Eu Voto! O apelo de Filipa Caroto Escórcio
Jurista vai ao passado castrador para explicar a importância da participação cívica
Voz
Sempre admirei as sufragistas.
Disruptivas, fogosas, combativas.
Loucas, desestabilizadoras ou mulheres que precisavam era de um homem, diziam eles.
Em 1822, na discussão da primeira Constituição e a propósito do voto das mulheres, declarou-se com pompa que “Trata-se do exercício de um direito político e deles são as mulheres incapazes. Elas não têm voz nas sociedades políticas: mulier in ecclesia taceat, diz o Apóstolo.”
Há duzentos anos.
Carolina Beatriz Ângelo será sempre uma (minha) heroína. Sub-repticiamente, aproveitando-se de uma imprecisão legal, foi, como chefe de família e licenciada, a primeira mulher portuguesa a votar em Portugal. Morreu antes de ver clarificado que o voto era privilégio dos cidadãos do sexo masculino.
Há cem anos.
Estava a estudar História de 6.º ano com a minha filha. Aprendeu que a Constituição de 1911 consagrava o sufrágio ainda mais alargado. Fixei a expressão de choque dela ao perceber que esse alargamento era ainda, nas suas palavras “só para alguns. E os que não sabiam ler e escrever? E os que não tinham dinheiro? E as mulheres?”
“Só depois do 25 de Abril, amor.”
Há cinquenta anos.
Este, que temos como adquirido, é um direito que custou a ganhar.
É um direito sacrossanto (aos laicos falta uma palavra com esta pungência) de um Estado Democrático.
É um dever do cidadão (aos religiosos falta uma palavra com este humanismo) de um Estado de Direito.
Estamos descontentes com a democracia? Percebo.
Mas olhem para trás. Olhem em volta.
Não se melhora a Democracia demitindo-se de participar nela.
Dia 23 de Março.