Na hora actual
Nunca foi tão difícil cantar o belo
Tentar fazê-lo sabe a sacrilégio
É fazer da caneta um escalpelo
E perder-se num negro sortilégio
O aroma duma flor a pólvora cheira
Deliciar-se com a arte é blasfemar
Procriar-se parece louca asneira
E sonhar um tributo à guerra pagar
Fazer o bem provoca desconfiança
Por à maldade estarmos habituados
Prometer ao pobre a bem-aventurança
É mentir e rir-se dos maltratados
Ter brio na honradez é coisa rara
Ao altruísmo levou-o forte vento
Ser indulgente é manha bizarra
Desprezo é paga de bondoso intento
A vida humana agora tem um preço
Numa simples bala reside o seu valor
Numa vala comum mostram-lhe o apreço
Entregam-na à nulidade sem pudor
Que as musas perdoem aos seus poetas
A genuína falta de inspiração
De cinzas suas mentes estão cobertas
E da repulsa de tanta destruição!
Asdrúbal Vieira