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Saúde: um caso de polícia

Por motivos de natureza institucional, ao longo dos últimos anos evitei pronunciar-me sobre os sucessivos casos que foram ocorrendo na Saúde da Madeira - e foram muitos. De pouco servirá alongar-me na resenha histórica, mas o levantamento, de memória, é essencial para que se compreenda melhor a dimensão do desastre político que a gestão deste setor representou durante os governos de Albuquerque, que começou mal e ameaça terminar pior ainda.

A indefinição na Saúde iniciou-se com a escolha dos Secretários: Manuel Brito durou quatro meses, Faria Nunes 16 e Pedro Ramos resiste desde então. Depois, a confusão transferiu-se para os cargos dirigentes: o SESARAM já teve vários Presidentes e mudanças no seu Conselho de Administração, com alargamentos e alterações de Estatutos pelo meio; a nomeação da Diretora Regional de Saúde implicou mudar a lei; os Diretores Clínicos foram-se sucedendo na função; e os cargos de Diretores de Serviço entraram no jogo de distribuição de lugares com o CDS, com afastamentos sumários e indelicadezas pelo caminho.

A extravagância regional não se ficou por aí. Nas infraestruturas, os investimentos nos Centros de Saúde foram sendo executados ao ritmo eleitoral e o Novo Hospital foi sendo empurrado com a barriga, à medida que a conta final crescia exponencialmente. Nos recursos humanos, a gestão sem registo foi alvo da sucessiva censura do Tribunal de Contas. Na digitalização, a ausência de informação pública atualizada que permitisse o escrutínio acabou num crime de roubo de dados sensíveis sem igual, sem culpados e sem responsáveis, com consequências ainda por calcular, com interrupção de serviços e impactos nos cuidados prestados. Na relação com o sector privado, a promiscuidade denunciada por alguns é tal que grande parte dos serviços que deveriam ser prestados no público são hoje quase exclusivamente praticados no privado, que proliferou à velocidade de uma planta invasora, com custos acrescidos para os cidadãos - ora porque pagam do seu bolso pelo acesso atempado, ora porque pagam a dobrar através de impostos.

Nada disto seria especialmente relevante para os madeirenses se não tivesse repercussão na qualidade dos serviços a que têm acesso - mas tem. A consequência é mesmo a Madeira ter hoje um Serviço Regional de Saúde que funciona pior do que devia, que não responde sempre às necessidades dos seus cidadãos, que não tem os médicos de família que prometeram e que tem listas de espera infinitas para acesso a consultas, cirurgias e exames, cuja gestão é opaca e, sabemos agora, está ao serviço da política e de um partido.

Tudo isto tem dois rostos: Miguel Albuquerque e Pedro Ramos. Se dúvidas existissem sobre a forma negligente como a Saúde foi gerida ao longo dos últimos anos e sobre a politização total de um Serviço que deveria ser de todos e para todos, as eleições internas do PSD trouxeram à luz do dia o que já muitos sabíamos existir: ouvir Pedro Ramos oferecer facilidades em troca de um voto, é mesmo caso de polícia - porque coloca em causa o Estado de Direito e o acesso à saúde dos nossos cidadãos.

O último capítulo desta história é a prova de que para Albuquerque e Ramos tudo o que interessa é a política: depois de anos a ouvirmos que as Urgências nos Centros de Saúde da Costa Norte, que ficam a mais de 45 minutos de carro do Hospital, eram uma extravagância com custos desnecessários e que a EMIR tinha capacidade para responder a tempo e horas a todas as emergências, pura efabulação dos amarrados do regime, a menos de um mês das eleições mais difíceis de sempre para o PSD, eis que afinal era tudo mentira e aí estão as Urgências abertas. Mais do que uma farsa, mais uma vez, um caso de polícia - porque brinca com o nosso bem mais precioso: a Saúde e a Vida de todos e de cada um de nós.

Não fora os profissionais de excelência que temos, totalmente comprometidos com o serviço que prestam, e não restaria nada a não ser desespero e taticismo político na Saúde regional. Dia 26 de maio há muitos motivos para os madeirenses acabarem com esta irresponsabilidade; lutarem pelo seu direito à Vida e à Saúde é mesmo o mais importante de todos eles. Chegou a hora de mudar de receita.