Desperdício alimentar: a comédia do luxo estúpido

Esta época natalícia lembrou-me do desperdício alimentar...

Ah, o desperdício alimentar… nada mais diz “sociedade avançada” como mandar para o lixo toneladas de comida perfeita só porque a alface tem uma ponta murcha ou a maçã não é suficientemente fotogénica para o Instagram. Supermercados, restaurantes e nós, consumidores, somos os protagonistas desta tragicomédia.

Os supermercados exibem prateleiras como se fossem jóias, mas depois recusam produtos que estão perfeitamente bons porque a embalagem está amassada ou a data de validade aproxima-se, a sério, como se a comida tivesse consciência de que está prestes a “morrer”! Restaurantes seguem o mesmo guião: porções exageradas, decoração sofisticada e… tudo a caminho do caixote assim que sobra um bocadinho.

E nós, consumidores, estamos à altura. Compramos como se nunca houvesse amanhã, ignoramos datas, desaproveitamos sobras. Depois olhamos para o telejornal e balançamos a cabeça: “Como é possível tanta fome no mundo?” Ah, meus amigos, não é impossível, é ironicamente previsível. Estamos a escrever o roteiro de uma tragédia diária com talento absurdo.

O cúmulo do ridículo? Chamamos a comida que sobra de “resíduos” como se fosse lixo orgânico qualquer, mas esquecemos que por trás de cada tomate, cada bife e cada pão, há sol, água, mão-de-obra e tempo. Mas claro, nada disso importa quando se pode pagar o luxo de desperdiçar.

No fundo, é simples: menos ego e mais consciência. Comprar só o que se vai comer, reaproveitar, respeitar o trabalho do campo, e, se possível, parar de fingir que o desperdício é normal. Porque não é. É ridículo, caro e, acima de tudo, uma piada de mau gosto que fazemos à custa de quem não tem nada.

António Rosa Santos