Lei de IA europeia deve ser equilibrada e permitir inovação
O especialista em inteligência artificial aplicada aos negócios Srini Kasthoori defende, em entrevista à Lusa, que a lei europeia de IA ('AI Act') deve ser equilibrada e permitir ao mesmo tempo a inovação.
Srini Kasthoori, que é um dos principais especialistas mundiais em IA aplicada aos negócios e é diretor global de soluções multi setoriais da DXC Technology, está em Lisboa até 09 de outubro, no âmbito do World Aviation Festival, onde é orador.
Questionado sobre a lei de IA europeia, o responsável destaca que a Europa assume a liderança de como implementar a governança.
Algumas destas regulações "são relevantes e importantes porque, por vezes, a tecnologia pode sair do controlo e fazer coisas que provavelmente causariam problemas de privacidade, governação e segurança, e esta geração de IA, especialmente desde que o LLM e os modelos de linguagem simplificada e os modelos de raciocínio começaram a desenvolver-se", prossegue.
Nesse sentido, pode haver desafios de segurança, de privacidade dos dados, mas também pode ter desafios no que respeita à IA inventar coisas.
"Depois também terá pessoas a usar IA para" aceder ao algoritmo, por isso, "é importante colocarmos barreiras de proteção para garantir que a IA não está a causar qualquer tipo de dano", adianta.
Contudo, "ao mesmo tempo, não queremos exagerar, pois isso pode fazer com que percamos essa inovação", adverte.
Por isso, "é necessário haver um equilíbrio rigoroso entre a forma como protegemos a nossa privacidade e garantimos que a governação organizacional está em vigor sem perder o acesso aos nossos dados ou sem permitir que um assistente de IA invada a nossa infraestrutura de TI organizacional".
"É importante que o façamos, mas de uma forma mais focada no crescimento", refere Srini Kasthoori.
A regulação de IA europeia "deve ser equilibrada para que também permita a inovação", remata.
Empresas devem olhar para a IA como uma tapeçaria
O especialista em IA aplicada aos negócios sugere que as empresas olhem para a IA como uma tapeçaria que permite tecer na estrutura do negócio e que mantenham o foco durante a adoção da tecnologia.
"Sugiro que continuemos a concentrar-nos, à medida que adotamos a IA, e ao observarmos os avanços que estão a acontecer neste espaço, sugiro que olhemos para a IA como uma tapeçaria", diz Srini Kasthoori.
A IA "não é apenas um grande modelo de linguagem [LLM], há muito para além disso: há reconhecimento de imagem, há várias coisas que podem ser feitas nos diferentes tipos de ferramentas" de inteligência artificial, diz Srini Kasthoori.
Portanto, "olhe para a IA como uma tapeçaria que pode tecer na estrutura do seu negócio" e "não traga a IA apenas por trazer e costure-a na parte superior da sua estrutura", defende o especialista.
Por isso, "sugiro que, antes mesmo de olhar para a IA de forma ampla, se certifique de que as suas bases de dados ['data foundations'] estão modernizadas", aconselha ainda.
Depois, pode deixar as variedades de dados, mas criar um conjunto de 'malha de dados', construindo governança, tornando os dados acessíveis.
Outra das sugestões é que não implementem apenas agentes de terceiros: "Tente construir esta bancada de trabalho interna que permita à sua empresa e TI criar os seus próprios tipos de agentes reutilizáveis".
Tal permite trazer agentes de IA de terceiros e criar o seu próprio agente IA.
Portanto, "tudo corre nesta bancada de trabalho, onde tem a governança e a segurança integradas", diz.
Assim, minimiza riscos e, em seguida, tem de garantir que traz "literacia em IA" além da tecnologia, para que todos na empresa estejam "a bordo".
Neste sentido, está a permitir "que a sua empresa crie agentes para os seus casos de utilização". Portanto, "a literacia em IA não é negociável", reforça o responsável.
Por fim, "diria, tragam a IA para o modelo de governação multifuncional", o que significa escalar a responsabilidade em toda a empresa.
"Portanto, não se tratam de atos aleatórios" e, depois, irá encontrar os benefícios, remata o especialista que está em Lisboa até 09 de outubro, no âmbito do World Aviation Festival, onde é orador.
IA está a remodelar o setor da aviação
O especialista afirma que a IA está a remodelar o setor da aviação em todas as suas operações e defende literacia da força laboral nesta tecnologia.
Questionado sobre o impacto da IA, o especialista salienta que a tecnologia "está, fundamentalmente, a remodelar a aviação em termos de experiência do cliente, otimização de receitas, manutenção mais preditiva e em todas as operações".
Ou seja, desde a definição de preços dinâmicos até à oferta personalizada, entre outros aspetos, incluindo a gestão.
A IA "está a melhorar tanto a eficiência como a satisfação do cliente", mas a tecnologia não é uma novidade no setor da aviação, diz, até porque já existe há algum tempo.
"Penso que o setor das viagens, em geral, foi pioneiro na adoção da IA, mas, dado os avanços, principalmente após a descoberta dos LLM [grande modelo de linguagem], a adoção está a ser mais rápida porque a tecnologia amadureceu. Portanto, verá agora um impacto mais real da IA, porque, em toda a cadeia de abastecimento, pode tirar partido dela de uma forma que lhe permite compreendê-la, tanto do ponto de vista do crescimento das receitas como da eficiência dos custos", argumenta Srini Kasthoori.
Em geral, a aviação é "um bom setor" - há dados isolados, padrões industriais complexos e fragmentados - para que a IA ajude os clientes.
Srini Kasthoori usa IA há cerca de 12 anos e diz que o que tem visto "no último ano ou ano e meio" permite que seja "muito otimista", considerando que a tecnologia fará uma grande diferença para os clientes da aviação e para os passageiros.
Como qualquer tecnologia, haverá sempre medo ou será um desafio.
"Nós, enquanto espécie genética, temos sido desafiados sempre que existe um novo sistema mecânico ou um novo sistema eletrónico" e as pessoas "perguntam-se sempre o que vai acontecer aos empregos", afirma, quando questionado sobre o assunto.
Kasthoori considera que haverá uma espécie de reformulação dos empregos e do ecossistema.
Em primeiro lugar, "vejo a IA a melhorar a produtividade", pelo que "tornará os empregos existentes melhores", diz.
Neste sentido, os empregos existentes poderão ser desempenhados de forma "muito mais eficiente e rápida" porque terão o nível de informação e acesso obtido pela IA, o que "tornará as vidas melhores".
Isto significa que, "a dada altura", uma empresa possa já não necessitar de um número exato de recursos, mas "penso que o que verá é que, para fazer a IA funcionar, precisa de um novo conjunto de empregos, seja a criar os modelos, a criar os robôs ou a operá-los", prossegue.
Face a isto, assistir-se-á a uma "mudança na forma como realizamos as nossas tarefas talvez para um conjunto diferente de tarefas, mas isso não vai acontecer imediatamente", mas ao longo do tempo, considera.
Kasthoori aconselha as empresas a não adotar IA "apenas por adotar", porque é aí que começa o problema.
"E é muito importante qualificar a nossa força de trabalho, porque quando não se tem conhecimentos em IA, isso só vai causar mais problemas", adverte.
Até porque "não é necessariamente a IA que representa o risco, penso que é apenas a forma como adotamos e implementamos", sublinha.
"Quando olhamos para estas armadilhas e o fazemos de uma forma que minimize o risco para nós e para os nossos clientes, temos de considerar não só o custo, mas também a eficiência global", remata.
Ou seja, as empresas têm de olhar para impacto na eficiência global e não focar-se apenas na redução de custos.
Srini Kasthoori tem mais de 25 anos de experiência a impulsionar a transformação digital para clientes da Fortune 500 de várias indústrias. É também membro do North Carolina IT Strategy Board, onde aconselha sobre políticas de TI a nível estadual e inovação no setor público.
Srini tem um mestrado em ciências pela Annamalai University e completou programas de educação executiva em consultoria e inteligência artificial generativa na Kellogg School of Management da Northwestern University.