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Chicão, vai brincar com a Greta

Ando aqui de candeias às avessas com os pequenos. Não as minhas, que essas já são do mundo, como diz o povo, mas aqueles dois pequenos que deviam estar a brincar à macaca e a andar de baloiço em vez de andar a chatear meio mundo. Quando era pequena, parei pouco em casa. Tive a felicidade de morar numa rua onde os pais iam trabalhar e os carros iam com eles – ninguém se preocupava verdadeiramente com a poluição – deixando o empedrado do Bairro dos Moinhos para os mais pequenos. Andávamos o dia todo na rua, pequenos e pequenas, emprestávamos as bicicletas uns aos outros e íamos para casa jantar todos contentes. As brincadeiras eram na rua, ponto. As únicas bandeiras ativistas que levantávamos eram as de querer ganhar mais uma hora na rua e voltar para dentro já de noite, quando as mães começavam a aparecer às varandas ou a chamar da porta do quintal. Aí desaparecíamos da rua, sem piar. O último aviso era mais alto, acho mesmo que ultrapassava a Ponte de Pau e subia do outro lado. Política não era uma coisa que nos interessasse, embora me lembre de ouvir falar no assassinato do Sá Carneiro, porque tinha estado um ou dois anos antes numa festa na serra e tivemos de nos levantar às quatro da manhã para ir em romaria ver o homem. Mas hoje chateia-me que a minha mãe não tenha conhecido o Chicão e a Greta. Provavelmente ia dar-lhes um ou dois berros, principalmente se ouvisse a pequena dizer o que disse há dias: “Às vezes é preciso irritar algumas pessoas para ter impacto”. Ias ver o impacto, ias. Provavelmente vinha acompanhado de quatro ou cinco dedos alinhados ao centímetro e aterrava-te numa cachada, que é como por aqui se chama o sítio preferido das mães para meter um selo. Tenho pena de a Greta não ter tido bonecas para brincar, carrinhos de metal para conduzir, cana vieira para arrancar na fazenda lá da frente de casa. Por falar em cana vieira, o Chicão bem merecia levar com uma nas pernas. Isto já não vai lá com palmadinhas no rabo, o pequeno portou-se mal e, como a Greta, anda a irritar algumas pessoas para ter impacto. Já chateou meio CDS, meio país e metade do jardim-de-infância onde anda. Quer brincar aos partidos e ninguém o escolhe para a equipa, os que jogavam com ele tornaram o clube azul-amarelo onde jogavam há décadas numa espécie de local mal-amado, de onde todos querem fugir. A minha mãe e as outras mães do Bairro dos Moinhos certamente iam resolver isto em três tempos. Com toda esta trapalhada, só me apetece dizer ao Chicão que saia do baloiço e deixe a Greta andar um bocadinho… senão não tem um chupa-chupa depois do jantar. Vá, portem-se bem, miúdos. Portugal e o mundo querem andar para a frente. Vão brincar para a rua.