E se o Pai Natal fosse candidato à Presidência da República?

A quadra natalícia é, por natureza, fértil em perguntas improváveis, suposições ousadas e comentários irónicos. Assim, nada mais adequado do que aproveitar o espírito da época para imaginar um cenário alternativo: o Pai Natal como candidato à Presidência da República. Não o faço porque “não ligo nada ao Natal” muito pelo contrário, mas porque há temas que, por mais mágicos que sejam, não podem fugir ao contexto político… ainda que seja um contexto vermelho e cheio de purpurinas.

Cidadãos residentes em Portugal, nacionais ou estrangeiros: apresento-me a estas eleições com a firme intenção de continuar a fazer promessas válidas para todos os que, apesar de tudo, ainda acreditam em mim. Para os portugueses com pais e avós nascidos em território nacional, proponho a inscrição nos centros de saúde para realização de um teste de ADN que dará acesso a uma série de benefícios presidenciais exclusivos. Comprometo-me a resolver os vossos problemas um por ano, como quem distribui presentes a ritmo de trenó sobrecarregado. No que diz respeito à saúde, proponho uma medida inovadora: aprender a conviver com as doenças. Uma gripe, uma dor de dentes ou uma diarreia têm sempre um motivo, e não é necessário transformar cada incómodo num sprint olímpico rumo às urgências hospitalares.

Para as futuras mães, pretendo recuperar a tradição ancestral das parteiras, devolvendo dignidade a nascimentos em casa — sempre mais confortável do que o cenário alternativo de nascer numa ambulância, ou, pior ainda, num UBER a caminho do hospital. De forma a incentivar a natalidade, o IVA dos preservativos será aumentado, mas os casais com tentativas de gravidez comprovadas receberão um subsídio especial. Já quem não demonstrar intenção reprodutiva será contemplado com um IRS agravado à taxa máxima, medida essencial para combater o declínio populacional e evitar cenários demográficos que nem os duendes conseguiriam resolver.

Para aliviar o SNS, incentivarei supermercados e lojas comerciais a oferecer vouchers de seguros de saúde como bónus nas compras — uma solução criativa que une consumismo e prevenção.

Quanto à habitação, a minha intervenção será tripartida:

‘Casas abandonadas:’ plano de recuperação financiado pelos lucros das raspadinhas da Santa Casa.

‘Casas devolutas:’ aquisição estatal pelo valor declarado nas Finanças (o que promete surpresas).

‘Casas desocupadas’ IMI agravado anualmente para os proprietários que recusarem o arrendamento, e isenção regressiva para quem disponibilizar o imóvel ao mercado.

Nos transportes, instituirei um serviço individual, gratuito e personalizado para deslocações laborais, escolares ou médicas. Os automóveis privados ficarão reservados para o que realmente importa: passear sem culpa.

A falta de mão de obra deixará de ser um problema graças à medida mais inovadora do meu programa: reduzir em 60% os funcionários públicos contratados apenas para satisfazer compromissos políticos. Essas tarefas serão substituídas por sistemas de inteligência artificial (sem gorro nem barba, mas eficientes). Os recursos humanos libertados serão reconvertidos em pedreiros, pintores, eletricistas, canalizadores, calceteiros, agricultores e pescadores, profissões essenciais e carentes, que colocarão o país novamente a produzir.

Professores, médicos, enfermeiros, polícias e bombeiros passarão a receber salários equivalentes aos dos deputados e autarcas. Estes, por sua vez, verão as suas remunerações reduzidas progressivamente até ao salário mínimo nacional. Tal ajustamento promete extinguir rapidamente o fascínio pela carreira de político profissional. Quanto à justiça… bem, reconheço que é o verdadeiro calcanhar de Aquiles do meu programa. Assim, deixarei a resolução para os Reis Magos, na esperança de que tragam, por uma vez, algo mais útil do que ouro, incenso e mirra.

A. J. Ferreira