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Adultos vulneráveis devem ter comissões de protecção como as crianças e jovens

A proposta é feita pela APAV

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A APAV propõe a criação de Comissões para Pessoas Adultas em Situação de Vulnerabilidade, a funcionar num modelo semelhante ao das comissões de proteção de crianças e jovens, de "intervenção mínima", mas de defesa efetiva dos seus direitos.

A proposta é uma das 30 recomendações que resultam do relatório "Portugal Mais Velho", da autoria da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), em colaboração com a Fundação Calouste Gulbenkian, que procura identificar "lacunas das políticas públicas e da legislação em relação ao envelhecimento da população e à violência contra pessoas idosas, apresentar boas práticas e ainda listar recomendações para melhorar esta situação".

"A estrutura cuja criação defendemos deveria operar em dois planos: no plano local, existindo células espalhadas pelo país que lidam com os casos concretos das pessoas adultas em situação de vulnerabilidade, e no plano nacional, criando-se uma entidade que tem por missão supervisionar e orientar as células locais", lê-se no relatório que é apresentado hoje.

Os visados na proteção destas novas comissões são os maiores acompanhados, pessoas que possam vir a ter medidas de acompanhamento e pessoas em situação de vulnerabilidade, sendo que entre estas últimas cabem pessoas com doença mental ou deficiência, em situação de isolamento, de carência económica ou vítimas de crime.

A proposta replica a das comissões de proteção de crianças e jovens e da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, que monitoriza as comissões locais e propõe um modelo de atuação de "intervenção mínima", no qual as comissões atuam "na estrita medida do necessário, não estando autorizadas a interferir na vida pessoal dos/as utentes para além da vulnerabilidade que justifica a intervenção em primeiro lugar", ressalvando-se ainda que a atuação da comissão fica sempre dependente da autorização do visado.

As comissões devem ser compostas por representantes do Ministério Público, Saúde, autarquia local, Segurança Social, forças de segurança, e também sociedade civil, instituições ou comunidade, sendo que a participação destas estruturas comunitárias ficam excluída de um assento permanente no órgão, por questões de proteção de intimidade e privacidade, cujo risco de violação aumenta em meios pequenos, em que todas as pessoas se conhecem.

Deve ainda ser adotado um código de conduta a seguir pelos membros das comissões, com o objetivo de proteger a privacidade dos adultos em situação de vulnerabilidade e também de assegurar o dever de sigilo.

Entre as 30 recomendações encontram-se várias que manifestam preocupação com a necessidade de aumentar a proteção das pessoas idosas a situações de violência e discriminação, pedindo-se que se atualize de forma contínua os dados sobre os diferentes tipos de violência contra idosos em Portugal, principalmente sobre violência sexual ou exercida por cuidadores profissionais, realidades menos conhecidas em Portugal.

A APAV propõe ainda "melhorar os procedimentos de fiscalização das instituições que acolhem ou prestam apoio a pessoas idosas".

"Esta fiscalização deverá ir muito além dos aspetos burocráticos (como a altura a que se encontram os extintores, por exemplo), procurando apurar se as pessoas idosas institucionalizadas são tratadas com dignidade ou se estão a ser vítimas de violência ou em risco de ser vítimas, seja esta perpetrada pelo 'staff' ou imposta pelas condições e regras da instituição", sintetiza-se no documento que reúne as recomendações, sendo que o relatório é bastante exaustivo na definição de conceitos, terminologias e tipos de violência que podem ser exercidos sobre pessoas idosas.

A APAV propõe ainda uma alteração legislativa muito específica no que diz respeito à violência doméstica sobre idosos, sugerindo que o conceito de coabitação consagrado na lei seja revisto de forma a abranger mais situações.

"Uma vez que em muitos casos de violência contra pessoas idosas o/a agressor/a não vive com a vítima (por exemplo, filho/a que tem a sua própria casa), alguns comportamentos violentos não são qualificados como violência doméstica à luz do critério da coabitação. Para acautelar estas situações bastante frequentes, deverá passar a considerar-se que há coabitação quando o/a agressor/a visita a habitação da vítima de forma tão frequente e por tais períodos de tempo que seja razoável considerá-lo como membro daquela, mesmo que aí não resida", defende-se.

Propõe-se ainda uma estratégia nacional para a formação de cuidadores informais ou familiares, que deve incluir conteúdos sobre crime e violência e seus fatores de risco, sendo também necessário dar formação a dirigentes e proprietários de lares residenciais e centros de dia na área da gerontologia, garantindo a melhoria dos cuidados prestados.

A APAV defende ainda o reconhecimento da carreira profissional na área da gerontologia, como "forma de dignificação da profissão" de assistente operacional, permitindo ganhos de reconhecimento social e de remuneração.

Entre as recomendações está ainda a de "criar mecanismos de supervisão e de apoio dos/as cuidadores/as formais ou profissionais e informais ou familiares".

"A falta de acompanhamento da prestação de cuidados pode dar azo a omissões no cumprimento dos deveres ou até situações de violência, sendo fulcral atuar numa lógica preventiva, dando àqueles que prestam cuidados a pessoas idosas a oportunidade de avaliar criticamente os seus conhecimentos, valores, competências e práticas e receber aconselhamento", lê-se no documento.

O relatório é apresentado hoje, Dia Internacional da Pessoa Idosa, numa sessão virtual que conta com a intervenção de João Lázaro, presidente da APAV, Luís Jerónimo, diretor do Programa Gulbenkian Desenvolvimento Sustentável, e Óscar Ribeiro, investigador principal no Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde (CINTESIS) da Universidade do Porto.

APAV propõe medidas para melhorar cuidados a idosos e proteção contra violência

A definição de uma política de família, que preveja alterações no Código do Trabalho para permitir assistência a familiares idosos e heranças negadas a descendentes que maltratem idosos, é outra das recomendações do relatório "Portugal Mais Velho".

Da autoria da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), em colaboração com a Fundação Calouste Gulbenkian, o relatório procura identificar "lacunas das políticas públicas e da legislação em relação ao envelhecimento da população e à violência contra pessoas idosas, apresentar boas práticas e ainda listar recomendações para melhorar esta situação".

O documento apresentado tem 30 propostas que visam uma melhor integração, participação e valorização das pessoas idosas na sociedade, sublinhando a importância do envelhecimento ativo e do combate a formas de violência e discriminação, uma realidade com "elevados custos sociais".

A Política de Família preconizada pela APAV prevê que o Código do Trabalho inclua para a assistência a familiares idosos as medidas já existentes para assistência aos filhos, como flexibilizações de horários ou licenças.

A APAV defende ainda que se deve rever o Direito Sucessório, "de modo a permitir uma maior liberdade na disposição de bens (garantindo que numa situação em que os descendentes de uma pessoa idosa que não a apoiem ou até maltratem, possam ser deserdados)", assim como uma alteração do regime de benefícios fiscais, "para promover a manutenção da pessoa idosa em sua casa (ou, pelo menos, no seu meio normal de vida)".

No documento síntese das recomendações, no qual se recorda que o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida defendeu como necessária uma "reflexão ética e humanista, que identifique os desafios e indique os princípios éticos orientadores da atuação do Estado, das comunidades intermédias locais, das famílias e dos prestadores de cuidados" relativamente aos idosos, recomenda-se que o Estado adote uma "perspetiva de direitos humanos transversal" às várias áreas de atuação, assim como a promoção de uma visão positiva das pessoas idosas, dando-lhes visibilidade social e capacitando-as para o exercício dos seus direitos.

A APAV propõe que seja feito um estudo do impacto da população idosa nas contas do Estado, medindo a denominada "economia da terceira idade", permitindo perceber o valor do seu trabalho voluntário e do apoio familiar que prestam, por exemplo, enquanto contributo ativo para a economia.

"Ajudaria a perceber que a alocação de recursos a políticas públicas focadas na população idosa é um investimento e permitiria a quantificação dos seus retornos, seguramente contribuindo para uma visão mais positiva das pessoas idosas e do envelhecimento", defende-se nas recomendações.

No âmbito do envelhecimento ativo e saudável, a APAV pede a entrada em vigor da Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável, que estevem em discussão pública em 2017, mas nunca chegou a ser publicada e implementada. Propõe ainda a "criação de um grupo de trabalho interdisciplinar e interministerial e com participação da sociedade civil na dependência do Gabinete da Ministra de Estado e da Presidência", para "monitorizar e avaliar as políticas públicas na área do envelhecimento".

"A resposta aos desafios suscitados pelo envelhecimento e o combate à discriminação, marginalização e violência contra pessoas idosas não se esgota com a criação de políticas públicas mas implica, igualmente, uma séria monitorização e avaliação das mesmas", defende a APAV, referindo que essa avaliação implica responsabilização e transparência, assim como uma melhor gestão pública e prestação de contas.

A promoção da educação para os direitos humanos, de programas intergeracionais e da aprendizagem ao longo da vida são outras propostas para uma melhor integração e participação social dos idosos.

O relatório é apresentado hoje, Dia Internacional da Pessoa Idosa, numa sessão virtual que conta com a intervenção de João Lázaro, presidente da APAV, Luís Jerónimo, diretor do Programa Gulbenkian Desenvolvimento Sustentável, e Óscar Ribeiro, investigador principal no Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde (CINTESIS) da Universidade do Porto.

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