O consumo de Novas Substâncias Psicoativas (com o 'bloom' à cabeça) continua a agravar-se no arquipélago da Madeira, uma situação que o DIÁRIO tem vindo a retratar na série ‘Na Rota do Bloom’, fruto de uma parceria com a BBC Rádio4. Mas o que diz a lei sobre estas drogas?
A Unidade Operacional de Intervenção em Comportamentos Aditivos e Dependências (UCAD) sublinha que “o surgimento e consequente consumo de Novas Substâncias Psicoativas (NSP) tem tido uma tendência crescente a nível europeu e mundial”.
Com efeito, a compreensão e combate a este fenómeno consiste, actualmente, numa das grandes preocupações quer dos governos, quer das instâncias internacionais responsáveis pelo acompanhamento e regulação da actuação desta problemática, designadamente o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (European Monitoring Centre for Drugs and Drug Addiction) e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (United Nations Office on Drugs and Crime).
O que são NSP?
Entende-se por Novas Substâncias Psicoativas um novo estupefaciente ou um novo psicotrópico, puro ou numa preparação, que não seja controlado pela Convenção Única das Nações Unidas de 1961 sobre os estupefacientes, nem pela Convenção das Nações Unidas de 1971 sobre substâncias psicotrópicas, mas que possa constituir uma ameaça para a saúde pública comparável à das substâncias enumeradas nessas convenções.
De ressalvar que o termo "novo" não se refere unicamente a substâncias recém-inventadas ou recém-sintetizadas, mas também às recentemente disponíveis no mercado ou às que são usadas de forma imprópria (onde se incluem os fármacos psicoativos).
De uma forma geral, as Novas Substâncias Psicoativas actualmente sintetizadas, são criadas para imitar os efeitos das existentes naturais ou sintéticas já controladas no âmbito das leis e lista das referidas convenções.
Outras são quimicamente semelhantes às substâncias psicoativas controladas, mas ao mesmo tempo suficientemente diferentes em termos da sua estrutura molecular para não serem incluídas nas referidas listas. Tem-se verificado que à medida que o controlo é exercido sobre as Novas Substâncias Psicoativas, são criadas variantes das mesmas.
Na edição impressa deste sábado, contamos-lhe a história de vida de gente presa a este vício:
Primeira
A manchete deste domingo, 25 de Maio de 2025, aponta para 23 vítimas de bullying acompanhadas na Região, sendo que "a realidade deverá ir além dos casos reportados, acreditam as CPCJ, devido ao medo e silêncio que dificultam a actuação".
Descarregue aqui o artigo ‘Entre o prazer e a dor’, da série ‘Na Rota do Bloom’:
Enquadramento legal
Nos finais dos anos 90, o Conselho da Europa cria uma Joint Action (1997) para se debruçar sobre as substâncias psicoativas que não se enquadravam dentro das regras definidas pelas convenções internacionais sobre drogas.
A partir da Decisão n.º 2005/387/JAI, de 10 de maio de 2005, é ampliado o âmbito da referida Joint Action e definido o conceito de Novas Substâncias Psicoativas, assim com é definido o intercâmbio de informações, avaliação de riscos e controlo das Novas Substâncias Psicoativas por instâncias Europeias, designadamente através do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência, do Conselho da Europa e da Europol.
Nesta fase, é ainda criado o Mecanismo de Alerta Rápido (Early-Warning System - EWS), um sistema europeu para a sinalização permanente e para a investigação sobre o surgimento de Novas Substâncias Psicoativas.
Este dispositivo, no qual Portugal se encontra representado através do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), possibilita o intercâmbio rápido de informação sobre Novas Substâncias Psicoativas entre os Estados-Membros, permitindo que as medidas aplicáveis ao controlo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas sejam também aplicáveis a estas novas substâncias.
Em termos práticos, quando é detectada uma nova substância psicoativa no mercado europeu os vários Estados-Membros asseguram a transmissão de informações sobre o fabrico, o tráfico e o consumo dessa substância ao Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência e à Europo,l através dos pontos focais nacionais da Rede Europeia de Informação sobre Droga e Toxicodependência (REITOX) e das Unidades Nacionais da Europol.
“A função-chave deste sistema é, portanto, assegurar a recolha e análise de informação rápida, relevante e fiável sobre as Novas Substâncias Psicoativas, bem como sustentar a tomada de iniciativas para sujeitar as mesmas a medidas de controlo”, explica a UCAD.
Em Portugal foram tomadas, em 2012, novas medidas relativamente à expansão do fenómeno das Novas Substâncias Psicoativas, tendo sido alterado pela décima nona vez, através da Lei n.º 13/2012 de 26 de Março, o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que aprovou o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, onde se incluiu, entre outras, a metilmetcatinona (mefedrona) na lista de substâncias controladas.
Panorama Regional
Em 2008, com a abertura da primeira ‘smartshop’ no Funchal, cerca de um ano após a abertura da primeira loja a nível nacional, em Aveiro – o Serviço de Prevenção da Toxicodependência (actual UCAD) começa a acompanhar o fenómeno das Novas Substâncias Psicoativas na Madeira, conhecidas nesta altura por “drogas legais”.
Em 2010, a UCAD começou a receber diversas denúncias e pedidos de apoio por parte de encarregados de educação e professores de diferentes escolas da RAM, associados ao consumo destas substâncias.
Em 2012, dada a dimensão expressiva do fenómeno de comercialização e consumo de NSP é publicada na Madeira a primeira legislação que aprova normas para a protecção dos cidadãos e para a redução da oferta de “drogas legais”, o Decreto Legislativo Regional n.º 28/2012/M de 25 de Outubro, que levou ao encerramento das seis ‘smartshop’ existentes no arquipélago. Foi a primeira região do País a fazê-lo.
Em Portugal continental, tal só viria a acontecer no ano seguinte, com a aprovação do Decreto Lei 54/2013 de 17 Abril, que procede à definição do regime jurídico da prevenção e protecção contra a publicidade e comércio das Novas Substâncias Psicoativas.
Assim, desde o dia 25 de Outubro de 2012, Madeira passou assim a ter um regime contraordenacional de proibição das novas drogas, sem prejuízo do quadro penal que a Assembleia da República, viesse a adoptar.
Mais tarde, em 2017, estipulou a diferenciação entre tráfico e consumo, com indicação das quantidades, mas apenas em termos contraordenacionais.
Em 2021, ano com o registo mais elevado de internamentos por consumo de drogas sintéticas – 233 –, o ‘bloom’ foi criminalizado na Região. A Assembleia Legislativa da Madeira pediu a São Bento a criminalização total das novas substâncias psicoativas, mas a proposta foi rejeitada.
Em 2023, foi aprovada uma segunda alteração ao Decreto Legislativo Regional n.º 28/2012/M de 25 de Outubro, que prevê o aumento dos valores mínimos e máximos previstos para as contraordenações muito graves no Regime Jurídico das Contraordenações económicas.
A Nova Lei da Droga
Segundo as entidades regionais, a nova lei da droga em Portugal (Lei n.º 55/2023) que entrou em vigor em Outubro de 2023, veio trazer novos desafios no combate a este fenómeno.
O diploma distingue entre consumo e tráfico, com base na quantidade de droga detida ou transportada pelo indivíduo. O consumo pessoal é tipicamente enquadrado em até 10 doses diárias da substância, estando a quantidade de cada dose definida numa tabela em função do tipo de droga).
Se antes a posse de droga para mais de 10 dias de consumo, medida pela tabela, era sempre considerado crime. Agora, é indício de tráfico. Ou seja, quando não há outras provas da prática de tráfico, o arguido pode alegar que esta se destina a consumo.
Isto é muito perigoso, porque esta lei quase que legaliza os traficantes e penaliza os consumidores. Isso não é bom Nélson Carvalho, director da UCAD
No mesmo ano, o Parlamento Regional remeteu um diploma à Assembleia da República para acelerar o aditamento das novas drogas à lista de substâncias proibidas, conforme indicação dos organismos internacionais, um processo que deveria ocorrer no prazo de seis meses, mas que em Portugal pode demorar até dois anos.
Descarregue o artigo 'Fora de controlo', o primeiro da série ‘Na Rota do Bloom’, publicado na edição de 18 de Maio, para ficar saber mais sobre as consequenciais sociais deste flagelo:
Leia também a entrevista à psicóloga e coordenadora local do Serviço de Saúde Mental da Fundação S. João de Deus, Lavínia Côrte, publicada no DIÁRIO a 19 de Maio: