Uns se revelam. Outros se rebelam.
n Em jeito de declaração de interesse, cumpre-me comunicar que sou totalmente apolítica, não pertenço nem sou filiada em nenhuma força partidária, nem possuo a menor aptidão nem apetência para tal “mister”. Contudo, alguma experiência de vida que a minha idade me confere, e a observação mais ou menos atenta da realidade que me cerca, permite-me a audácia de tecer algum comentário, sem qualquer conotação política, mas que pode constituir objecto de alguma interpretação menos correcta, de discordância ou, porventura, aprovação. Em qualquer dos casos terá sempre o meu respeito. Porque, “cada cabeça, cada sentença”.
Através das mais variadas formas e meios de comunicação, o nosso quotidiano é invadido por um inacabar de informação (muita sem filtro), alguma mais ou menos credível, outra pouco recomendável. Porém, é tarefa quase impossível passar ao lado do que invade os nossos tlms., tablets, computadores, etc.e tc. numa imposição implícita, muito bem dissimulada.
A este propósito, tenho ouvido e lido alguns (muitos) comentários pouco abonatórios sobre o resultado da votação, num partido sujeito a sufrágio, nas últimas eleições legislativas. Presumiu-se que para esse resultado contribuiu em larga medida o voto das camadas mais jovens, apelidando-os de irresponsáveis, imaturos, sem noção de bom senso, entre outros atributos mito censuráveis... Mas, será justo avaliarmos todos os jovens e jovens adultos pela mesma bitola? Então o voto não é um acto solitário e secreto? Como sabemos quem votou em quem?
Por detrás desses jovens há pais e avós votantes que, à custa de seus magros salários e reformas de miséria, os vão acolhendo e apoiando para que pelo desespero de não encontrar trabalho, habitação e possibilidade de constituir a sua própria família, enveredem por caminhos tortuosos.
Acho que nos deveríamos interrogar com muita seriedade sobre a nossa quota parte de cumplicidade no atual estado das coisas. Não podemos maquilhar a realidade, pois vivemos tempos em que tudo se inverte com ligeireza. Mas pode-se discordar sem ofender nem caluniar. É preciso procurar e encontrar os que não se calam diante de uma injustiça e a corrigem. Os alicerces em que assenta a estrutura social estão a vacilar. A família perdeu valores, referências e elos de ligação. As pessoas, em geral, não apenas os jovens, estão revoltadas, insatisfeitas, cansadas de esperar por mudanças, que nunca acontecem, há mais de meio século, porque o que vai mudando são os actores que pisam o mesmo palco, alternadamente, eleição após eleição... Ocupam os lugares, à custa de todos nós, que dão tanto jeito que até a honra é engolida. Não se valoriza quem se aplica, quem se esforça, quem se sacrifica. Põe-se em prática rapidamente o tráfico de influências, o nepotismo, o amiguismo e premeia-se a incompetência, a irresponsabilidade que, em certos casos, pode até fazer perigar a vida de muita gente. Tudo isto é precursor de revolta, de insatisfação generalizada cuja consequência se traduz, inevitavelmente, no resultado apurado nas urnas.
As gerações anteriores e nós, os da minha geração, tivemos muito trabalho para construir um mundo que hoje se vê ser destruído, por falta do que vivenciámos em abundância-honra, respeito, vergonha, esforço e responsabilidade. Estamos rodeados de pessoas tóxicas que, no nosso dia a dia, prejudicam a nossa saúde mental. Podemos chamá-los de “amigos”, colegas, superiores hierárquicos, familiares e, também, políticos. O descontentamento, porém, nem sempre é algo negativo. É preciso saber aproveitar as possibilidades que a mudança nos traz.
Madalena Castro