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Editorial

Ao que isto chegou!

O País que deitou fora uma maioria absoluta por causa de um parágrafo judicial, que António Costa invocou para se demitir, está agora confrontado com novo impasse governativo. E se nos Açores, as eleições antecipadas deixaram quase tudo na mesma, as precipitadas Legislativas Nacionais tiveram o condão de mudar protagonistas para que tudo fique bem pior. Neste lodo, que se antevê cíclico, se não houver responsabilidade acrescida de quem perdeu o sufrágio, tem a palavra, uma vez mais, o Presidente da República. É possível governar em minoria ou com recurso a habilidosas e improváveis negociações, já que nem AD, nem PS ousam meter o Chega na equação, partido que nos 50 anos da democracia ocupa 48 lugares no parlamento nacional e atinge números nunca vistos, rebuscadamente atribuídos a méritos divinos por quem se recusa descer à terra. Cabe então a Marcelo Rebelo de Sousa revelar se é desta forma que Portugal entra num novo ciclo, “decisivo para o arranque da economia, para as condições de vida de todos, especialmente os mais pobres, os mais excluídos, os mais dependentes” e num “momento de dar nova vida, em estabilidade e em segurança, à nossa Liberdade, Igualdade e Democracia”. E se a Madeira passará por processo idêntico, mesmo que entre divórcios e outras desavenças, a governabilidade insular em gestão corrente também não seja saudável. Lembre-se que “baixar os braços é sempre a pior solução” e que os portugueses já fizeram hoje a sua parte, como encarecidamente pediu.

Ao nível da participação, os madeirenses também deram uma lição aos que julgavam haver redobrados motivos para a humilhação insular. A crise política na Região acabou por levar mais gente às urnas, algumas a pensar no País, outras apostadas num ajuste de contas, mas muitas a pensar na aritmética doméstica. Houve mais 22.672 inscritos a exercer o seu dever cívico do que nas Legislativas de 2022. A participação superior em 9 pontos percentuais demonstra que mesmo os que “se cansaram ou desiludiram” entendem na perfeição que é nos “momentos mais graves que mais importa votar”. Talvez por isso mereciam outra consideração e respeito. Bem tínhamos avisado que os tiques pidescos iriam subir ao palco nestas eleições. Dito e feito, com a agravante de terem amparo na entidade que tem competência para disciplinar e fiscalizar as eleições. É deveras preocupante que anónimos, cidadãos identificados ou partidos experimentados recorram a queixas que depositam na reactiva Comissão Nacional de Eleições, como na Entidade Reguladora para a Comunicação Social ou na Comissão da Carteira Profissional dos Jornalistas, com o intuito de calar quem tem a missão de informar. E nem está em causa o legítimo direito à contestação e o exercício do contraditório. O problema é uns e outros julgarem os eleitores como tolos, incapazes de discernir factos de opiniões e de decidir com sabedoria, independentemente do que é dito em qualquer momento do processo eleitoral. Alguém em seu perfeito juízo acredita que o voto consciente de cada um depende de uma sigla ou designação parecida com outra força concorrente, de um cartaz colocado a menos de 500 metros de uma assembleia de voto ou das tradicionais declarações que os políticos fazem depois de votar? Alguém julga que o posicionamento de um cabeça-de-lista que assume estar confiante num bom resultado pode interferir no processo de formação de vontade dos eleitores e, assim, inserir-se no âmbito da proibição de realização de propaganda no dia da eleição? Alguém entende que os órgãos de comunicação social que se deslocam às secções de voto para a obtenção de imagens ou de outros elementos de reportagem fazem-no por questões ideológicas ou de exibição dos microfones com vistosas bolas de vento, como se interpelar os eleitores e colocar-lhes questões atentasse contra a democracia.

Quem tudo quer criminalizar sem ouvir as partes e, pior, determinar aos média que cessem a divulgação de notícias, como se fosse possível explicar consequências sem dar-lhes o devido contexto e abordar deliberações omitindo prevaricadores, prestou mau serviço à Nação. O povo que escolhe sem medo não merecia tamanha afronta.