Será que a grande apreensão de cocaína no mar da Madeira foi feita afinal por franceses?
Há pouco mais de duas semanas, realizou-se uma das maiores apreensões de droga na zona marítima próxima da Madeira: sete toneladas de cocaína que eram transportadas em dois barcos de pesca tripulados por dez cidadãos brasileiros. A notícia da apreensão foi avançada pela Polícia Judiciária, que chamou a si a autoria da operação, em conjunto com a Autoridade Marítima Nacional e a Força Aérea Portuguesa, com a colaboração de polícias do Brasil, EUA e Reino Unido. Nos últimos dias, contudo, várias páginas de Internet e publicações no Instagram e Facebook referem que a operação foi liderada pela Marinha Francesa. Terá sido mesmo assim?
São muitos os textos que circulam na Internet, em sites e páginas não oficiais, em língua portuguesa e castelhana, que atribuem à Marinha Francesa o protagonismo principal nesta operação antidroga. Aparentemente, tais dados começaram a ser publicados a 26 de Novembro passado, cinco dias depois de as autoridades portuguesas terem anunciado a apreensão. “A Marinha Francesa interceptou, no sábado 22, próximo à ilha da Madeira, dois barcos pesqueiros que haviam saído do litoral de Santa Catarina [estado brasileiro] com mais de 7 toneladas de cocaína”, lê-se num artigo da brasileira Revista Oeste, que é ilustrado com uma foto da fragata francesa ‘Forbin’ (D620), que, por essa altura, navegava noutras águas, designadamente na Córsega.
A mesma informação foi reproduzida pelo site espanhol Defensa.com, que ilustra a notícia com a foto de um militar francês a seguir uma operação de abordagem a um barco de pesca no mar. Uma pesquisa por imagens na Internet mostra que essa fotografia é referente a outra operação antidroga, realizada efectivamente pela Marinha Francesa, mas a 22 de Setembro de 2025, ao largo da costa africana. Cerca de 9,6 toneladas de cocaína foram apreendidas nessa operação a bordo de um barco de pesca. A escolha de uma foto referente a outra operação não ajuda à credibilidade da informação.
Mas para avaliar até que ponto aqueles dados são fidedignos é preciso consultar as informações divulgadas pelas entidades oficiais envolvidas na operação contra o narcotráfico realizada nas proximidades da ilha da Madeira. O primeiro anúncio da operação foi feito a 21 de Novembro passado pela Polícia Judiciária. Através de comunicado, aquela polícia de investigação revelou que, “com o apoio da Marinha, da Autoridade Marítima Nacional e da Força Aérea Portuguesa”, tinha desencadeado uma operação de combate ao tráfico internacional de estupefacientes, por via marítima, tendo sido interceptadas duas embarcações de pesca, em alto mar, tendo como território mais próximo a ilha da Madeira. Foram detidos 10 cidadãos estrangeiros a bordo e apreendidos mais de sete mil quilos de cocaína. A investigação da PJ iniciou-se com base em informação remetida pelo Maritime Analysis and Operations Centre – Narcotics (MAOC-N) A investigação contou, ainda, com a colaboração internacional da Polícia Federal do Brasil, da agência DEA (Drug Enforcement Administration, dos EUA), da JIATF South (Joint Interagency Task Force South, dos EUA) e da NCA (National Crime Agency, do Reino Unido).
No dia 22 de Novembro, a Marinha Portuguesa divulgou nas redes sociais uma nota e um vídeo, onde faz referência a estas mesmas entidades internacionais. A mesma informação foi divulgada a 24 de Novembro pelo Maritime Analysis and Operations Centre – Narcotics num comunicado em língua inglesa.
As publicações da PJ, Marinha Portuguesa e Maritime Analysis and Operations Centre – Narcotics mostram imagens da apreensão de droga e não é feita qualquer referência a uma eventual colaboração de entidades francesas. A isto acresce que o site oficial da Marinha Francesa não faz qualquer menção a um eventual envolvimento dos seus navios em operações antidroga nesta área do Atlântico.
A conjugação destas informações leva-nos a concluir serem erróneas as muitas publicações que atribuem à Marinha Francesa méritos na apreensão de sete toneladas de cocaína na área da Madeira.