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Absolutamente ilegal

A constituição de um advogado como arguido para a obtenção de prova, de forma totalmente instrumental, para chegar ao cidadão investigado, materializa uma clara violação das regras do processo penal. Engenhosa, mas absolutamente ilegal, esta prática do Ministério Público constitui um ataque à Advocacia, um atropelo das garantias de defesa do cidadão e um atentado ao Estado de Direito. Nenhuma Magistratura está acima da lei.

Todas as suspeitas da prática de actos criminosos devem, e bem, ser investigadas pelo Ministério Público, mas com respeito pelas regras do processo penal. Investigar de forma ilegal, para procurar provar alegadas ilegalidades, é subverter todo o sistema penal e destruir o Estado de Direito. São práticas que fazem lembrar Estados Totalitários. Mas foi isto que aconteceu, por exemplo, na operação “Cheque In”, que visou a TAP, com a constituição de um advogado de um dos suspeitos como arguido unicamente para fazer buscas no seu escritório, aceder a documentação e apreender correspondência sujeita ao sigilo profissional. Aconteceu num caso “grande”, e mediático, mas pode acontecer com qualquer cidadão ou advogado fora dos grandes holofotes. Muito perigoso.

Para que fique claro o advogado não é suspeito de nada. O seu cliente é que está a ser investigado. E é justamente aqui que reside a gravidade da situação. Uma completa fraude à lei processual penal e à Constituição da República Portuguesa muito perigosa para a nossa Democracia.

Um outro abuso das Magistraturas nos últimos dias foi a negação de prazo para consulta de processo ao advogado José Ramos na “Operação Marquês”. Por muito que abomine politicamente José Sócrates – na memória fica a bancarrota do país, a vinda da Troika e as discriminações negativas à Madeira – o que está em causa é o cumprimento da lei. Goste-se ou não dos visados, concorde-se mais ou menos com o nosso sistema garantista, independentemente de tudo isso, a verdade é que nenhum advogado pode ser impedido de preparar a sua defesa.

A “Operação Marquês” levou dez anos a chegar julgamento? Se calhar é preciso dotar o Ministério Público e os Tribunais de mais meios humanos, valorizar e tornar mais atrativas as suas carreiras, garantir condições de trabalho e recursos técnicos. Isso sim tornaria a justiça mais célere e dignificaria a exigente missão de juízes, procuradores e oficiais de justiça. Se os processos judiciais se arrastam largos anos a culpa é do poder político que resiste em fazer reformas na Justiça. E não dos advogados que pedem 48 horas para consultar processos de 40 mil páginas.

Atacar a advocacia é atacar os cidadãos, os seus direitos de defesa, e todo o Estado Democrático que regula a ordem da nossa vida social. Contornar a lei e querer ser “justiceiro” não vai contribuir para uma sociedade melhor. Pelo contrário. Ninguém se sente seguro em viver numa selva. E tudo isto pode acontecer a qualquer um de nós.