Viver na Ajuda, sem ajuda

Ex.mos Srs. Governantes do Melhor Destino Insular da Europa e do Mundo. Antes que esta Região Autónoma possa vir a receber, uma vez mais, o galardão deste certame, permitam-me apelar e fazer ver através da consciência aquilo que, os olhos por vezes não veem. Na nossa cidade do Funchal, e agora mais do que nunca, novos sinais de pobreza e actividade de “pedincha” (viciada ou não) tem vindo a crescer. Começando pela porta da Sé Catedral – só ali, estão dois pedintes quase em permanência – e acabando nos locais mais improváveis, é vê-los em sítios mais ou menos habituais, com um olhar misto de tristeza e de esperança a fazer o que pouco mais lhes resta; pedir. Quando em criança andei na catequese, era isso mesmo que dizia o caderno do catecismo: “pedir, pedir, até conseguir”. Seria bom que, para grande parte destes pedintes, o seu pedido fosse favorável a alimentar a ideia de trabalharem e governarem civilizadamente a sua vida. Infelizmente não é bem assim. Na generalidade, estes focam-se no dinheiro e, ou comida. E é nestas condições que, na R. do Vale DÀjuda, S. Martinho, um novo inquilino ali está, por teimosia ou não, à mercê da caridade alheia. Aproveitando a sacada de um patamar pertencente a um Hotel esquecido, este nómada em perfeita desorientação psicológica, encontrou abrigo onde pernoita há cerca de seis meses. Na passagem pelo local as pessoas surpreendem-se com o cheiro nauseabundo que exala. Alguns – seus semelhantes – ainda se compadecem com a situação, mas, parece que nada ou ninguém o tira dali. Nem a chuva torrencial e a trovoada recente que também o deixou às escuras foi capaz de motiva-lo a procurar o abrigo a que o mesmo também tem direito. Tenho a certeza que, nesta mesma rua, em breve assistiremos às habituais romarias da campanha eleitoral que discretamente já mexe um pouco por toda a ilha. No entanto, e quase com a mesma certeza, sei que situações desta natureza serão presumivelmente esquecidas e entregues ao seu infinito destino. Estou a falar de situações degradantes da nossa sociedade que, nem sempre se compadece de uma forma suficientemente determinada para minimizar drasticamente este desequilíbrio social e cultural. Haja Deus.

Vicente Sousa