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A ciência não dá votos?

Com eleições à porta não deixa de ser pertinente constatar que os discursos políticos pouco ou nada mudam ao longo de décadas, as promessas apelam mais ao coração e pouco à razão. Os temas mais sensíveis (saúde; melhores salários; mais direitos) visam o eleitor focado no seu dia a dia e menos os que, embora empenhados no presente, estão conscientes que a sua decisão também afetará o futuro dos seus filhos, dos seus netos. Em discussão sobre este tema com um colega que viveu 80 anos de mudanças políticas em Portugal a tentar fazer ciência, ele defendia que os filhos (maiores) deveriam votar pelos pais, no sentido de preservar hoje o interesse das gerações futuras. Atualmente, ele exerce o seu direito de voto discutindo com os seus filhos os motivos da sua decisão.

O colega também fez notar que na composição dos partidos em Portugal são minoria os que têm uma carreira profissional para além da política. São cada vez menos os cientistas de carreira disponíveis para participar nas ‘quadrilhas partidárias’ que para além de imprevisíveis são cruéis. Antes e depois da implementação da República, o agora Professor jubilado, participou como assessor de vários políticos assistindo às guerrilhas internas e permanentes que se vive entre os pares para ascender aos lugares mais cimeiros na pirâmide do poder. Ou seja, os assessores trabalham para derrubar os Secretários de Estado, que por sua vez trabalham para ascender a Ministros. E todos os Ministros trabalham para impressionarem o Primeiro, não vá um dia um deles se tornar elegível para um (destacado) cargo Europeu. Déjà vu?

Neste contexto, o investimento em ciência tem sido protagonizado sobretudo por visionários, que para além de conhecerem as regras do jogo da ‘política profissional’, constroem ninhos de oportunidade para viabilizar os seus ‘ovos’ no futuro. São esses que normalmente gravam o seu nome na História. É disto exemplo o Professor Mariano Gago, que durante treze anos como Ministro para a Ciência e Tecnologia reformou e internacionalizou a ciência feita em Portugal.

Por outro lado, a falta de investimento (explícito) em Ciência e Inovação contribui para perder muitos votos. A fuga de talentos não é socialmente bem aceite nos nossos dias, particularmente se considerarmos o nível de investimento público em prol da formação dos nossos quadros mais qualificados, para depois os perdermos para outros países. De igual modo, a dependência externa na contratação de consultorias e especialistas de alto nível é algo cada vez menos popular, particularmente se considerarmos que a maior parte das famílias Portuguesas investem em formação superior para os seus filhos, vendo depois o dinheiro dos seus impostos a ser empregue em empresas e/ou entidades estrangeiras. O crescimento económico, o envelhecimento da população, a qualidade agroalimentar, a economia azul, o ambiente e a energia são outros temas socialmente relevantes, e que dependem direta ou indiretamente do investimento que se fez, à priori, em Ciência, Tecnologia e Inovação.

De facto, o investimento em Ciência pode não ajudar a ganhar muitos votos a curto prazo, no entanto, nenhum partido se atreve a diminuir o papel da Ciência e da Inovação como motores da economia. E porque a Ciência pode vir a ajudar a resolver problemas e a criar novas oportunidades, os políticos (visionários) concentrados no seu futuro, podem também assistir à ‘eclosão dos ovos’ que ajudaram a criar no passado. Investir em Ciência é como plantar uma árvore: as flores e os frutos, colhem-se depois.