício de funções, com recurso a um meio institucional e a um discurso próprio de verdadeira campanha eleitoral, manifestou expressamente críticas ao Governo Regional e o Partido Social Democrata PPD/PSD, bem como autopromoveu e enalteceu medidas adotadas pelo JPP para a gestão daquela autarquia. Ora, como é do conhecimento público, ambos os partidos vão apresentar candidatura à eleição de 23 de março de 2025. Ademais, o Presidente da Câmara de Santa Cruz foi eleito pelo JPP, sendo, portanto, forte e vincada nas consciências dos eleitores a ligação entre ambos". Deliberação da CNE
Neste contexto, a CNE decidiu remeter certidão do presente processo ao Ministério Público na Madeira, por "existirem indícios da prática dos crimes de violação dos deveres de neutralidade e imparcialidade, previsto e punido pelo art.º 135.º da LEALRAM". A violação dos deveres de neutralidade e imparcialidade constitui crime público de acordo com a lei eleitoral, punível com pena de prisão até 1 ano e multa de 500 a 2 mil euros.
A CNE ordenou ainda que a Câmara Municipal de Santa Cruz, na pessoa do seu Presidente em exercício, removesse, no prazo de 24 horas, a publicação objecto de queixa da página oficial do município na rede social Facebook, sob pena de incorrer na prática do crime de desobediência previsto e punido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal. Uma decisão que foi respeitada mesmo que Filipe Sousa pudesse recorrer para o Tribunal Constitucional. O post é apenas mantido na página pessoal do também candidato às 'Regionais'.
Esta não é a primeira vez que Filipe Sousa é alvo de processos da CNE. Por exemplo, em 2023, foi alvo de queixa como sendo candidato às Regionais… quando não era. Mas houve mais, embora não tantas quantas as reclamadas. Não admira que esta semana, o autarca tenha tecido considerações sobre a mais recente visita da Comissão à Região.