DNOTICIAS.PT
Fact Check Madeira

Serão as frases de Calado únicas no País vindas de um político como sugere Miguel Iglésias?

None

Um trabalho da revista Sábado, intitulado ‘mais valia Calado’, catalogou o presidente da CMF como misógino e machista. A revista reproduz um conjunto de frases atribuídas a Pedro Calado, que o deputado do PS, na Assembleia da República, Miguel Iglésias, na sua página de Facebook, transcreve e afirma nunca ter ouvido “ofensas públicas tão graves (…), por parte de um eleito em Portugal”. Mas será que as afirmações de Calado são um exclusivo seu?

A verificação da afirmação de Miguel Iglésias impõe um esclarecimento prévio. Este texto não se propõe trabalhar os temas piropo/sexismo/descriminação ou outros conexos ou próximos. O nosso objectivo é simplesmente verificar a existência ou não de afirmações de outros eleitos em Portugal, que sejam equivalentes às de Pedro Calado.

Para esse trabalho, fizemos um levantamento, que não pretendeu abarcar toda a realidade portuguesa, mas quis ir a vários sectores do mundo político.

Desde logo, evidenciou-se uma das polémicas mais recentes, que teve como protagonista o Presidente da República.

Numa visita oficial ao Canadá, em Setembro deste ano, na presença de emigrantes madeirenses, em conversa com uma jovem e com a mãe (dela), Marcelo Rebelo de Sousa fez o comentário: “A filha ainda apanha uma gripe, já viu bem, com o decote?”.

A frase do Presidente da República foi condenada por muitos actores políticos e de outros sectores da sociedade, mesmo depois de Marcelo se ter justificado e negado qualquer pendor sexual/sexista. "Não era nenhum comentário sexista, não me ocorreu, quer para aquela jovem, quer para as velhinhas. Não era sexista de todo."

Em Maio de 2017, uma polémica na Assembleia da República abrangeu políticos madeirenses. Rubina Berardo, deputada do PSD, acusou Carlos Pereira, do PS, de “machismo” e de fazer declarações de “conotação de género” a “roçar o sexual”, por o socialista, na sua página de Facebook haver escrito que as deputadas teriam saudades dele (Carlos Pereira).

O deputado veio contestar a acusação e disse que apenas respondeu politicamente a uma acusação feita numa comissão a que nem pertencia. Ainda assim, por não querer ofender quem quer que fosse, retirou a afirmação.

Em 2009, vários órgãos de comunicação noticiaram um caso ocorrido na Assembleia da República.

No final de uma Comissão de Inquérito, o deputado Miguel Macedo (PSD) referiu-se à deputada do PS Sónia Sanfona como: "Deputada-sereia ou deputada-princesa". A frase veio a gerar polémica mais tarde, mas, na reunião, até inspirou outras como as de Nuno Melo, que se despedia para seguir para o Parlamento Europeu - "em Alpiarça sereias é complicado". Quem não alinhou foi Maria de Belém Roseira, presidente da Comissão, que lembrou que na reunião só participavam deputados.

Quando se analisam as frases de políticos e o envio de piropos, criámos a percepção (merecedora, eventualmente de estudo aprofundado) de que nos anos 70 e 80, essencialmente, mas não exclusivamente, era quase norma na Assembleia da República. Vejamos um exemplo.

A 12 de Maio de 1978, na jovem democracia portuguesa, o presidente da Assembleia da República, Vasco da Gama Fernandes, informava o plenário, a propósito de uma delegação de deputados das cortes espanholas: “Acontece que há pouco também recebi a informação de que vêm nessa missão cinco senhoras espanholas. Olé!”

O Olé do presidente suscitou a indignação da deputada Helena Roseta.

“Sr. Presidente, lamento a forma corriqueira e pouco digna como o Sr. Presidente se dirigiu referindo-se a senhoras de nacionalidade espanhola que vêm visitar Portugal.

-

Protestos do PS.

-

A Oradora: - Não penso que sejam palavras.

-

Protestos do PS.

-

A Oradora: - ... para serem utilizadas numa Assembleia, nem são palavras para serem utilizadas por um Presidente da Assembleia da República num hemiciclo, Sr. Presidente.”

O presidente, na resposta, ainda subiu o tom:

“Sr.ª Deputada, terei de lhe responder que me é completamente indiferente aquilo que a Sr.ª Deputada acaba de dizer. Totalmente indiferente. (Aplausos do PS e da Sr.ª Deputada Georgete Ferreira.) É como se não tivesse ouvido, porque, se isto se passasse em Espanha, como sabem, as senhoras espanholas têm talvez um conceito da vida diferente do da Sr.ª Deputada, e do que mais gostam as senhoras espanholas, quando passam na rua, é que lhes dirijam um piropo e que digam: ‘Olé!’ Ficam imensamente satisfeitas. Mas, é claro, o protesto está feito, poderá fazer os protestos que quiser, está no seu pleníssimo direito, mas não o aceito nem o respeito.

-

Risos.

-

Neste momento a Sr.ª Deputada Helena Roseta abandona a Sala.”

Vejamos, agora um caso do mundo autárquico.

Na Assembleia Municipal de Viseu de 3 de Setembro de 2013, o presidente da Câmara, no âmbito de uma das intervenções que produziu, diz: “Sobre a deputada Manuela Antunes, eu nem consigo ser antipático consigo, sabe muito bem. É um piropo é. Mas eu não consigo ser antipático consigo, mas também não deixarei de lhe dizer as coisas tal e qual como o fez (…)”.

Pelo exposto, resulta claro que as afirmações de Pedro Calado estão longe de serem caso único em Portugal. Ainda assim, a afirmação de Miguel Iglésias não pode ser considerada falsa, pelo facto de o deputado ter dito que nunca ouviu, o que não é sinónimo de que não existiam. Assim, a afirmação de Iglésias considerada imprecisa.

“Passe que eu estou a gostar de ver” “Não lhe daria esse prazer mas que poderia dar outros” “A senhora deputada deveria ir para casa fazer a dela (aumentar a natalidade)” “Querida” “Posso levar a Sra deputada a dar uma volta” Declarações do Presidente da Câmara do Funchal. Há muitas mais. Nunca ouvi ofensas públicas de índole sexual tão graves como estas, por parte de um eleito em Portugal. Miguel Iglésias no Facebook