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Um ano após o início da crise!

Com o rendimento dos mais pobres a diminuir e os rendimentos mais altos a manterem-se aumentou a desigualdade em Portugal

“Uma crise como nenhuma outra, uma recuperação incerta” foi o título do artigo de opinião que publiquei faz um ano neste jornal. Este título era também o da perspetiva económica de junho de 2020 do Fundo Monetário Internacional. Passado um ano volto ao mesmo tema para refletir sobre os resultados apresentados no estudo “The Impact of Covid-19 on Poverty and Inequality in Portugal and the Cushioning Effect of Policies (O Impacto do Covid-19 na Pobreza e Desigualdade em Portugal e o Efeito Amortecedor da Políticas” elaborado por Joana Silva, Anna Bernard, Francisco Espiga e Madalena Gaspar, do PROSPER da Universidade Católica de Lisboa.

Todos fomos afetados pela pandemia e todos podemos descrever como esta alterou a nossa vida, mas nem todos fomos afetados no nosso rendimento, por isso o decréscimo de rendimento que se concretizou da passagem, entre 2019 e 2020, de 10100 € para 9100€ no valor médio anual do rendimento corrigido por pessoa, não foi sentido diretamente por alguns de nós, enquanto outros tiveram um decréscimo de muito superior a 10% no seu rendimento e no das suas famílias. O estudo referido acima mostra que as famílias mais afetadas foram as que em 2019 já tinham uma posição mais baixa na distribuição de rendimentos, ou seja, as famílias mais pobres.

Os elementos destas famílias têm menor escolaridade, trabalham com contratos mais precários e em setores que foram mais afetados pela pandemia. Setores onde não era possível o trabalho à distância e não eram essenciais, sendo, portanto, obrigados a encerrar numa tentativa de contenção da propagação do vírus.

Os autores do estudo estimam que houve um aumento de cerca de 400 000 no número de portugueses cujo rendimento está abaixo do limiar de pobreza (60% do rendimento mediano), o que significa que a crise originou mais quase meio milhão de pobres em Portugal. Além disso os que já eram pobres tornaram-se ainda mais pobres.

A pandemia não só obrigou as pessoas a ficarem em casa, mas obrigou alguns a ficar em casa sem rendimento do trabalho. As medidas de apoio social implementadas fizeram com que os números não fossem mais negros, pois segundo o estudo o aumento de pobreza verificado ao longo do ano de 2020 ter-se-ia concretizado ao fim das primeiras 8 semanas de confinamento caso não tivessem existido os apoios.

Com o rendimento dos mais pobres a diminuir e os rendimentos mais altos a manterem-se aumentou a desigualdade em Portugal. É neste Pais com mais pobres e mais desigual que não podemos perder nenhuma oportunidade de aproveitar ao máximo os apoios que vamos receber e que todos nos devemos esforçar para que, dentro em breve, ninguém esteja pior do que estava antes desta crise provocada pelo Covid-19.

Espero que daqui a um ano o título da minha coluna de opinião seja: “uma recuperação nunca antes vista!”.