Análise

Desconsolados com Portugal

Um Estado insensível é pior do que cidadão com documentos caducados

Mal percebem que há autoridades por perto, os que desesperam por atendimento nos serviços consulares que servem a área de Londres fazem-se ouvir. Queixam-se da dificuldade de acesso à vaga que permite tratar do Cartão do Cidadão ou do Passaporte, dos vistos ou de outras diligências que a burocracia impõe. Mas também das meias horas passadas à espera que alguém atenda a chamada num ‘call center’ distante, localizado em Lisboa, de modo a assegurar a senha do mês seguinte. E ainda da inexplicável insensatez que prolonga no tempo um problema que já devia estar resolvido.

Não basta prometer. Urge resolver. E a realidade que voltámos a constatar na capital inglesa torna evidente que de nada valem declarações eloquentes, recepções seleccionadas, mensagens sorridentes e até os milhares de euros gastos nas comemorações no Dia de Portugal em Londres se um problema agudizado pelo Brexit não foi tratado com o respeito que os portugueses merecem.

Os governantes brincam com a vida daqueles que os elegem, com a cidadania atarefada e com a imagem que o País dá de si próprio ao mundo. Isto porque definem regras, estipulam prazos e exigem que as obrigações sejam cumpridas a tempo e horas, mas são incapazes de agilizar processos, de simplificar burocracias e de dotar a máquina de capacidades elementares. O Estado que factura enquanto dorme não pode ser pessoa de bem quando gera desencanto e revolta dos seus “heróis”, permite a exploração dos aflitos e dá azo a uma série de máfias que se instalam por via da incapacidade de quem manda em facilitar o futuro a quem o tenta construir com sacrifício e esforço, mas que é confrontado com a balda e com o desinvestimento.

Assim, cabe à República respeitar o que colocou na Constituição a propósito da portugalidade à escala global, dar cabimento orçamental que permita dotar os serviços consulares dos recursos necessários, pagando o justo valor, de preferência adequado ao custo de vida de cada lugar, para que não faça má figura, não cometa ilegalidades e, acima de tudo não complique a vida a quem trabalha.

Cabe à Madeira dar o exemplo na cooperação que ajude os empenhados funcionários consulares em dar o melhor de si mesmos, estando apenas focados no essencial. Ou seja, deve insistir nas queixas que são legítimas para que o País centralista desperte para os dramas que o tempo não cura e que são vividos por toda a diáspora, mas terá que envolver-se mais no processo, sugerindo alternativas e disponiblizando-se para inverter tendências que dão cabo da “nação valente”.

Cabe aos cidadãos portugueses – e em Londres a maioria nem é originária de Portugal – não ceder à inércia, protestando sempre que os seus elementares direitos estiverem comprometidos.

Como nos confidenciava um dos conselheiros da comunidade, quem resolver este problema com barbas no Consulado em Londres jamais será esquecido pelos portugueses que sofrem de forma prolongada com um bloqueio intolerável e sem margem para fazer opções. Afinal, até é fácil ficar para a história colectiva, mas nem uma hipotética comenda ou estátua, busto ou nome numa rua tem feito a diferença.