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Ó tempo volta para trás, la la la...

Estou aqui de fora a apreciar as últimas novidades. Sentada na minha varanda, vejo passar velhas caras conhecidas da política regional, cabisbaixas, incrédulas, a cantar o clássico de António Mourão “Ó tempo volta para trás/Dá-me tudo o que eu perdi/Tem pena e dá-me a vida/A vida que eu já vivi”.

Vejo-os passar de um lado para outro, à procura desse passado ruim, triste, cinzento, em que meia dúzia mandava e a manada obedecia, protegidos pelas ameaças veladas de quem era temido, quando ninguém enfurecia a fera, não fosse ela deitar labaredas pelo nariz.

Moro numa zona da cidade onde os velhos políticos, que eu nem sabia que aqui moravam, se sentam na mesma pastelaria do que eu, quase imóveis, dando tempo para apreciá-los. Um, há poucos dias, falava sozinho e por mais que eu procurasse o auricular ligado a um telemóvel, não encontrei. Juro que até tirei uma foto da pequena fera, depois da dificuldade que foi reconhecê-lo sem o fato e a gravata, a voz exaltada e as ameaças veladas que fazia a quem se atravessasse. Na verdade, ameaçava mesmo quem não se atravessasse.

No dia das eleições, no passado domingo, só reconheci um outro que também metia medo, porque me cumprimentou. Sentei-me a olhar para a chinela de natação (muito na moda, agora), os calções sovados e o seu olhar posto no Diário, procurando a sua fotografia, os tempos em que a sua fotografia saía todos os dias, de lado, de frente, sentado, de pé, nas posições todas.

Esse teve até estatuto de vice num dos órgãos de soberania, mas agora nem lhe ligam e como o sítio é mais frequentado por venezuelanos do que por madeirenses, em algumas horas do dia, passou tão despercebido como qualquer outro, apesar do seu esforço para ser notado. Até dá dó ver aquelas almas penadas das instituições de onde acharam que iam sair de algália à procura do seu lugar ao sol. Dá arrepios (dos maus arrepios, claro), olhar para os seus semblantes murchos (salvo seja), acabados, definhados, a fazer contas à vida que levaram e às vidas que lixaram, sem poderem gritar, ameaçar, vociferar e esbracejar.

Agarram nos seus carros de alta cilindrada, comprados certamente com os salários míseros do parlamento e das empresas públicas, das empresas de construção civil e saem de olhos postos no chão. Acredito que o senhor na mesa lá do fundo ainda pôs o pé para passar uma rasteira a um deles, mas o elegante chinelo de ir à piscina traiu-o antes, porque não sabe andar de sapato aberto e nunca foi pé de chinelo. É triste ver a que ponto chegam os que querem ver em exibição “o regresso dos que nunca foram”. Dá vontade de nunca querer ir para deputado, muito menos para presidente da Assembleia. Livra!!!