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Aos militantes, simpatizantes e eleitores do PS

Não ignoro nenhuma das minhas responsabilidades ao longo destes quatro anos

No PS, quando ganhamos, ganhamos todos e quando perdemos, perdemos todos. Não há, de resto, outra forma possível de encararmos a nossa militância num projecto político partidário. Por esse motivo, as minhas primeiras palavras vão para todos os nossos candidatos às eleições autárquicas: aos que venceram no Porto Moniz, em Machico, na Ponta do Sol e em Santa Maria Maior, pela candeia de Esperança que representam para todos os que acreditam num modelo alternativo de governação; e a todos os outros, pela coragem das suas candidaturas, pelo mérito que todos lhes reconhecemos e a quem agradecemos.

Do militante de base ao mais alto dirigente do PS, somos todos responsáveis pelo que de bom e mau fizemos até aqui. Nenhum Socialista compreenderia, aliás, que fosse de outra maneira. É essa a base de entendimento da nossa militância: a da responsabilidade colectiva sobre a culpa individual que motiva a nossa História política interna e externa - a externa, sobre a sociedade em que acreditamos, onde aos méritos individuais soma-se sempre a força do colectivo capaz de suprimir fraquezas; e a interna, sobre o trajecto comum que construímos. Admito, porém, que seja em torno dessa base que reside a origem de um desacordo em relação à causa das nossas conquistas: para uns, apenas o brilhantismo individual; para outros, também a força do colectivo. Nessa discussão, posiciono-me sempre do lado de quem acredita que a nossa força maior, a nossa resistência e a nossa coragem estrutural residem mais no colectivo que construímos do que na popularidade circunstancial de uma liderança - e é da soma de ambos que acredito que resultaram alguns dos melhores resultados da nossa História, como os de 2019.

Quarenta e oito anos e muitas derrotas depois, o PS não pode continuar a repetir as mesmas fórmulas, à espera que da próxima corra melhor. Da próxima liderança. Da próxima eleição. Da próxima circunstância favorável. O momento que vivemos exige de todos o mesmo que defendi em Fevereiro de 2020, na antecâmara do Congresso do PS: reflexão sobre os motivos que continuam a impedir o PS de somar sucessos nas eleições que disputamos na Região. Da minha parte, não acredito que sejam meramente circunstanciais, como consequência de escolhas mais ou menos conseguidas, candidaturas mais ou menos acertadas, lideranças mais ou menos competentes. Aquilo em que acredito é que as dificuldades que enfrentamos são estruturais, internas e externas, e que exigem a nossa capacidade de irmos, de uma vez por todas, à sua origem, para que consigamos superá-las. Não é possível que o PS continue a discutir, eleição após eleição, os defeitos das suas lideranças e a repetir discursos de união com mais de 20 anos, com os mesmos protagonistas do passado, profissionais da promoção do fanatismo cego em torno de lideranças transitórias de um clube fechado, com a mesma capacidade de dizimar novos rostos e gerações. O PS precisa de fazer um diagnóstico claro, que nos permita olhar para o futuro com maior confiança no nosso projecto: partidário, político e social.

Precisamos de compreender o percurso que trilhámos desde 1973 em geral e, em particular, o caminho que fizemos entre 2017 e 2019 e o que nos trouxe até 2021. Com relativo distanciamento, mas não total, aponto três erros que temos sistematicamente cometido: um estratégico, incapazes de compreender que a democracia condicionada que temos na Madeira exige repensarmos os meios com que combatemos; um programático, incapazes de explicar com total clareza, sem indecisões e indefinições, as nossas opções para o futuro da Madeira e do Porto Santo; e um social, incapazes de manter, sustentadamente, o progressivo crescimento da base eleitoral do PS, a sua abertura às novas gerações e à sociedade civil, de garantir representatividade geográfica e, acima de tudo, a necessária mobilização popular.

As consequências destes três erros colocam-nos duas dificuldades adicionais: a primeira, de comunicação do nosso projecto político aos madeirenses, que nem a anunciada estrutura mais profissionalizada de sempre foi capaz de ultrapassar; a segunda, de multiplicação local da mensagem, que nem a eleição de um grupo parlamentar de 19 deputados foi capaz de suprir. Disse-o no Congresso de 2020 e repito-o hoje, porque as consequências dessa nossa incapacidade colectiva tornaram-se ainda mais evidentes.

Se algumas destas dificuldades têm origem externa, outras há que são apenas responsabilidade nossa - e há uma adicional que assim é: a criação, repetida, de cisões artificiais internas, para justificar insucessos e incapacidades próprias, com desvalorizações históricas constantes, como aconteceu no Congresso de 2020, por motivos até hoje incompreendidos. As consequências estão à vista de todos. Não ignoro nenhuma das minhas responsabilidades ao longo destes quatro anos: fui vereador durante três anos, secretário-geral durante dois e durante o último ano de pandemia enfrentei-a onde me senti mais útil - mas não ignoro também as circunstâncias em que alguns, poucos, procuraram menorizar o papel que tantos tivemos em 2019, afastando-nos e responsabilizando-nos mais tarde por defeitos alheios. Certo é que, em 2019, todos contribuímos, não sem erros, para agregar os militantes do PS em torno de um projecto comum como raramente aconteceu na nossa História recente.

Apesar de tudo isso, a pergunta a que todos precisamos de responder agora é se alguns continuarão sobretudo preocupados com o PS, ou se estamos todos preocupados em mudar a Madeira. Se optarmos pela primeira via, repetiremos os erros do passado e o resultado será o de sempre; se optarmos pela segunda, o futuro, mais ou menos distante, será nosso e, com isso, de todos os madeirenses. É essa a escolha que temos pela frente. Esse futuro passará por várias fases: a reunificação e mobilização de um partido que não tem dimensão suficiente para ter dispensáveis, onde não chega parecer que se somam algumas partes; o rejuvenescimento dos seus quadros e figuras; a reabertura à sociedade civil; a clarificação programática, dentro do quadro ideológico e do património histórico do PS; a redefinição de prioridades no combate político; a simplificação da mensagem; o repensar dos meios; e a aproximação geográfica e popular.

Os partidos são entidades colectivas com identidades próprias, moldadas pela sua História, pelas circunstâncias e pelas suas pessoas. Sei o que os madeirenses esperam de nós: compromisso, lealdade, realismo, coragem e alternativa. Saibamos também nós, todos os Socialistas, o que queremos e conseguiremos um dia concretizar a nossa aspiração maior - que não é mudar o PS, é Mudar a Região Autónoma da Madeira.

P.S. O PS tem na Assembleia, agora e transitoriamente, representação dos 11 concelhos. À Sara Silva, que não precisou, como cheguei a ouvir de outros, que voltassem a colocar São Vicente no mapa porque politicamente nunca de lá saiu, votos dos maiores sucessos.