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Cotrim admite que as suas reformas teriam "custos de transição"

Foto André Kosters/Lusa
Foto André Kosters/Lusa

O candidato presidencial João Cotrim Figueiredo admitiu que as suas propostas de reformas teriam "custos de transição" e poderiam ser impopulares em alguns setores e assegurou que, caso seja eleito, não irá "mexer uma palha" para haver revisão constitucional.

Em entrevista à agência Lusa, Cotrim Figueiredo disse gostar de ver "reformas acontecer e a mudança a ser acompanhada", apesar de reconhecer que "as reformas geram sempre resistência".

"Evitar resistências é a mesma coisa que evitar reformas. Isso não podemos fazer. Por medo de desagradar a A ou a B, não fazer reformas é garantir que estamos a prejudicar C, D, E, F, até ao Z. Há sempre quem não fica satisfeito quando algo muda", referiu.

Questionado se essas reformas seriam dolorosas para a sociedade, depois de ter dito em entrevista à CNN Portugal que "qualquer político que venha dizer que se consegue chegar ao nirvana ou ao paraíso sem dor está a mentir", Cotrim Figueiredo assumiu que "implicariam necessariamente custos de transição".

Cotrim Figueiredo considerou que o importante é que esses "custos de transição sejam devidamente calculados para que não haja ninguém deixado para trás", defendendo que se estaria a "deixar mais pessoas para trás, a prejudicar mais as pessoas", se não se fizerem as reformas.

O candidato presidencial deu o exemplo da reforma da Segurança Social, que considerou ser necessária para garantir que o sistema se torna sustentável, o que irá requerer um "esforço orçamental".

"E, como sempre num esforço orçamental, se alguém estiver a dizer 'eu consigo aumentar determinada despesa sem conter outra', está a mentir. Isso eu não faço. Se estamos interessados em que este problema intergeracional, esta injustiça seja corrigida, temos de estar disponíveis para um período de adaptação, de transição", indicou.

"Portanto, esta lógica eleitoralista de 'eu sei que vou afetar este ou aquele, que vou perder a boa vontade deste ou daquele e não faço reformas', estou a prejudicar muito mais gente do que aqueles que estou a defender agora. É preciso ter esta noção", disse, referindo que, para implementar as suas reformas, é preciso coragem e "não estar demasiado interessado na reeleição".

Interrogado se isso quer dizer que as suas reformas seriam impopulares, o também ex-líder da IL disse que seriam "impopulares em alguns setores, muito populares noutros setores" e, "a longo prazo, muitíssimo populares".

Sobre se considera que o período da 'troika' foi um desses momentos em que foram feitas reformas necessárias mas dolorosas, Cotrim Figueiredo criticou o facto de se pôr "reformas e 'troika' no mesmo barco", considerando que isso é "perigosíssimo do ponto de vista da criação de um clima, na opinião pública, quase de medo".

"Não queiram criar nas pessoas a ideia de que reformar é igual a dor tipo 'troika'. Isso é o pior favor que se pode fazer à democracia porque é dizer às pessoas que é possível fazer e evoluir sem que nada mude", disse, salientando que é uma questão de responsabilidade avisar que as reformas terão custos.

"Isto não é estoicismo, não é gostar da dor pela dor, é saber, como qualquer pessoa sabe, que, em termos psicológicos, a gratificação deve ser adiada. Há coisas que hoje dão muito prazer, mas nós sabemos que pagamos amanhã", disse, considerando que essa é uma pedagogia que deve ser feita e que serve de contraponto ao populismo.

"O populismo vive da facilidade que é vendida. Esta coisa de vender que a vida é feita de um certo imobilismo cómodo, sem custos, sem dificuldades e sem necessidade de enfrentar problemas, é errada", advertiu.

Depois de, quando era líder da IL, ter defendido a necessidade de uma revisão constitucional, Cotrim Figueiredo disse que a sua opinião sobre o assunto é conhecida, mas assegurou que, enquanto Presidente da República, irá manter a neutralidade e não irá mexer "uma palha" para que se altere a lei fundamental.

"O Presidente da República, a sua primeira função, talvez a mais nobre, é guardião da Constituição. Não faz sentido estar a incentivar que a mudem. (...) Não mexeria uma palha para alterar a Constituição e também não mexeria uma palha para não aceitar uma revisão constitucional que viesse, legitimamente, aprovada por dois terços da Assembleia" da República, referiu.

Cativar abstencionistas, indecisos e eleitores que vão do PS ao Chega

O candidato quer cativar abstencionistas, indecisos e eleitores que vão do PS ao Chega e considera já estar a beneficiar de uma transferência de votos das candidaturas de Seguro, Marques Mendes e Ventura.

Cotrim Figueiredo reiterou a convicção de que irá conseguir chegar à segunda volta das eleições presidenciais, salientando que, de acordo com análises de estudos eleitorais que tem feito, há cerca de 60% de eleitores, entre os quais 30% de indecisos e outros 25% que admitem mudar de opinião, que poderão votar na sua candidatura.

"O meu valor eleitoral -- a minha base são as europeias, foi a última vez que fui a votos -- é 9%. Quanto é que é necessário para passar à segunda volta? Ninguém tem a certeza. Será 20%, 21% ou 23%? Não sei. Portanto, esse espaço que me separa dos 22% para os 9%, eu tenho que ir buscar 13% a estes 60% que estão livres. Não é impossível", referiu.

O candidato presidencial, apoiado pela IL, salientou que, dentro desses 60% que identificou, tem recebido "mensagens de apreço de vários quadrantes políticos", com exceção dos partidos à esquerda do PS, e frisou que na sua campanha se vai dirigir sobretudo a eleitores que vão "do centro-esquerda ao centro-direita".

Questionado sobre quem é que identifica como os seus principais adversários em termos de disputa de eleitorado, Cotrim Figueiredo disse que ainda não consegue dizer, mas referiu que tem recebido apoios sobretudo da área das candidaturas de Luís Marques Mendes e de António José Seguro, mas também, entre os jovens, de André Ventura.

"No Chega, curiosamente, o que me tem agradado, e já vi que desagradado ao presidente do Chega, é o facto de haver muita juventude do Chega que percebe que a indignação é gira, é engraçada para entreter no TikTok, mas não resolve nada", referiu.

Cotrim Figueiredo admitiu assim que, entre a fasquia do eleitorado que já decidiu o voto mas admite mudar de opinião até ao dia das eleições, está sobretudo apostado em tirar votos às candidaturas de Marques Mendes, Seguro e Ventura, salientando que esses "movimentos já começaram a surgir".

"E, depois, tenho áreas que ainda não estão ocupadas ou, digamos, decididas: os tais 30% de indecisos e uma percentagem de pessoas que são aliciáveis a sair do sofá e da abstenção para vir participar numa campanha em que sentiram, finalmente, que há uma coisa diferente, que vale a pena", disse.

Sobre o seu perfil de Presidente da República, Cotrim Figueiredo disse que o chefe de Estado português com que mais se identifica é o general Ramalho Eanes, mas apenas no seu primeiro mandato porque, no segundo, "perdeu-se naquela visão mais interventiva e quase caudilhista de um presidente que quis formar um partido".

Mas, no primeiro mandato, "foi independente, foi corajoso, deu o respaldo àquilo que na altura era obrigatório (...) aos governos de turno e aos parlamentos de turno para fazerem essas mudanças. E acho que é importante que o Presidente da República faça isso", disse.

Relativamente à avaliação dos dois mandatos de Marcelo Rebelo de Sousa, Cotrim Figueiredo fez um balanço "globalmente negativo" por achar que o atual Presidente da República "não inspirou os portugueses a fazerem aquilo que era necessário fazer".

"Que é estarem muito mais cientes da importância que terão, participando na vida cívica, política e cultural, na resolução dos problemas que Portugal vai ter de enfrentar", afirmou.

Trataria Governo do Chega como qualquer outro mas mostraria que não brinca

João Cotrim Figueiredo afirmou que trataria um Governo do Chega como o de qualquer outra cor política, mas mostraria que é um Presidente da República com o qual "não dá para brincar".

O candidato defendeu que um Presidente da República não deve atuar como um "contrapoder" nem mostrar publicamente as suas divergências perante um Governo em exercício.

"As pessoas que acham que o Presidente da República é eleito para defender uma determinada posição partidária ou ideológica estão enganadas quanto à função constitucionalmente prevista para o Presidente. Não é essa", afirmou.

Cotrim defendeu que o Presidente "deve atuar como um escrutinador, não só pela sua função de promulgador, mas também pela possibilidade de vetar ou fiscalizar constitucionalmente os diplomas", frisando que trataria um Governo do Chega como o de qualquer outra cor política.

"Acho que essa é a minha função constitucional: respeitar a vontade das pessoas. (...) Não gostaria de tratar os eleitores do Chega de uma forma diferente da que trato quaisquer outros eleitores, porque são portugueses como todos os outros, têm direito à sua opinião", defendeu.

Sobre se, para dar posse a um Governo do Chega, não pediria qualquer tipo de compromisso formal, à semelhança de Luís Marques Mendes, que já disse que poderia exigir "um documento escrito de garantias constitucionais", Cotrim Figueiredo perguntou "qual é a validade prática dessa assinatura" e o "que é que acontece se esse acordo for incumprido".

"Mais vale fazer uma análise muito mais séria da personalidade das pessoas, fazer ver à pessoa que, com aquele Presidente da República, não dá para brincar. E é esse o entendimento: não é escrito, é um entendimento pessoal de influência", frisou.

Cotrim Figueiredo assegurou que, se recebesse em Belém diplomas potencialmente inconstitucionais de um Governo do Chega, não teria "qualquer pejo" em enviar "30 diplomas por mês para a fiscalização" do Tribunal Constitucional.

"Lamento dar tanto trabalho ao Tribunal Constitucional, mas é para isso que ele existe. E isso não tem problema absolutamente nenhum. Esse partido ou qualquer outro", referiu, frisando que estaria atento a essas questões independentemente da cor política do Governo.

Além destas questões de constitucionalidade, Cotrim Figueiredo referiu também que estaria atento às leis "involuntariamente ou voluntariamente mal feitas", considerando que a questão da desagregação das freguesias foi um caso de legislação propositadamente mal feita, "por motivos eleitoralistas e de clientelas políticas".

"Esse género de legislação, ou de posição, seria sempre objeto, mais uma vez discretamente, sem fazer disto um contrapoder, sem dar nota pública, (...) mas farei conhecer ao Governo que há coisas que não são admissíveis e que, continuando numa determinada via, pode sim dar origem a que o Presidente da República, naqueles casos mais extremos, tenha de tomar uma posição pública que não é agradável para ninguém", advertiu.

Questionado qual seria o cunho pessoal que gostaria de imprimir imediatamente caso seja eleito Presidente da República, Cotrim Figueiredo disse que gostaria de passar uma das suas primeiras noites enquanto chefe de Estado nas Ilhas Selvagens, "porque dá um sinal de que Portugal é igual e o mesmo da sua ponta mais norte à sua ponta mais sul".

"E porque dou muita importância ao tema da nossa relação atlântica e, no caso concreto, da plataforma continental que as Selvagens nos permitem reclamar. Seria uma coisa acho que simultaneamente simbólica e útil", disse.

Sobre a sua primeira visita ao estrangeiro, Cotrim Figueiredo disse que gostaria que fosse a um "país de língua oficial portuguesa", com o qual Portugal pudesse "reclamar ou tentar fazer uma união política mais estreita".

"Neste momento, esse país seria o Brasil. Mas pode não ser sempre o mesmo. As coisas mudam", disse.